Título: Os brasileiros continuam com a eterna ilusão do retorno
Autor: Sarmento, Cláudia
Fonte: O Globo, 15/02/2010, Economia, p. 12

ANGELO ISHI

O sociólogo Angelo Ishi, professor da Universidade Musashi, é o mais antigo pesquisador do movimento decasségui. Apesar da crise, ele vê luz no fim do túnel para os imigrantes brasileiros, mas afirma que uma melhora só virá com uma readaptação.

Vinte anos após a mudança da lei de imigração no Japão, como o senhor definiria o momento atual do movimento decasségui?

ANGELO ISHI: Costumo dizer que não é o paraíso, mas também não é o inferno. Os decasséguis precisam se readaptar à ideia de uma comunidade com dimensão de 200 a 250 mil pessoas. O número de brasileiros no Japão oscilou de 200 a 250 mil entre os anos de 1996 a 2000. Obviamente, não é possível uma comparação simples com as épocas passadas, já que naquele tempo a maioria dos adultos estava empregada, ao contrário da crise atual. Mas há luz no fim do túnel: nunca o governo brasileiro esteve tão empenhado em relação aos "brasileiros no mundo"; nem o governo japonês tão ciente dos problemas enfrentados pelos brasileiros no Japão; e a imprensa japonesa, do nosso lado.

Quais as principais características dos decasséguis?

ISHI: A grande característica é a ambivalência, pelo fato de que os brasileiros no Japão são, em sua maioria, nikkeis: estrangeiros, porém descendentes de japoneses. A ajuda de 300 mil ienes foi restrita aos nikkeis. Mas não encaro isso como favorecimento excessivo, pois o governo japonês está reparando o erro de ter facilitado a entrada dos nikkeis com a reforma da Lei de Imigração, em 1990.

Por que, depois de 20 anos, não houve uma integração?

ISHI: Porque os brasileiros continuam com o que chamo de "eterna ilusão do retorno". A receita que sugiro é: decretem o "Dia do Fico". Isso implica em se esforçar para aprender a difícil língua japonesa.

Na conjuntura atual, ainda há espaço para os brasileiros?

ISHI: Sim, e ao mesmo tempo não. Sim, porque o Japão vai continuar precisando de mão-de-obra estrangeira, e uma parcela dos nikkeis vai ter o seu espaço no mercado de trabalho. A resposta é "não" para os os que insistirem em manter o mesmo estilo de vida e a mentalidade de se relacionar apenas com conterrâneos. No novo cenário, o brasileiro precisa procurar trabalho fora do setor manufatureiro. A era dos operários bem pagos acabou. (C.S.)