Título: Um cheiro de Arruda que não sai
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 25/02/2010, O País, p. 4

Imagens do governador preso enfeitam centro social do aliado Wilson Lima

BRASÍLIA. Mesmo que se esforce muito, o novo governador interino do Distrito Federal, Wilson Lima (PR), terá dificuldades para aparentar independência em relação ao governador afastado José Roberto Arruda (ex-DEM). A imagem de um Arruda sorridente, bem diferente do político preso há duas semanas, está em todos os cantos do centro social que o novo ocupante do Palácio do Buriti mantém no Gama, cidadesatélite de Brasília. Ontem, Lima anunciou algumas medidas moralizadoras, numa tentativa de evitar a intervenção federal no DF.

Deputado distrital há três mandatos, ele mantém uma típica rotina de vereador assistencialista em seu reduto eleitoral, a meia hora de carro do centro da capital. Lá, um prédio sem letreiro na porta serve de sede para o Instituto Cultural Wilson Lima, misto de escritório político e centro de prestação de serviços comunitários. Em 2008, o novo governador foi acusado de desviar servidores da Câmara Legislativa para atender os eleitores.

Só na recepção do centro, Arruda aparece ao lado de Lima em três fotos.

A assinatura dele também está num diploma de ¿parceiros da escola¿, que vincula as atividades do instituto à Secretaria de Educação do Distrito Federal. Para completar, um adesivo colado na porta principal vincula o nome do novo chefe do Executivo ao desenho de um galho de arruda, marca registrada do governador em suas campanhas eleitorais.

A assessoria de Lima informou que o instituto estaria desativado há um ano e que o local teria sido transformado em escritório político. No entanto, a entidade continua a ser anunciada como ¿menina dos olhos do deputado¿ em sua página na internet, onde a primeira-dama interina, Márcia Lima, cobra a liberação de verbas federais. O site divulga cursos gratuitos de artesão, manicure e até ¿designer de sobrancelhas¿.

No local, há mais sinais de que os serviços continuam de vento em popa, como uma pilha de fichas de inscrição sobre a mesa de entrada e salas de aula equipadas com dezenas de cadeiras de plástico. A recepcionista sustentou que as aulas estariam paradas, mas admitiu que o local é usado para atender pedidos diversos de eleitores de Brasília e até de cidades no entorno do DF.

Ontem, em seu primeiro dia no poder, Lima anunciou a suspensão de todos os repasses de verba pública a empresas acusadas de financiar o mensalão do DEM. Além disso, acertou a demissão ¿a pedido¿ do secretário de Planejamento, Ricardo Pena, citado na Operação Caixa de Pandora. E pediu ao Tribunal de Contas local que apresse a conclusão de auditorias em contratos com firmas suspeitas de pagar propina ao grupo de Arruda.

O primeiro compromisso do novo governador foi um encontro a portas fechadas com o ex-vice Paulo Octávio, que renunciara na véspera, após 12 dias no comando do governo do Distrito Federal.

Depois, Lima reuniu os secretários para pedir apoio à sua gestão. O titular dos Transportes, Alberto Fraga, chegou a anunciar que Lima só ficaria no cargo até abril, para disputar a reeleição como deputado distrital. A informação foi desmentida pela assessoria do governador interino, e o secretário teve que voltar atrás.