Título: Negociação sob suspeita
Autor: Ribeiro Jr., Amaury
Fonte: Correio Braziliense, 04/06/2009, Política, p. 7

Juiz suspende aquisição de 30 máquinas para escanear visitas nos presídios. Governo já pagou R$ 3,8 mi e ainda não recebeu os esquipamentos.

Um dos equipamentos comprados pelo Ministério da Justiça deverá ser usado no presídio da Papuda O Departamento Penitenciário (Depen), órgão do Ministério da Justiça que administra os presídios do país, foi notificado ontem pela Justiça Federal de Brasília que terá de suspender a compra direta de 30 body scan (equipamentos de scanner de corpo humano) no valor total de R$ 19 milhões. Os equipamentos, que serão usados na vistoria de familiares e advogados de presos em várias penitenciárias, foi comprado sem licitação da companhia anglo-saxã Smiths Heimann por meio da empresa brasileira Ebco Systems Ltda.

A suspensão da compra foi determinada pelo juiz federal da 18ª Vara do Distrito Federal, Alysson Maia Fontenele, que concedeu liminar à VMI Sistemas de Segurança Ltda., representante no país da estatal chinesa Nuctech Company, que fábrica o mesmo tipo do equipamento. A VMI entrou na Justiça com ação para anular a compra direta dos body scan sob a alegação de que pelo menos 15 empresas no mundo fabricam o mesmo tipo maquinário, o que não justificaria a dispensa de licitação. O presídio de Segurança Máxima de Contagem, e o presídio da Papuda, no Distrito Federal, seriam alguns dos beneficiados com o equipamento.

Segundo Alysson Fontenele, o Depen não conseguiu comprovar no processo administrativo de compra que a empresa anglo-saxã é a única companhia no mundo a fabricar o equipamento de segurança. Ainda de acordo com o juiz, a compra direta contraria um parecer do próprio departamento jurídico do Ministério da Justiça, que determinou que o Depen fizesse, antes de finalizar a compra, uma ampla pesquisa para certificar no mercado mundial a existência de outros fabricantes dos equipamentos.

Coincidentemente, a compra direta dos maquinário foi efetuada pelo coordenador de políticas penitenciárias do Depen, o delegado federal Alexandre Cabanas, e pelo coordenador de Administração do mesmo órgão, Oscar Apolônio dos Nascimento Filho, que estão sob investigação no Tribunal de Contas da União (TCU) sob a acusação de terem beneficiados a empresa Smiths Heimann na compra de espectrômetros de malha (aparelhos que detectam drogas e armas).

Em 18 de junho de 2008, o TCU, em sessão ordinária do plenário, presidida pelo ministro Walton Alencar Rodriguez, determinou a convocação dos dois funcionários para explicar as irregularidades no processo licitatório. Cabanas e Apolônio também são réus no processo 008614 do TCU, que apura desde 2006 irregularidades na compra de equipamentos de informática no Serviço Federal de Processamento (Sepro), órgão do governo federal onde os dois funcionários trabalharam juntos. O processos ainda tramitam no TCU.

Parecer Documentos obtidos pelo Correio/Estado de Minas comprovam que Apolônio e Cabanas inovaram na forma de pagamento dos body scan. De acordo com a papelada, os dois funcionários determinaram no mês passado o empenho (pagamento) em forma de adiantamento de cerca de R$ 3,8 milhões para a Ebco, apesar de os equipamentos até hoje não terem ingressado no país. Segundo o advogado da VMI , Walfrido Moraes, o pagamento antecipado contraria um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), que determinava que a primeira parcela do pagamento somente deveria ser efetuada após a entrega dos equipamentos. ¿Mesmo assim, a fim de que o empenho não fosse bloqueado pela Justiça, o Depen fez o empenho por meio de uma carta de crédito do Banco do Brasil irrevogável, que autorizava a transferência de valores para a conta da Smiths no Canadá¿, disse o advogado.

Embora seja operada pelo belga Jacques Paul Barthelemy, a Ebco, que representa o consórcio anglo-saxão no país, tem 99% de seu patrimônio controlado pela Sicris S/A, uma off-shore (empresa que mantém o nome dos acionistas no anonimato) no paraíso fiscal de Luxemburgo. Curiosamente a empresa é representada no Brasil pelo irlandês Tomas Donavan, que tem o mesmo nome e idade de um famoso jogador de golfe já falecido.

De acordo com documentos da Junta Comercial de São Paulo, o nome do belga não aparece mais entre os sócios cotistas da empresa. Os consórcios Ebco-Smiths e VMI-Nuctech disputam uma licitação milionária da Receita Federal para a aquisição de scanners de inspeção portuária. A licitação da Receita Federal também está suspensa devido a denúncias de irregularidades praticadas pela Ebco e os demais concorrentes.