Título: Desafio ao terror no Iraque
Autor:
Fonte: O Globo, 08/03/2010, O Mundo, p. 32

Iraquianos votam em massa em meio a atentados que mataram 38

EM BASRA, policiais iraquianos fazem revista minuciosa nos eleitores que, assustados com a violência pela manhã, só voltaram às zonas eleitorais no fim do dia

MORADORES OBSERVAM o que restou de um prédio residencial em Shaab

BAGDÁ

Mesmo diante do pânico causado por uma série de explosões que matou 38 pessoas e deixou pelo menos 50 feridas, os iraquianos foram às urnas sob um forte esquema de segurança numa tentativa de superar diferenças sectárias e eleger um novo governo ¿ que poderá ser decisivo para concretizar os planos americanos de retirar suas tropas do Iraque a partir de novembro. Os primeiros resultados devem ser conhecidos somente na quarta-feira, quando se espera chegar à apuração de 30% dos votos, mas as estimativas apontam um alto índice de comparecimento: analistas ouvidos pela rede de TV Al Jazeera, acreditam que pelo menos 55% dos 19 milhões de iraquianos aptos a votar participaram das eleições legislativas.

Ataques quase afastaram eleitores

Temendo atentados com carros-bomba, a polícia colocou milhares de homens nas ruas e proibiu a circulação de veículos no centro da capital. Mas, após a abertura das 52 mil urnas às 7h, uma série de explosões sacudiu os distritos de Amil, Hurriya, Jihad e Khadraa, em Bagdá. Pelo menos quatro bombas foram lançadas na chamada Zona Verde, sede do Parlamento iraquiano, ministérios e embaixadas estrangeiras. Houve registro de explosões também nas províncias de Salahuddin, Ramadi, Diyala e Anbar. No mais violento ataque do dia, 12 pessoas ¿ incluindo mulheres e crianças ¿ morreram quando uma bomba foi detonada junto a um prédio residencial em Shaab, no norte de Bagdá.

Buscando a reeleição, o atual primeiro-ministro iraquiano, Nuri al-Maliki, um xiita, convocou todos a aceitarem os resultados do pleito.

¿ Quem ganha hoje pode perder amanhã. Quem perde hoje, pode ganhar amanhã ¿ disse ele, após depositar seu voto em Bagdá.

Queixando-se de irregularidades no início da votação, o maior rival de al-Maliki, o ex-premier Iyad Allawi, um xiita à frente da coligação xiita-sunita Iraqiya, passou o dia incitando os eleitores a saírem de casa. Logo após os atentados, milhares correram, aterrorizados, deixando vazias as zonas eleitorais. Mas, diante do reforço na segurança ¿ feito pelos próprios iraquianos com suporte logístico de soldados americanos ¿ e dos pedidos insistentes dos mais de 6.200 candidatos, os iraquianos voltaram a formar longas filas nas zonas eleitorais à tarde. Após a apuração, a Suprema Corte tem um mês para ouvir apelações e validar o resultado do pleito.

¿ Pedimos a todos os líderes políticos que tenham paciência e aguardem o anúncio formal dos resultados ¿ pediu o presidente do Comitê Central Eleitoral, Farag al-Haidary.

Obama parabeniza iraquianos

O segundo pleito pós-Saddam Hussein é bem diferente do ocorrido em 2005, quando, sob a sombra da violência que se instaurou sobre o país após a queda do regime, os eleitores votavam apenas na legenda e sequer sabiam quem estava no comando das mesmas. Os políticos, temendo assassinatos, não apareciam. Este ano, a campanha ganhou rostos. Não faltaram cartazes com nomes, fotos e até números de telefones dos candidatos a uma das 325 cadeiras do Parlamento ¿ que foi aumentado em 50 lugares para dar voz às mulheres e minorias étnicas.

Com sunitas e xiitas indo em massa às urnas, analistas destacam a vitória da democracia. Segundo as previsões, não haverá uma vitória esmagadora de nenhuma coligação, o que pode sinalizar que os iraquianos deram mais um passo para superar o sectarismo. Mas, na contramão de análises mais otimistas, há quem diga que a polarização põe o país em risco, forçando a formação de um governo de coalizão ¿ que pode levar meses para ser negociado ¿, deixando um vácuo de poder a ser aproveitado pela al-Qaeda e outros grupos armados para incitar a desordem.

Em Washington, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, parabenizou os iraquianos pelo pleito.

¿ Como esperado, houve incidentes causados por extremistas que tentaram atrapalhar o progresso. A votação deixou claro que o futuro do Iraque pertence aos iraquianos ¿ disse Obama, prometendo respeitar o prazo para retirar os 50 mil militares americanos do país até o fim de 2011.