Título: Ameaça de guerra
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 28/05/2009, Mundo, p. 30

Ditador Kim Jong-il ameaça recomeçar o conflito contra a vizinha Coreia do Sul. Hillary Clinton avisa que as ¿ações terão consequências¿.

Regime comunista do norte eleva o tom do desafio, rompe o armistício que pôs fim ao conflito com o sul nos anos 1950 e ameaça atacar. Estados Unidos adverte que ações de Pyongyang ¿terão consequências¿

A tensão promete aumentar na fronteira entre as duas Coreias, uma das regiões mais armadas do planeta, à qual o ex-presidente norte-americano Bill Clinton se referiu como ¿o lugar mais assustador do mundo¿. Dois dias depois de realizar seu segundo teste nuclear, seguido do disparo (experimental) de uma salva de mísseis sobre o Mar do Japão, a Coreia do Norte ensaia pôr fim a 56 anos de tensa paz com a Coreia do Sul. O governo de Pyongyang rompeu o tratado de armísticio assinado no fim da Guerra da Coreia (1950-1953) e ameaçou atacar o país vizinho ¿na prática, afirmou que a Península Coreana voltou ao estado de guerra. O ditador Kim Jong-il reage à decisão do governo de Seul de se integrar à Iniciativa de Segurança contra a Proliferação (PSI, em inglês), criada em 2003 pelos Estados Unidos e aceita por 95 países. A iniciativa tenta impedir o tráfico internacional de armas de destruição em massa e, para isso, permite aos países-membros que interceptem navios em alto-mar.

¿Qualquer ato hostil contra nossos navios, inclusive busca e captura, será considerado uma violação imperdoável de nossa soberania e responderemos com um contundente golpe militar¿, comunicou a agência oficial norte-coreana, a KCNA. O governo sul-coreano preferiu não responder de imediato à provocação. Um porta-voz do Ministério da Unificação sul-coreano informou os jornalistas que ¿por enquanto não tem uma resposta oficial a respeito¿. No entanto, o país possui o respaldo dos acordos de defesa com os Estados Unidos, que conta hoje com cerca de 28.500 soldados na Coreia do Sul.

No plano internacional, as ameaças do regime comunista de Pyongyang provocaram reações tão duras e unânimes quanto o teste nuclear de segunda-feira. ¿A Coreia do Norte fez uma escolha¿ e essas ações terão consequências¿, advertiu a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton. Ela acrescentou que ¿ainda há uma chance¿ de os norte-coreanos se reintegrarem ao processo de negociações entre seis partes ¿ além das duas Coreias, os EUA, o Japão, a China e a Rússia. O chanceler russo, Sergei Lavrov, reiterou o chamado ao Conselho de Segurança das Nações Unidas para que sancione com firmeza o regime de Pyongyang, até recentemente um aliado de Moscou. ¿Repito uma vez mais que temos de nos levantar em defesa do regime de não proliferação (de armas nucleares), mas lembrando sempre que essa questão tem de ser resolvida pelo diálogo¿, disse Lavrov.

Chantagem Uma fonte sul-coreana explicou ao Correio que considera pouco provável que os norte-coreanos se arrisquem a uma nova guerra. De acordo com o Ministério da Defesa, o país ainda não aumentou as tropas na zona de fronteira, mas manterá os fortes dispositivos militares habituais. A agência local Yonhap detalhou que o governo reforçou a fronteira marítima com um navio de guerra e se prepara para enviar mais um porta-aeronaves.

Especialistas cogitam a hipótese de que haja escaramuças parecidas com as registradas no Mar Amarelo em 1999 e 2002, e avaliam que Pyongyang tenta manter a chantagem nuclear para ¿chamar a atenção¿ do presidente dos EUA, Barack Obama. No jornal Minju Joson, o governo norte-coreano considerou ¿ridículo¿ que a Casa Branca ¿pense que nos colocará de joelhos¿ com represálias econômicas. ¿Vivemos com as sanções americanas durante décadas. A política hostil dos EUA é como tentar golpear uma rocha com um ovo podre.¿

Para a imprensa sul-coreana, há indícios de que Pyongyang reativou a central de Yongbyon, que produz plutônio para bombas atômicas. A Coreia do Norte ainda não é capaz de produzir ogivas nucleares compatíveis com seus mísseis, mas tem o quarto maior exército do mundo, com mais de um milhão de soldados, e já demonstrou capacidade para bombardear o território japonês e as forças americanas (terrestres e navais) na região.

-------------------------------------------------------------------------------- Qualquer ato hostil será considerado uma violação imperdoável de nossa soberania e responderemos com um contundente golpe militar

Comunicado da agência oficial norte-coreana, KCNA

-------------------------------------------------------------------------------- Conversa providencial

Robert Gates, secretário de Defesa norte-americano, viajou para a Ásia e se encontrará, no sábado, com os colegas do Japão e da Coreia do Sul para uma conferência sobre segurança regional. O encontro, em Cingapura, já estava marcado antes do teste nuclear norte-coreano, que agora se tornará o tema principal da reunião.

-------------------------------------------------------------------------------- Duelo desigual

Opções distintas estabelecem equilíbrio militar entre as Coreias

Efetivos Com um milhão de combatentes em serviço e uma reserva de 4,7 milhões, a Coreia do Norte supera com folga os 687 mil soldados e 4,5 milhões de reservistas de que dispõe a Coreia do Sul.

Armas terrestres Entre tanques, peças de artilharia e outros equipamentos ofensivos e defensivos, inclusive antiaéreos, o Sul tem mais de 8 mil unidades e bate facilmente o Norte em termos de tecnologia. O regime comunista conta com o dobro de armamentos dessa classe.

Marinha São 85 navios e 20 submarinos sul-coreanos contra, respectivamente, 708 e 79 norte-coreanos.

Aviação É também graças à tecnologia que a Coreia do Sul se impõe também nesse setor, com mais de 500 aviões e outro tanto de helicópteros. O Norte conta com 1.700 e 600 unidades, respectivamente.

Mísseis É o grande trunfo da Coreia do Norte, embora não tenha ainda demonstrado capacidade de equipá-los com ogivas atômicas. O país comunista já testou mísseis com alcance de até 3 mil km e está desenvolvendo um com até 7 mil km de alcance, suficiente para atingir o litoral dos EUA no Pacífico. A Coreia do Sul dispõe de 800 modernos sistemas de mísseis, porém de menor alcance.