Título: Classe média brasileira é a segunda mais tributada na América do Sul
Autor: Nogueira, Danielle
Fonte: O Globo, 28/02/2010, Economia, p. 26

ACERTO DE CONTAS: Especialista sugere a criação de mais alíquotas de IR

Estudo da Ernst & Young mostra que Brasil perde apenas para Argentina

Apesar da introdução de duas novas alíquotas intermediárias - de 7,5% e 22,5% - na tabela do Imposto de Renda (IR) em 2009, a classe média brasileira continua entre as mais tributadas na América do Sul. Levantamento feito pela consultoria Ernst & Young, com oito países da região, mostra que os brasileiros com renda per capita de R$3 mil foram enquadrados na faixa de recolhimento de 22,5% de IR no ano passado, quase duas vezes o percentual da faixa na qual está a classe média uruguaia, por exemplo. Apenas a Argentina está à frente do Brasil no ranking, com alíquota de 27%.

Até 2008, eram três as alíquotas de IR vigentes no Brasil: zero, 15% e 27,5%. Desde o ano passado, foram incorporadas as outras duas alíquotas intermediárias. Com isso, os contribuintes com renda mensal de R$3 mil tiveram algum alívio no bolso, ao deixarem a faixa de 27,5% para serem enquadrados na de 22,5%. O que o estudo revela é que, mesmo assim, esse segmento social paga mais imposto que os seus pares nos países vizinhos.

- As novas faixas foram uma medida positiva. Mas o governo poderia fazer mais corrigindo a tabela - diz Tatiana da Ponte, sócia da área de Imposto de Renda Pessoa Física para a América do Sul da Ernst & Young.

Entre 1995 e 2009 a defasagem acumulada da tabela do IR chega a 63,62%, segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Sindifisco Nacional). Desde 2007, ela vem sendo reajustada em 4,5% ao ano, mas a correção não tem sido suficiente para repor as perdas passadas.

No Paraguai, alíquota em 2010 será de 10%

Em terceiro lugar no ranking sul-americano aparecem empatados Venezuela e Chile, com a classe média sendo enquadrada numa alíquota de cerca de 20%, seguidos de Peru (15%), Bolívia (13%) e Uruguai (12%).

O Paraguai vai iniciar a tributação sobre pessoa física em 2010, e a expectativa é que a alíquota incidente sobre a classe média fique em cerca de 10%, o que o colocaria em último lugar no ranking. Em todos os casos, foram consideradas alíquotas nominais, e o perfil da classe média seguiu a classificação local. No Brasil, o recorte de R$3 mil per capita foi feito a partir de cruzamento de dados do IBGE.

O tributarista Ilan Gorin, da Gorin Auditoria, concorda com Tatiana quanto à necessidade de correção da tabela:

- A criação de novas faixas não é suficiente para anular as perdas com a inflação. Para se fazer justiça, o ponto principal é a correção da tabela - afirma Gorin, ressalvando que o ideal na comparação entre países é que se tenha como parâmetro a carga tributária líquida.

O advogado tributarista Fábio Lunardini, da Peixoto e Cury Advogados, engrossa o coro dos que defendem reajustes mais ousados e sugere que sejam criadas mais faixas, a exemplo do que ocorre em outros países. No Chile e na Venezuela, por exemplo, há oito alíquotas. Na Argentina, são sete.

- As faixas atuais poderiam contemplar mais pessoas, caso houvesse a correção. Além disso, as classes mais altas deveriam ser mais tributadas, com a introdução de novas alíquotas - afirma Lunardini. - O Fisco dificilmente vai modificar tributos para arrecadar menos. Mas pode tornar a tributação mais abrangente para fazer justiça social.

A proposta do tributarista, porém, não é sequer cogitada pela Receita Federal, segundo o supervisor nacional do programa IR, Joaquim Adir.

- Não há estudos no momento para criação de novas alíquotas nem para reajustes da tabela além dos já anunciados - diz.

Para supervisor do IR, carga tributária é "a necessária"

Perguntado sobre a disparidade da carga tributária sobre a pessoa física entre o Brasil e os demais países sul-americanos, Adir alega que é preciso verificar a qualidade dos serviços nas nações onde a carga tributária é menor.

- Cada país tem a sua realidade, é difícil comparar. Será que nesses países oferecem o que o Brasil oferece? - indaga. - A carga tributária no Brasil é a necessária para que o país cumpra seu compromisso com a saúde e a educação. Para desenvolver um país, é preciso que a sociedade como um todo arque com os custos.