Título: Por que um parlamentar acusado de homicídio tem que ter imunidade?
Autor: Benevides, Carolina
Fonte: O Globo, 07/03/2010, O País, p. 4

Especialistas debatem o que leva o Rio a ter tantos deputados sendo processados

Partidos nanicos como o PR, PTN e PSDC e poderosos como PMDB e PSDB têm em seus quadros parlamentares que estão na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), vão tentar a reeleição e respondem a processos tão diferentes quanto infidelidade partidária, corrupção, extorsão e até homicídio. Para o cientista político Marcelo Simas, da Fundação Getulio Vargas, o fato de muitos partidos terem o seu representante ¿ficha suja¿ mostra a fraqueza do nosso sistema partidário, e também que a imunidade parlamentar no Brasil é ¿ampla demais¿: ¿ Entendo que em uma democracia, para que haja debate político, um deputado precise de imunidade para não ser, por exemplo, processado por difamação. No entanto, se ele está sendo processado por homicídio, por que está sendo protegido? Por que esse deputado tem que ter imunidade? Um crime dessa natureza não contribui para debate algum, e ainda assim a imunidade vigora.

Então, temos parlamentares cada vez mais personalistas porque seus pares também são assim.

Já Francisco Carlos Teixeira, professor de História da UFRJ, defende a imunidade parlamentar e diz que cabe aos eleitores se responsabilizarem por seus votos.

¿ Mexer na imunidade implicaria deixar um deputado tão vulnerável quanto na época da ditadura. Acredito que o eleitor deva fazer a melhor escolha, deva olhar o currículo dos candidatos antes de votar. É preciso que a sociedade saiba que esses parlamentares que estão sendo processados não estão na Alerj por obra e graça do Espírito Santo. As pessoas os escolheram, deram a eles o mandato ¿ diz Teixeira, lembrando que votar em parlamentares que são investigados não é privilégio do Rio: ¿ Em São Paulo, elegeram de novo o Paulo Maluf. E mais, deram um mandato para o Clodovil. Quem votou nos dois não conhece a biografia do Maluf, achou mesmo que Clodovil estava preparado para representar o estado em Brasília? ¿Partidos faziam peneira antes de aceitar a filiação¿ Para Marli Motta, pesquisadora da Fundação Getulio Vargas, o alto número de parlamentares processados ¿ na Alerj, 37 dos 70 respondem a algum processo ¿ é sinal de que o modo de se fazer política no estado mudou.

¿ Tínhamos políticos profissionais, pessoas com vocação, e os partidos e diretórios faziam uma peneira antes de aceitar que a pessoa se filiasse.

Com o passar dos anos, especialmente no Rio, essa peneira ficou mais larga, e pessoas que antes não tinham espaço, como os que são famosos em um determinado bairro ou por defender uma categoria, passaram a se eleger ¿ diz Marli.

Segundo ela, esse novo perfil da política no Rio reflete a ¿estrutura política, econômica e social estabelecida no estado¿ e explica também por que os eleitores não se informam sobre a ficha dos candidatos antes de votar e não fiscalizam os eleitos.

¿ Muitos desses políticos emergem de grupos informais, e essas pessoas que vivem na informalidade e que votam nesses representantes não veem tanto problema em serem representadas por quem está sendo investigado ¿ diz Marli, lembrando que essa nova maneira de fazer política não é exclusiva do Rio: ¿ Acredito que esse fenômeno seja mais forte no estado, mas vimos agora no episódio do Arruda (José Roberto Arruda, governador afastado do Distrito Federal) que o DF tem um deputado que se chama Batista das Cooperativas.

Então, vemos que por lá também estão sendo eleitas pessoas que há alguns anos não teriam qualquer chance.