Título: Um país, uma catástrofe, e dois presidentes
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Fonte: O Globo, 28/02/2010, O Mundo, p. 37

Bachelet viaja de helicóptero a áreas atingidas pelo terremoto, e Piñera anuncia dados oficiais em Santiago

A FUMAÇA sobe de um prédio em chamas nos arredores de Santiago, após o terremoto que atingiu grande parte do país. Futuro governo enfrentará o esforço de reconstrução

BACHELET NO Escritório Nacional de Emergência, em Santiago: fim de governo tumultuado por tremor

UMA PONTE destruída pelo terremoto na estrada entre o centro e o sul do país: infraestrutura atingida

SANTIAGO. Estes últimos dias do governo de Michelle Bachelet, que passa o cargo para Sebastián Piñera no dia 11 de março, deveriam ser marcados por uma agenda de inaugurações de obras e festas pelo Bicentenário da Independência do Chile. Mas o roteiro se transformou na madrugada de ontem, com uma operação de socorro iniciada ainda de madrugada às vítimas do maior terremoto que o país sofreu nos últimos anos. E num indício de que a passagem de cargo está bem próxima, os chilenos em partes do país que ainda tinham energia elétrica viam na TV dois presidentes anunciando o número de mortos: Bachelet e Piñera.

O terremoto atingiu o Chile às 3h34m da madrugada, pouco depois de Bachelet chegar da Argentina. Numa Santiago completamente às escuras, a presidente chegou ao Escritório Nacional de Emergência (Onemi) uma hora depois, para avaliar as consequências e coordenar os esforços junto com os ministros. Dali mesmo fez um pronunciamento aos chilenos pedindo tranquilidade, depois partindo de helicóptero para Maule para avaliar pessoalmente os danos. Por volta das 9h, ela já estava nas áreas atingidas, explicando que despachara parte dos ministros para as zonas mais afetadas, enquanto outros ficariam na capital coordenando os trabalhos. Ela disse que iria a ¿todos os locais necessários¿. Curiosamente, o nome de Bachelet havia sido lembrado para ajudar Bill Clinton nos esforços de reconstrução do Haiti, arrasado por um terremoto em janeiro, após deixar o governo.

¿ Vamos precisar que a comunidade nos ajude ¿ disse Bachelet, destacando que o momento era de unidade.

Piñera pede colaboração de autoridades atuais

Em Santiago, um outro Gabinete se mobilizava: o de Sebastián Piñera. O presidente eleito também foi para o Onemi e, por volta de meio-dia, anunciou o número oficial de mortos. Ele colocou ainda o Gabinete nomeado à disposição do atual governo.

¿ O Chile tem que se unir para ajudar as famílias de quem perdeu a vida ¿ disse Piñera, acrescentando que estradas, aeroportos e portos haviam sido duramente atingidos. ¿ Infelizmente, o Chile é um país de catástrofes.

Se o terremoto marca tragicamente o fim do governo Bachelet, suas réplicas serão sentidas nesse início de governo Piñera. O presidente eleito disse ontem que não descarta utilizar um fundo de 2% previstos pela Constituição para ajudar as vítimas e na reconstrução do país e pediu a colaboração das autoridades atuais.

¿ Vamos colocar à disposição todo o futuro Gabinete ¿ disse Piñera. ¿ E vamos pedir às autoridades das regiões afetadas que continuem colaborando após 11 de março.

Como primeiros efeitos, Bachelet cancelou a viagem que faria ao Uruguai para assistir à posse de José Mujica e há dúvidas quanto à própria cerimônia de posse de Piñera. Agências de notícias citavam fontes dizendo que ela poderia não fazer pessoalmente a transmissão do cargo.

¿ A situação é extremamente grave ¿ disse a fonte.

Piñera receberá um país que precisará fazer um investimento não previsto em infraestrutura. Além disso, analistas preveem um forte impacto do tremor na economia e no mercado financeiro. O peso poderá ficar mais fraco, comprometendo programas de Piñera, como a geração de um milhão de empregos.

¿ Haverá grande custo fiscal para o governo em seu esforço de reconstrução ¿ avaliou Nick Chamie, da Pesquisa de Mercados Emergentes, de Toronto.