Título: Ex-assentada acusa MST de usá-la como laranja
Autor: Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 13/02/2010, O País, p. 11

Conta na CEF tem R$ 750 mil depositados; superintendente do Incra em SP afirma que não há irregularidade

SÃO PAULO. A trabalhadora rural Zildenice Ferreira dos Santos, a Dida, denunciou ontem, ao Ministério Público Federal, em Ourinhos, no interior de São Paulo, que acredita estar sendo usada como ¿laranja¿ de uma conta conjunta na Caixa Econômica Federal (CEF). Foram depositados R$ 750 mil na conta, que beneficiaria o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) por meio de um convênio público. A conta, no entanto, não permite saques e depende de três assinaturas para que o dinheiro seja repassado a empresas de material de construção.

Ex-assentada, Zildenice deixou o MST e trabalharia para a Cutrale, em Iaras (PS), como colhedora de laranjas.

¿ Ela recebeu um extrato e foi ao banco. Lá, foi informada de que não poderia movimentar a conta, que está em nome de outro procurador, Paulo Guimarães.

Nossa suspeita é que haja um esquema irregular aí, porque o assentamento foi criado pelo MST, envolvido em outros casos suspeitos. Além disso, como o nome dela aparece, em algum momento vão cobrar impostos pelo dinheiro ¿ disse a advogada de Dida, Fernanda Daniele Pereira Mariano.

O superintendente do Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) em São Paulo, Raimundo Pires Silva, afirmou ontem que espera apenas ser chamado pelo MPF para esclarecer o caso. Ele apresentou documentos, como um comunicado, assinado por Zenaide em 15 de julho de 2008, declarando que não seria mais procuradora de seu grupo de assentados no Programa Incra/CEF de habitação para o assentamento Zumbi dos Palmares.

No dia seguinte, mais de 80 assentados nomearam Luzia da Silva para o lugar de Zenaide.

Outros dois assentados integram o grupo de procuradores, e seus nomes não foram divulgados. O Incra informou que em outubro de 2008 enviou o ofício 36/2008 à CEF, pedindo a troca de procurador.

Incra informa que dinheiro é para programa de habitação

O dinheiro depositado na conta, segundo o superintendente do Incra, foi depositado pela CEF para o programa de habitação. Os assentamentos geralmente recebem verbas de programas federais para sua estruturação, como no caso das moradias. A conta funciona como uma espécie de ¿Construcard¿: os assentados escolhem o material, os procuradores assinam a compra junto à empresa fornecedora, e o Incra repassa a compra à CEF, que repassa o dinheiro diretamente ao empresário, de acordo com Silva.

¿ Não há que se falar em desconhecimento de informações ou uso indevido de nome.

Nem de mau uso de dinheiro público ou de repasse para qualquer movimento, como o MST. E as casas estão em construção, para quem quiser ir ao assentamento vê-las ¿ disse o superintendente.

A advogada, no entanto, alega que o projeto habitacional do assentamento está paralisado há dois anos, embora o extrato recebido por sua cliente, em janeiro, comprove que ocorreram movimentações.

Dida e sua ex-companheira Darci Maria Batista foram o primeiro casal homossexual do país a conseguir um lote de terra em assentamento do Incra.

Mas, quando o casamento acabou, Dida teria desistido do lote em favor da companheira, que continua no MST. Dida mora em outro lote, de parentes, e trabalha na Cutrale. A direção do MST foi procurada, mas não retornou os pedidos de entrevistas.