Título: Caixa dois é erva daninha; arranca uma e outra nasce
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 21/02/2010, O País, p. 13

Presidente do STJ, Cesar Asfor Rocha diz que prisão de José Roberto Arruda foi "emblemática"

ENTREVISTA

O presidente do Superior Tribunal de Justiça, Cesar Asfor Rocha, que decretou a prisão do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, acredita que o caso será exemplo para autoridades envolvidas em corrupção.

Para ele, a decisão pode inibir até o caixa dois nas campanhas eleitorais deste ano. Com a experiência de quem ocupou quase todos os cargos estratégicos do Judiciário, compara o caixa dois à erva daninha: pode ser combatida, mas não extirpada.

Jailton de Carvalho BRASÍLIA

O GLOBO: Pela primeira vez, um governador, em pleno exercício, foi preso. A que se deve essa conjunção de decisões? CESAR ASFOR ROCHA: À contundência da prova coletada. A discussão era saber se poderia haver alguma situação em que um governador poderia ter sua prisão preventiva decretada sem prévia autorização da Câmara Distrital para que fosse iniciada ação penal. O tribunal entendeu que, na hipótese de obstrução do andamento processual, com as evidências contundentes que havia, seria possível a decretação da prisão preventiva e o afastamento do governador independentemente de haver ou não autorização da Câmara Distrital.

Como se chegou à decisão de chamar a Corte Especial para deliberar? ASFOR ROCHA: O procuradorgeral da República, Roberto Gurgel, esteve aqui (no STJ) apresentando o pedido de prisão preventiva às 14 horas de quinta-feira, véspera da semana do carnaval. O ministro Fernando Gonçalves (relator) provocou a presidência. Disse que iria tomar uma decisão, mas gostaria de uma manifestação do tribunal imediatamente. Tendo em vista a absoluta relevância do caso, era de bom alvitre que houvesse uma manifestação do tribunal. Houve compreensão por parte de todos os colegas de que a matéria era urgente.

Outros governadores, outras autoridades são alvos de investigações.

É possível que decisões similares aconteçam? ASFOR ROCHA: É, sem dúvida nenhuma, uma sinalização que o Judiciário dá, embora não tenha agido com esse propósito.

É uma sinalização no sentido de que qualquer que seja a importância do réu, o Judiciário vai aplicar a lei.

Casos como esse podem ter reflexo na diminuição de caixa dois na eleição? ASFOR ROCHA: Ainda que não tenhamos tido preocupação nesse sentido, a decisão do STJ é emblemática, histórica, porque é a 1avez que um governador é preso no exercício do mandato, sem autorização da casa legislativa.

No mínimo, se em alguma entidade federativa tiver alguém praticando atos de corrupção, essas pessoas estarão preocupadas.

Se o governador do DF foi preso e afastado do exercício do seu mandato, todos têm que ficar com uma preocupação mais acentuada. Fui corregedor eleitoral.

É muito difícil acabar com o caixa dois. Só há uma forma de acabar com o caixa dois na campanha eleitoral: acabar com o caixa dois (no dia a dia). Se não acabar com o caixa dois, vai ter caixa dois na campanha.

O senhor fala de caixa dois no setor empresarial? ASFOR ROCHA: No setor produtivo, nas empresas particulares.

Só tem esse jeito: os meios de inibição do caixa dois estão crescentes. Temos o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) com uma atuação extraordinária. Temos a PF mais atuante, inclusive pelos instrumentos tecnológicos de que dispõe.

Combatendo o caixa dois no dia a dia, vai se combater o caixa dois nas eleições. Mas é uma praga, uma erva daninha, arranca uma e outra nasce. Mas tenho certeza que vai ser mais difícil a utilização de caixa dois.