Título: Adversários cordiais
Autor: Pereira, Daniel
Fonte: Correio Braziliense, 08/06/2009, Política, p. 4

Enquanto se ameaçam nos microfones, petistas e tucanos agem em harmonia nos bastidores. Trocam recados que convergem para a análise segundo a qual uma investigação seria apenas prejuízos para ambos os lados

¿CPI a gente sabe como começa, mas não como termina.¿ Consagrada como uma espécie de epíteto das comissões parlamentares de inquérito, a frase cunhada por Ulysses Guimarães (PMDB), ex-presidente da Câmara dos Deputados e da Assembleia Nacional Constituinte, anda em baixa nos corredores do Congresso. Não é entoada por parlamentares engajados na investigação da Petrobras, inclusive oposicionistas, que prometem, em público, abrir a ¿caixa-preta¿ da empresa responsável pela maior fatia de investimentos estatais no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

O ocaso de um lugar-comum tão caro aos congressistas é sintomático. Revela a falta de disposição de governistas e oposicionistas para apurar suspeitas de irregularidades na maior estatal brasileira. Enquanto se ameaçam nos microfones, petistas e tucanos agem em harmonia nos bastidores. Trocam recados que convergem para a análise segundo a qual uma investigação, a fundo, renderá apenas prejuízos para ambos os lados. Até em termos financeiros. No sábado retrasado, o Correio revelou que representantes de construtoras e fornecedores da Petrobras estavam procurando senadores a fim de deixar clara a preocupação com a análise de contratos firmados com a empresa.

Nas conversas, lembravam que 2010 é ano de eleição e que seria pouco inteligente os partidos exporem à luz do sol os principais financiadores de campanha. O argumento foi muito bem-recebido. Além dele, contribui para a costura de um acordo destinado a manter baixa a temperatura da investigação o fato de PSDB e PT terem plena consciência do uso político que fizeram da Petrobras. Os primeiros, em oito anos de gestão Fernando Henrique Cardoso. Os segundos, nos seis anos e meio até agora de mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Cada um sabe onde seu calo aperta. E como aperta. Ninguém quer expor a trovoadas seus respectivos telhados de vidro.

Esse cenário é tão claro que, antes da instalação da CPI da Petrobras, o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), reclamou a colegas da insistência do tucano Álvaro Dias (PR) em abrir a investigação. Irônico, Virgílio lembrou que, ao comprar a briga sobre os gastos com cartões corporativos, Dias até fez cócegas na imagem da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, mas expôs despesas realizadas em nome de FHC e da ex-primeira dama Ruth Cardoso, já falecida. Ou seja, deu um tiro que atingiu também o ninho tucano.