Título: Vale tudo ou é possível coibir?
Autor: Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 12/03/2010, O País, p. 3
ELEIÇÕES 2010
Especialistas e MP veem dificuldade para punir propaganda antecipada e uso da máquina
As lacunas na lei eleitoral sobre o período que antecede a campanhaoficial, prevista para começar em julho, e a condição de pré-candidatosdos que disputarão a eleição de outubro deixam a Justiça de mãos atadaspara cercear supostos abusos em palanques oficiais. Especialistas emlei eleitoral e até representantes do Ministério Público reconhecem asdificuldades de ação contra eventos nitidamente eleitorais, como muitosprotagonizados pelos pré-candidatos do PT, a ministra Dilma Rousseff(Casa Civil), e do PSDB, o governador de São Paulo, José Serra.
Segundo especialistas e procuradores eleitorais, nem apossibilidade prevista na lei eleitoral de punir o uso da máquinapública em favor de uma candidatura é de fácil aplicação, já que não há"candidaturas de fato" neste momento. Dos atos e ações listados pelaoposição contra Dilma, ou de governistas contra Serra, nos últimosmeses, apenas o evento no Rio, segunda-feira - no qual a secretáriaestadual de Assistência Social, Benedita da Silva, fez campanha paraDilma -, é apontado como propaganda eleitoral fora da época e uso damáquina, já que foi organizado por órgãos públicos.
Outro ato considerado perigoso ocorreu no início do ano, eminaugurações do governo federal em Jenipapo, Araçuaí e Teófilo Otoni(MG). Lula, ao lado de Dilma, disse que faria seu sucessor, mas semcitar o nome. Relator da ação movida pela oposição contra os dois sobreeste caso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Joelson Diasarquivou o processo, alegando que qualquer governante deseja fazer seusucessor e que Lula não citou o nome da ministra.
Pessoas todo dia em palanques
A oposição recorreu, e ontem à noite o TSE retomou o julgamento,que já contava com três votos a favor de Lula e Dilma - além dorelator, os ministros Carmem Lúcia e Ricardo Lewandowski -, mas teve ovoto contrário do ministro Felix Fischer, corregedor eleitoral, queargumentou:
- Até três meses antes do pleito, autoridades podem participar deinauguração. Mas não podem incutir um candidato no imaginário doeleitor. Ainda sem pedido explícito de voto, trata-se de propagandadisfarçada.
Para a subprocuradora-geral da República, Sandra Cureau, as lacunasda lei sobre a pré-campanha dificultam a ação do Ministério Público:
- O pré-candidato vai para o palanque com outra pessoa, que fala emsucessão, mas não toca em candidaturas, nem fala o nome. A gente ficameio amarrado. Há que se esperar por um tropeço, como aconteceu agoracom a Benedita. Neste caso foi dito que a pessoa é candidata. Estamoslevantando os dados para representar junto ao TSE - disse Sandra. - Alacuna está no fato de a lei considerar propaganda extemporânea apenasquando há a identificação do candidato. Deveria incluir as situações emque a pessoa está todo dia em palanques.
Mais otimista, a procuradora eleitoral no Rio, Silvana Batini, dizque cabe aos integrantes do MP agir para tentar superar a lacuna da leieleitoral:
- É possível, com uma visão criativa, quando remetemos àConstituição e aos princípios da moralidade, impessoalidade e isonomiade condições na disputa, tentar suplantar os dispositivos frouxos dalei.
Se houver realmente uso da máquina, afirmam os especialistas, hácomo punir, porque tal conduta é vedada em qualquer momento e nãoapenas na época da campanha. Para isso, recorre-se à Lei dasInelegibilidades ou a ações de improbidade administrativa.
O relator da minirreforma eleitoral aprovada pelo Congresso em2009, deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), salienta que houve umaregulamentação da pré-campanha no ano passado.
- Se a lei lista o que pode ser feito na pré-campanha, presume-se que o restante está proibido.
COLABOROU: Carolina Brígido