Título: Nunca antes neste país
Autor: Franco, Bernardo Mello; Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 12/02/2010, O País, p. 3

Por ordem do STJ, Arruda é o primeiro governador preso por corrupção no exercício do cargo

Bernardo Mello Franco, Carolina Brígido, Isabel Braga e Catarina Alencastro

BRASÍLIA

ACorte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou do cargo e mandou para a cadeia o governador José Roberto Arruda (ex-DEM), acusado de comandar tentativa de suborno para atrapalhar a operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, que investiga o mensalão do DEM no Distrito Federal. Por 12 votos a 2, os ministros decretaram a prisão preventiva de Arruda e de outros cinco suspeitos de oferecer dinheiro para calar uma testemunha do escândalo.

Além disso, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pediu a abertura de ação penal contra o governador por corrupção de testemunha e falsificação ideológica de documento privado. Ele ainda deve ser denunciado futuramente por outros crimes, como formação de quadrilha e corrupção. Gurgel também requereu ao Supremo Tribunal Federal (STF) intervenção federal no DF.

As prisões foram decretadas pelo ministro Fernando Gonçalves, relator do inquérito da Operação Caixa de Pandora no STJ. A pedido dele, a decisão foi referendada pela Corte Especial, que reúne os 15 integrantes mais antigos.

Além de Arruda, receberam ordem de prisão Rodrigo Diniz Arantes, sobrinho e exsecretário particular do governador; Weligton Moraes, ex-secretário de Comunicação Social do DF; Geraldo Naves, suplente de deputado distrital pelo DEM; Antônio Bento da Silva, conselheiro do metrô de Brasília; e Haroaldo Brasil de Carvalho, ex-diretor da Companhia Energética de Brasília.

Para não passar pelo constrangimento de ser preso, o governador se apresentou à PF, antes mesmo da chegada do mandado de prisão. Mas tomou o cuidado de enviar antes, à Câmara Legislativa, uma mensagem em que pede afastamento do cargo por tempo indeterminado. Com isso, tenta manter o controle do governo, já que quem assumiu foi o vice-governador Paulo Octávio (DEM). Arruda pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) um habeas corpus para ser solto. O processo foi distribuído para o ministro Marco Aurélio Mello, que ainda vai analisar a sentença do STJ antes de decidir.

No pedido de prisão entregue ao STJ, o Ministério Público Federal reforça as acusações contra Arruda e o aponta como líder de ¿um grupo de pessoas unidas para dilapidar elevadíssimas quantias do patrimônio público oriundo de impostos¿. O texto acusa o governador de abuso de poder e de uso ilícito da máquina administrativa para permanecer no cargo a qualquer custo.

¿A organização criminosa instalada no governo do DF continua valendo-se do poder econômico e político para atrapalhar as investigações e, assim, garantir a impunidade¿, afirma o documento, assinado por Roberto Gurgel e pela subprocuradorageral da República Raquel Dodge.

Segundo o MP, a quadrilha continuava a agir, passados dois meses e meio do início do escândalo, que veio à tona em 27 de novembro de 2009. ¿As investigações em curso não paralisaram nem inibiram a atuação criminosa¿, diz o pedido de prisão. ¿O grupo criminoso exerce o comando do GDF, atua no desvio e apropriação de dinheiro público que deixa de atender à finalidade legalmente prevista e agora está apagando os vestígios de sua ação criminosa, mediante corrupção de testemunha e falsificação de documentos.

Também atua no controle dos parlamentares da Câmara Legislativa, encarregados de processar e julgar o pedido de impeachment¿.

Para os procuradores, há provas suficientes do envolvimento de Arruda na tentativa de subornar Edmilson dos Santos, o Sombra, e convencêlo a mentir à PF em troca de R$ 2 milhões.

O pedido de prisão acusa o grupo de agir com ¿desfaçatez e desinibição¿ para obstruir as investigações da PF e atrapalhar o trabalho do MP e da Justiça. ¿Cabe ao Judiciário assegurar efetivamente a ordem pública, paralisando a atuação ilícita deste grupo criminoso e prevenindo a ocorrência de outros crimes que venham a praticar¿.

O pedido do MPF foi encerrado com um alerta ao tribunal: ¿Não resta outra alternativa se não a prisão preventiva dos requeridos, sob pena de a instrução criminal ficar seriamente comprometida pela conduta audaciosa do grupo criminoso (...) e de o Estado, mais uma vez, sucumbir ao grande poder da criminalidade organizada¿.

Dos outros quatro que tiveram a prisão decretada, até 20h30m apenas um estava na cadeia: Rodrigo Arantes, sobrinho e secretário particular de Arruda, que se apresentou à PF.

Os demais disseram que iriam se entregar. Arruda foi levado à sala do diretor Técnico-Científico da PF, no prédio do Instituto Nacional de Criminalística. Na condição de preso, Arruda teve que entregar o celular. Inicialmente, a previsão era que ele fosse transferido para uma ¿sala de Estado-Maior¿, isto é, uma sala sem grades que faz as vezes de cela, tão logo assinasse o mandado de prisão.

Na Câmara Legislativa, a mensagem de Arruda pedindo afastamento foi lida em plenário, consumando a licença. O presidente da Câmara, Wilson Lima (PR), aliado de Arruda, convocou reunião para hoje com os distritais e o governador em exercício, Paulo Octávio.

¿ Vamos nos solidarizar com Paulo Octávio, ajudar na governabilidade ¿ disse Lima.

Deputados governistas protestaram contra a prisão de Arruda e o pedido de intervenção: ¿ Não tem intervenção! A palavra de ordem hoje é governabilidade ¿ afirmou Batista das Cooperativas (PRP).

Após saber da ordem de prisão, Arruda deixou a residência oficial de Águas Claras num carro com vidros escuros, seguido por um comboio de quatro veículos. Eles entraram pela garagem da superintendência da PF. Estavam com o governador, além do porta-voz, André Duda, o secretário de Segurança, Wlamir Lemos, o de Transportes, Alberto Fraga, o diretor-geral da PF, Luiz Fernando Corrêa, e outros dois diretores da PF