Título: Cientistas esperavam ondas maiores
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Fonte: O Globo, 02/03/2010, O Mundo, p. 25

Pequena destruição em países asiáticos e no Havaí contrariou cálculos

O alerta de tsunami gerou reações diversas mundo afora. No Japão, mais de 500 mil pessoas foram retiradas de suas casas. No Chile, a Marinha negou a vinda de ondas gigantes. Resultado: o país devastado pelo terremoto viu a água passar com força sobre os escombros. Horas depois, a tragédia anunciada, de tão fraca, mal fez cócegas nos países orientais. Intrigados por ver a natureza contrariar suas previsões, pesquisadores atribuem o inesperado comportamento do mar ao tamanho da ruptura provocada pelo terremoto no fundo do Oceano Pacífico.

A energia liberada pelo sismo teria aberto cerca de 600 quilômetros de assoalho oceânico. Pouco, se comparado à ruptura de quase mil quilômetros provocada pelo terremoto de Sumatra, em 2004. A tsunami gerada naquela ocasião atravessou o Oceano Índico e deixou mais de 200 mil mortos.

Além do tamanho da cratera formada pelos tremores, deve-se considerar onde está situado o ponto de ebulição.

¿ O terremoto de sábado foi a menos de 60 quilômetros do litoral ¿ ressalta Lucas Barros, professor do Observatório Sismológico da Universidade de Brasília. ¿ É, portanto, um trecho de baixa altitude. Quanto menos profundo for o local de ruptura do assoalho oceânico, menor a preservação da energia. Assim, as ondas geradas não conseguem viajar para tão longe.

Tsunami assumiu feições diferentes dessa vez

O US Geological Survey, órgão do governo americano encarregado do monitoramento de tsunamis, previa que as ondas chegariam ao Havaí com até 2,5 metros de altura. Em Honolulu, no entanto, a marolinha não passou dos 30 centímetros. Segundo Barros, os cálculos consideram as reações do mar em eventos anteriores. A tsunami do Chile, portanto, assumiu características diferentes de suas antecessoras.

¿ Havia uma tendência relacionada à propagação de ondas que, dessa vez, não foi respeitada ¿ admite. ¿ Mas é melhor haver excesso de alerta do que negligência.

Como prevenir é sempre o primeiro mandamento, chamou atenção a postura do governo chileno, que, logo após os tremores, negou os riscos de inundação de sua costa. Menos de três horas depois, no entanto, a Ilha Robinson Crusoé já era invadida por ondas de até três metros de altura.

¿ Como se tratava de um terremoto raso, próximo ao litoral, a possibilidade de que a tsunami chegasse ali era muito grande ¿ analisa Marcelo Gramani, diretor da Associação Brasileira de Geologia de Engenharia e Ambiental. ¿ Um sismo daquela potência certamente provocaria ondas gigantes. E, obviamente, a energia liberada vai se manifestar primeiro na região que estiver mais próxima.

De acordo com cientistas, também pesa contra o Chile o seu grande convívio com atividades sísmicas ¿ esperava-se, por isso, que o país assumisse posição mais cautelosa antes de negar uma tsunami, mesmo que ainda não haja medidas precisas sobre a dimensão que este fenômeno pode assumir.

Para Joseph Harari, professor do Instituto Oceanográfico da USP, a inércia chilena foi motivada pela falta de tempo.

¿ À medida que as ondas chegam à zona costeira, a população é avisada. Como o epicentro do sismo foi muito próximo ao litoral, pode não ter havido tempo hábil para tomar providências ¿ pondera.