Título: Na primeira noite na prisão, abatimento
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 13/02/2010, O País, p. 3

Governador afastado ocupa, porém, uma sala ampla na PF, com ar-refrigerado e sofás

BRASÍLIA. Detido numa sala especial com arcondicionado e sem grades, o governador afastado do Distrito Federal, José Roberto Arruda (ex-DEM), não conseguiu dormir na primeira noite que passou na Polícia Federal após a decretação de sua prisão pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo seus auxiliares. Só foi cochilar ontem durante o dia, entre uma e outra visita. Arruda recebeu integrantes do governo e um de seus advogados, mas nenhum familiar foi até o prédio. Os aliados disseram que ele está triste e abatido.

¿ Ninguém consegue dormir numa situação como esta. Ele está sofrido, mas está bem. É uma situação humilhante para um governador ¿ disse o chefe da Casa Militar, Ivan Rocha, primeira pessoa a visitá-lo no dia seguinte à prisão, por volta das 9h.

Além dele, esteve no prédio do Instituto de Criminalística da PF o secretário de Transportes do GDF, Alberto Fraga. Ele chegou por volta das 12h30m e encontrou Arruda dormindo.

¿ É evidente que há um quadro de abatimento, principalmente porque ele já está preso há quase 24 horas e não houve nenhum depoimento.

É um quadro de preocupação, de constrangimento.

Se ele não estivesse sofrendo, não seria humano ¿ observou o secretário, classificando de injusta a situação.

Perguntado sobre a possibilidade de renúncia do governador, ele argumentou: ¿ Ele já está preso. Vai renunciar por quê? O escritório que abriga Arruda na Polícia Federal tem cerca de 40 metros quadrados, banheiro e ar-condicionado. De acordo com agentes da PF, ele não tem acesso a telefone, internet e jornais, recebendo apenas informações levadas pelos visitantes. É vigiado por um policial.

Para descansar, há dois sofás. Com a negativa do habeas corpus ontem, os policiais federais providenciariam uma cama. No fim da tarde, o governador dormia novamente.

As visitas estão autorizadas das 8h às 18h.

Os advogados podem entrar no local de prisão sem autorização prévia, mas parentes, amigos e auxiliares precisam fazer agendamento e estão sujeitos a ter o acesso negado, conforme a conveniência para os investigadores. O secretário de Relações Institucionais do Governo do Distrito Federal, Marcos Vinícius Brito, e o deputado distrital Benedito Domingos não puderam entrar, por ordem dos policiais federais.

Na entrada, o parlamentar se disse interessado em orar por Arruda.

No meio da tarde, visitou o governador um de seus advogados, José Gerardo Grossi. Ele saiu cerca de 20 minutos depois, ironizando as perguntas dos jornalistas. Disse que, negado o habeas corpus, recorreria à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e à Organização das Nações Unidas (ONU). E sugeriu, em tom de piada, que o governador fosse levado para a Polinter de São Gonçalo, cujos internos sofrem com a onda de calor: ¿ Deve estar uns 57 graus.

Do lado de fora da superintendência da PF, alguns poucos manifestantes gritavam palavras de apoio a Arruda. Várias faixas com dizeres de incentivo foram estendidas no local.

¿Quem ama Brasília, torce por Arruda. O resto é politicagem¿, dizia uma delas.

Um grupo chegou a entoar uma reza. Outro acendia velas pelo governador. O buzinaço feito por manifestantes contra Arruda se misturava ao som do megafone usado pelos apoiadores, que atribuíam a prisão a uma grande armação.

¿ Essas negociações sempre existiram. Vocês não viram as do PT? ¿ perguntou Nilva Gomes, de Riacho do Fundo, ressaltando que Arruda levou muitas obras para sua região.

Do lado de dentro, Arruda recebia informações sobre o clima político no governo. O encontro com Fraga foi após uma reunião com os deputados distritais. Fraga disse que, agora, recairá forte pressão sobre o vice, Paulo Octávio (DEM), que assumiu o governo e também é acusado de participar do esquema de corrupção.

O secretário criticou o pedido de intervenção no governo, apresentado pela Procuradoria Geral da República, dizendo que o requerimento pode abrir um perigoso precedente.

¿ Amanhã, pode estar sendo extinta a Câmara Distrital. Amanhã, pode estar sendo extinta a representação política ¿ afirmou. ¿ Se houver alguma aceitação desse pedido, pelo menos que tenha respaldo jurídico. A peça que ele (o procurador-geral da República, Roberto Gurgel) fez não tem. Se há culpados, tem de haver punição. O que não pode é partir da premissa de que o Distrito Federal não tem competência para tocar a sua vida.