Título: O governo está preparado para intervir
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Fonte: O Globo, 28/02/2010, O País, p. 11

Ministro da Justiça diz que comissão do Senado assumiria função de Legislativo, em caso de intervenção no DF

O ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, afirmou que o governo federal está pronto para intervir no Distrito Federal se, nos próximos dias, essa for a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o pedido apresentado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. O governo federal já tem até uma ideia do modelo de intervenção: uma comissão especial do Senado assumiria as funções da Câmara Legislativa, também infestada de denúncias de corrupção. O ministro sustenta, no entanto, que, mesmo depois da prisão do governador José Roberto Arruda, da renúncia do vice Paulo Octávio e das acusações contra 8 dos 24 deputados, Brasília não deve perder a autonomia política nem suspender a festa de seus 50 anos de fundação.

Jailton de Carvalho

O Supremo Tribunal Federal está prestes a decidir sobre a intervenção no Distrito Federal. O governo federal está pronto para intervir?

LUIZ PAULO BARRETO: Sim. Se essa for a decisão do STF, o governo federal terá que intervir e o fará de maneira mais tranquila possível editando um decreto, que limitaria a intervenção no tempo, na forma de procedimentos. O governo está preparado, sim. Agora não estamos participando do processo de decisão. O pedido é de intervenção judicial feito pela Procuradoria Geral da República. Nesse caso, apenas o STF pode determinar. Se for decretada, o governo teria que preparar um decreto, com os moldes da intervenção.

E como ficaria a Câmara Legislativa? Ela também sofreria intervenção?

BARRETO: Nós não temos um modelo, um antecedente disso. A tendência é que, se houver a intervenção do Legislativo, seria criada uma comissão especial no Senado, que passaria a fazer vezes de Legislativo local. À comissão especial seriam submetidos os projetos de lei que já estejam tramitando na Câmara Legislativa. Mas pode ser diferente. Dependerá da avaliação do STF, que poderá editar outro modelo. Mas esse é um modelo que já existia antes de o DF conquistar autonomia e, provavelmente, seria o modelo a ser seguido. Mas, como é um fato novo, o STF pode decidir que a intervenção ocorreria de outra forma.

"É o caso mais documentado da História"

Como chefe da Polícia Federal, o senhor tem acompanhado todas as grandes operações de combate à corrupção. Qual a singularidade deste caso (mensalão do DEM)?

BARRETO: Os fatos são graves, até porque parece o caso mais documentado em áudio e vídeo na História brasileira. O fato de ter sido gravado, com áudios e vídeos muito nítidos, provocou uma certa revolta na população. O fato de parlamentares receberem dinheiro em bolsa, em meias, de uma maneira muito estranha, provoca uma indignação maior da população. Mas eu destacaria que, embora os fatos sejam dessa gravidade, as instituições estão funcionando bem.

O senhor não acha que pode ter sido um erro a autonomia política de Brasília?

BARRETO: É uma crise política grave, séria. Há outras crises no cenário estadual e nacional e eu não chego a questionar a autonomia. Há, claro, teses que defendem o fim da autonomia de Brasília. Eu discordo disso. Brasília conquistou essa autonomia legislativa, administrativa. Era um pleito de muito tempo. Os governadores eram nomeados pelo presidente da República no passado, muitas vezes sem qualquer respaldo da população. E a população quis decidir sobre seus destinos.

O que o Ministério da Justiça vai fazer para combater caixa dois e compra de votos no ano eleitoral?

BARRETO: Percebemos que muitas vezes o poder econômico pode acabar por influenciar esse tipo de escolha. Esse poder ainda é mais lesivo quando vem de caixa dois, de mecanismos ilícitos de financiamentos de campanha. A Polícia Federal vai estar atenta a isso.