Título: Cristina diz não querer pagar juros de 15%
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 09/01/2010, Economia, p. 27

Para fonte do BC, o governo "não quer prestar contas"

BUENOS AIRES. A decisão da juíza federal Maria José Sarmiento de impedir o uso das reservas do Banco Central da República Argentina (BCRA) para constituir o chamado Fundo do Bicentenário enfureceu a presidente Cristina Kirchner, que se reuniu ontem à noite com seu gabinete. Ela afirma que o objetivo do governo é "não ter de pedir emprestado (aos mercados) e pagar juros de 15%":

- Esse dinheiro foi juntado por todos os argentinos. Pegamos uma parte das reservas para que não nos pressionem de fora dizendo que não vamos pagar.

Segundo uma fonte do BCRA, a estratégia do governo Kirchner é simples: usando as reservas, evita recorrer aos mercados internacionais para cobrir os primeiros vencimentos da dívida, no mês que vem. Senão, teria de aceitar missões e auditorias do Fundo Monetário Internacional, negociar sua dívida com o Clube de Paris (estimada em US$6,5 bilhões) e com os credores que não participaram da reestruturação de 2005. Estes detêm cerca de US$20 bilhões em papéis, os chamados holdouts. Redrado argumentava que eles poderiam embargar os recursos transferidos para uma conta bancária.

- Kirchner não quer prestar contas e para continuar fazendo o que bem entende precisa usar as reservas do BCRA - disse a fonte.

Funcionários temem uso político do banco

Apesar da volta de Redrado, o clima no banco não era de euforia. Funcionários temem que o BCRA se torne outro Indec (o IBGE argentino). Este sofreu uma intervenção estatal em 2007 - ano em que começou a ser acusado de manipular os indicadores, sobretudo a inflação.

- Hoje (ontem) vários funcionários começaram a sofrer ameaças por parte de enviados de Kirchner. A sensação é que quem contrariar os desejos do governo será punido e perseguido, como ocorreu no Indec - disse uma fonte do BCRA.

O mercado reagiu mal. A Bolsa de Buenos Aires recuou 1,53%, os bônus caíram, em média, 3,1%, e o risco-país avançou 3,81%, para 681 pontos centesimais. O dólar ficou estável, em 3,83 pesos, com intervenção do BCRA. (Janaína Figueiredo)