Título: Doação oculta: prática comum
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 06/03/2010, O País, p. 3

Nas eleições de 2006, PT, PSDB E DEM foram beneficiados

BRASÍLIA. Criticada pelos dirigentes dos maiores partidos do país, a resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que restringe as chamadas doações ocultas nas eleições deste ano vai inibir uma ferramenta de financiamento amplamente adotada em 2006.

A prática de repassar recursos a candidatos sem indicar a fonte foi comum em campanhas majoritárias de PT, PSDB e DEM. E se repetiu também em nas eleições municipais de 2008.

Exemplo foi a disputa presidencial.

Na corrida pela reeleição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu dos diretórios do PT, principalmente do nacional, R$ 13,8 milhões de um total de R$ 81 milhões arrecadados, o que corresponde a 17% do bolo. Seu principal oponente, o tucano Geraldo Alckmin, teve R$ 7,9 milhões dos R$ 79 milhões vindos do caixa da legenda.

Alguns dos principais governadores eleitos também se beneficiaram da modalidade de financiamento direto do partido. O maior beneficiário foi o governador afastado do Distrito Federal, José Roberto Arruda (ex-DEM, sem partido), investigado em esquema de pagamento de propina a aliados com envolvimento de empresários. Dos R$ 8 milhões que ele declarou ter arrecado para a campanha de 2006, quase metade (R$ 3,5 milhões) veio do diretório nacional do PFL (hoje DEM).

No PT, Ana Júlia (PA) obteve de diretórios R$ 2 milhões (36% do total arrecadado) e Jaques Wagner (BA), R$ 400 mil (9,5%). No PSDB, as doações do partido a Yeda Crusius (RS) somaram quase R$ 1 milhão (16%) e Aécio Neves também se beneficiou, com R$ 400 mil (2%). Os governadores do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), e de São Paulo, José Serra (PSDB), não listaram recursos dessa natureza em suas prestações de contas.

Partidos terão que ter conta específica para repasses A legislação vigente até as últimas eleições permitia que os partidos transferissem o dinheiro aos candidatos, sem informar a fonte dos recursos, normalmente de pessoas físicas e jurídicas que preferiam manter seus nomes desvinculados das campanhas.

Pelas regras aprovadas pelo TSE esta semana, os partidos são obrigados a manter uma conta bancária específica para os repasses para os candidatos, o que facilita a fiscalização das contas, além de indicar qual será o beneficiário de cada doador.

A mudança desagrada os líderes partidários, que acreditam que a regra pode desencorajar as doações.

Eles argumentam que, ao dificultar os repasses, o TSE abre espaço para o caixa dois.

Os dirigentes de legenda rejeitam o termo ¿doação oculta¿, sob o argumento de que, na prática, a prestação de contas dos partidos indica quem contribuiu.

Para os tucanos, as novas regras contrariam o princípio de que o mandato é do partido.

¿ O PSDB é contra doações ocultas, é a favor da transparência. Mas essas regras não dão transparência ¿ reclama o vice-presidente executivo da legenda, Eduardo Jorge Caldas.

Ex-tesoureiro do PT, Paulo Ferreira alega que o termo é mal empregado, pois, na prática, a doação é ao partido e cabe a ele arbitrar sobre quem receberá o dinheiro: ¿ A prioridade é da legenda.

De acordo com o TSE, a nova resolução não mexe em outra modalidade de financiamento que, segundo especialistas, também é oculta. Trata-se dos repasses feitos a comitês financeiros eleitorais. Eles prestam contas das doações recebidas de pessoas físicas e jurídicas, mas, ao transferi-las para candidatos, não são obrigados a informar a fonte pagadora.