Título: Arruda é mantido na cadeia
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 13/02/2010, O País, p. 3

Ministro do STF nega habeas corpus e governador afastado do DF passará carnaval preso

BRASÍLIA O governador afastado do Distrito Federal, José Roberto Arruda (sem partido, ex-DEM), vai passar o carnaval preso. O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou ontem habeas corpus ao governador e o manteve na prisão da Polícia Federal, em Brasília.

O ministro elogiou a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de mandar Arruda para a cadeia, sob o argumento de que ele estaria tentando atrapalhar as investigações do esquema de corrupção instalado no governo do DF. Agora, o mérito do pedido de habeas corpus só será julgado em sessão da Primeira Turma ou do plenário do Supremo, que só se reunirão novamente na quarta-feira.

No despacho, Marco Aurélio comemora, de forma contida, a prisão de Arruda como um basta à impunidade.

¿Se, de um lado, o período revela abandono a princípios, perda de parâmetros, inversão de valores, o dito pelo não dito, o certo pelo errado e viceversa, de outro, nota-se que certas práticas ¿ repudiadas, a mais não poder, pelos contribuintes, pela sociedade ¿ não são mais escamoteadas, elas vêm à baila para ensejar a correção de rumos, expungida a impunidade.

Então, o momento é alvissareiro¿.

Ele não poupou elogios à forma como a decisão foi tomada pelo ministro Fernando Gonçalves, do STJ.

¿A peça, tomada como a fundamentar o ato constritivo da liberdade de ir e vir do paciente, fez-se ao mundo jurídico ante esmero insuplantável.

Apontou-se a necessidade das prisões, inclusive a do governador em exercício (Arruda), visando a preservar a ordem pública e campo propício à instrução penal considerado o inquérito em curso¿, escreveu Marco Aurélio.

Decisão final pode levar mais tempo

O ministro considerou grave a prisão em flagrante de um suposto enviado de Arruda, o funcionário público aposentado Antonio Bento da Silva, tentando comprar uma das testemunhas do inquérito, o jornalista Edmilson Edson dos Santos, conhecido como Sombra. O episódio ocorreu na semana passada.

Marco Aurélio disse ter ficado perplexo com as ¿esdrúxulas manobras¿ de Arruda. Para ele, a denúncia contém dados concretos, que evidenciam desvios de conduta, atingem a ordem pública e atrapalham o andamento do inquérito.

O ministro citou uma decisão do STF, publicada no Diário da Justiça em 24 de novembro de 1995, que julgou inconstitucional o dispositivo da Lei Orgânica do Distrito Federal que impede a prisão do governador antes de sua condenação penal definitiva.

Na ocasião, a Corte considerou a regra da Lei Orgânica incompatível com a Constituição, a única capaz de disciplinar casos de imunidade à prisão.

Na decisão, o ministro também se adiantou sobre um fato que está para ser julgado no tribunal: a possibilidade de se abrir processo contra governador sem que o Legislativo local dê autorização para isso. Marco Aurélio citou um caso que começou a ser julgado no STF sobre o então governador de Rondônia, Ivo Cassol, no qual ele votou pelo fim da obrigatoriedade da licença da Assembleia Legislativa.

No processo de Cassol, o ministro sustentou que a licença seria uma forma de o Legislativo interferir no Judiciário, algo proibido pela Constituição.

Isso porque, segundo Marco Aurélio, o governador quase sempre tem o apoio da maioria dos parlamentares locais e, por isso, dificilmente a licença é concedida. Essa questão será discutida na mais alta Corte do país no julgamento de uma ação proposta pelo Ministério Público contra essa regra. Não há data marcada para isso acontecer.

No fim do despacho sobre Arruda, Marco Aurélio fez referência ao que ocorreu, no último Natal, quando o presidente da Corte, Gilmar Mendes, revogou uma decisão tomada por ele dias antes que impedia a ida do menino Sean Goldmann para os Estados Unidos para viver com o pai biológico.

Marco Aurélio recomendou que isso não aconteça novamente: ¿Outrora houve dias natalinos. Hoje avizinhase a festa pagã do carnaval. Que não se repita a autofagia¿.

Normalmente, o mérito de um habeas corpus é julgado por uma das duas turmas do STF, composta de cinco ministros. Mas, em casos de muita repercussão, a ação pode ser levada para o plenário ¿ como aconteceu em 2008 com o pedido de habeas corpus feito pelo banqueiro Daniel Dantas.

Antes do julgamento do mérito, porém, Marco Aurélio quer um parecer do Ministério Público, o que poderá levar ainda mais tempo.

Se a defesa não quiser esperar tanto, tem duas possibilidades. A primeira é pedir ao próprio relator que reconsidere a decisão, uma tática com pouca chance de vitória para Arruda. A segunda opção é propor um agravo regimental contra a decisão de Marco Aurélio. Se o ministro negar a revisão da medida, terá de levar o pedido à Primeira Turma ou ao plenário para a deliberação dos demais colegas, sem a necessidade de haver parecer do Ministério Público. De qualquer forma, nenhuma das alternativas deixa esperança de liberdade para Arruda antes do fim do feriado.