Título: Senado quer ouvir de novo general sobre gays
Autor: Lima, Maria; Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 05/02/2010, O País, p. 12

Presidente do STM, porém, defende o militar, que poderá ter indicação para o cargo adiada pelos senadores Maria Lima, Evandro Éboli e Cristiane Jungblut

BRASÍLIA. As declarações do general Raymundo Nonato de Cerqueira Filho sobre a suposta incapacidade dos gays de assumirem postos de comando na carreira militar provocaram polêmica e ameaçam retardar a indicação dele para uma vaga de ministro do Superior Tribunal Militar (STM). A indicação ainda tem que ser aprovada pelo plenário do Senado, mas, diante da repercussão, senadores que já haviam aprovado seu nome na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) agora querem voltar a ouvi-lo. O STM é a corte que julga processos contra militares, inclusive os que envolvem homossexuais militares.

O primeiro a pedir a volta do general à CCJ foi o senador Eduardo Suplicy (PT-SP). Para tentar impedir nova sabatina, assessores do Ministério da Defesa passaram o dia em reuniões com senadores e tentando convencer Suplicy a desistir. Queriam que ele recebesse Cerqueira a sós. Sem sucesso.

Na CCJ, quarta-feira, Cerqueira disse que as atividades desempenhadas pelas Forças Armadas ¿não são adequadas para homossexuais¿ pois ¿soldados não obedeceriam a comandantes gays¿. Ontem, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, tentou minimizar as declarações: ¿ As declarações do general não influenciarão os debates internos do Ministério da Defesa, e isso não diz respeito ao Superior Tribunal Militar.

O presidente do STM, o civil Carlos Alberto Marques Soares, defendeu o oficial e disse que as declarações do general sobre homossexuais expressam a ¿voz corrente¿ entre os militares.

Para ele, não houve intenção de discriminar os gays: ¿ O que foi dito é voz corrente nas Forças Armadas e não foi uma manifestação de homofobia.

Um indivíduo que entra para a vida militar e declara a um grupo pequeno que é homossexual, não é crime algum. É passível de ferir o decoro da classe se praticar ato público que lhe tire a capacidade de exercer a hierarquia e o respeito com seus pares e subordinados. Como, por exemplo, praticar ato libidinoso no quartel. Pode ser expulso seja homossexual ou heterossexual.

Durante a sessão, vários senadores repeliram as declarações de Cerqueira. Demóstenes Torres (DEM-GO) pediu que Suplicy entregue o requerimento convidando o general na terça-feira, antes da votação no plenário.

¿ O general vai ter que deixar claro que, num julgamento como magistrado, jamais terá um comportamento que contrarie a Constituição, que prega a igualdade de direitos, independente de gênero. Não é só uma conversa comigo. Tem que dar explicações públicas sobre o que disse ¿ disse Suplicy.

As declarações do militar não foram contestadas durante a sabatina, e sua indicação foi aprovada por unanimidade, com votos de 22 senadores. Mais tarde, Demóstenes disse que ele revelou preconceito contra os gays: ¿ Ele foi sincero, mas demonstrou preconceito e predisposição para condenar. Cobrar dignidade de gays equivale a dizer que o homossexualismo é indigno. Mostra que o STM continuará fechado para o assunto.

Já presidente da Frente Parlamentar da Defesa Nacional, deputado Raul Jungmann (PPS-PE), criticou o general: ¿ Grande parte dos generais romanos, que no passado enfrentaram campanhas duríssimas, era homossexual.

Não estamos diante de uma questão de princípios, e sim de direitos constitucionais.

Já o corregedor do Senado, Romeu Tuma (PTB-SP), não acha que a polêmica ameace a aprovação da indicação: ¿ Não vai atrapalhar, ele mostrou que é sincero.

O presidente do STM disse não achar que a repercussão possa levar o Senado a vetar.

¿ Se isso for causar algum problema de natureza que impeça um militar ou um juiz de tomar posse, ninguém tomaria posse. Veja bem, ninguém, que eu conheça, é contra os homossexuais.

O que somos contra é que a conduta fira a honra militar.

Desde que haja convivência respeitosa, não há problema.