Título: Tão perto, tão distantes
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 03/03/2010, O País, p. 3

Dilma e Serra aparecem juntos, com discursos de candidatos. Lula recomenda: "Boa governança é fazer o óbvio"

SOROCABA, SP. O governador José Serra, pré-candidato do PSDB às eleições presidenciais, e a ministra Dilma Rousseff, que disputará pelo PT, fizeram ontem o primeiro embate depois do resultado das pesquisas eleitorais que apontam os dois com uma diferença de apenas quatro pontos percentuais.

Sob a intermediação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que deu conselhos aos dois sobre a melhor maneira de fazer política, Dilma e Serra compararam suas atuações durante a crise financeira e tentaram se mostrar mais próximos do público durante a inauguração de uma fábrica de máquinas agrícolas da Case New Holland, do grupo Fiat, em Sorocaba.

Serra adiantou alguns pontos que podem vir a fazer parte de suas propostas econômicas. Ele disse que só uma política industrial pode gerar empregos e ainda rebateu a ideia de que o Brasil deve focar seu desenvolvimento na exportação de produtos agrícolas ou no de serviços.

¿ Ambas as teses (exportação de produtos agrícolas e serviços) estão erradas, são falaciosas ¿ disse Serra, no palanque da fábrica de tratores, sob os olhares de Dilma e Lula.

Serra lembrou a importância do setor automobilístico dentro da economia brasileira e disse que participou da modernização do setor, em 1995, quando muitas fábricas estavam para deixar o Brasil em função da valorização cambial, dos juros altos e da retirada de tarifas de importação. Atualmente, afirmou o governador, ainda há grande preocupação com a queda na exportação do setor, que gerou um déficit de US$ 3,7 bilhões, incluindo autopeças. Serra também citou a crise econômica, afirmando que o governo federal agiu corretamente, ao reduzir impostos, e nas ações por meio do BNDES para impulsionar a economia.

Serra mostrou a importância da cooperação do governo do estado na liberação de crédito para a compra de automóveis e disse ainda que o estado de São Paulo conseguiu manter os investimentos em 2009, que ficou no nível mais elevado de sua história, possibilitando a manutenção do nível de emprego.

¿ Eu pessoalmente participei dessa modernização em 1995, quando muitas fábricas, inclusive a Ford, estavam para deixar o Brasil em função da valorização cambial, juros e retirada de tarifas (de importação). Nós fizemos um programa de modernização que impulsionou bastante o setor, e ele veio se expandindo em condições de muito boa qualidade e produtividade ¿ afirmou Serra.

Antes do discurso de Serra, a ministra Dilma falou dos avanços do governo federal na liberação de crédito para a indústria e citou o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), que aplicou recursos para impulsionar a economia num momento de crise. Segundo ela, o investimento público no Brasil cresceu quase 80% no primeiro bimestre do ano e foi aplicado em infraestrutura.

Dilma, que anunciou oficialmente a sua candidatura no mês passado, disse que, nesse processo de crescimento, toda demanda por rodovias, portos, aeroportos, hidrelétricas, ferrovias, poços de petróleo da Petrobras, além de saneamento e habitação, alcançaram 51% de todo esse aumento.

Dilma fez questão de dizer que o estado de São Paulo, governado por Serra, foi um dos mais beneficiados pelas medidas adotadas pelo governo federal: ¿ Sem sombra de dúvida, os anos de 2008 e 2009 tiveram por parte do governo do presidente Lula uma firme determinação no sentido de não deixar que a crise nos abatesse. E essa determinação beneficiou o Brasil como um todo, mas beneficiou de uma forma especial São Paulo, que é hoje um dos maiores centros produtores de máquinas e equipamentos do país.

Serra lembrou sua origem humilde no bairro operário da Mooca, em São Paulo: ¿ Tenho identificação com a indústria na minha origem. Sou de bairro operário, de uma vila na Mooca. Meus pais não eram operários, eram pequenos comerciantes de frutas, mas a vila toda era de trabalhadores. Morei em uma casa que era pegada a uma fábrica e que tinha caldeira vibrando dia e noite. Quando desligava a caldeira eu não conseguia dormir. A indústria está muito associada à minha infância e ao desenvolvimento ¿ disse Serra, falando para uma platéia de empresários e centenas de operários da fábrica, a maior ad New Holland no mundo, que teve investimentos de R$ 1 bilhão de recursos do BNDES.

O presidente Lula aproveitou as presenças de Dilma e Serra para dar um recado aos dois. Disse que ¿a arte da boa governança é fazer o óbvio¿.

Segundo o presidente, no dia a dia, as medidas mais corretas a serem tomadas são aquelas que parecem simples. Dilma e Serra ficaram sentados lado a lado durante a cerimônia e posaram abraçados para as fotos.

¿ Tem muita gente que acha que a política é uma coisa difícil. Mas a política é a única coisa que não se aprende na universidade. Na universidade você aprende a ser médico, dentista e até cientista político. Mas político é difícil. A arte da boa governança é fazer o óbvio ¿ afirmou Lula, em discurso que durou mais de meia hora.

Lula começou o seu pronunciamento dizendo que se sentia à vontade para falar como trabalhador, sindicalista e presidente da República. Ele disse que estava contente por inaugurar uma fábrica que tinha sido fechada por 5 anos. O presidente aproveitou para dizer que isso estava acontecendo porque a empresa acreditou na recuperação da economia brasileira. Ele comparou a inauguração da fábrica da Case New Holland, uma empresa do Grupo Fiat, com o nascimento de uma criança que precisa ser cuidada para sobreviver e se transformar em um ser humano produtivo.