Título: STM pune militar gay com aposentadoria
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 12/03/2010, O País, p. 10

Tenente-coronel foi castigado por caso com um soldado; ele também é acusado de pedofilia, mas ainda não foi julgado

BRASÍLIA. O Superior Tribunal Militar (STM) aprovou ontem, por setevotos a três, a exclusão do tenente-coronel Osvaldo Brandão Sayd, de 45anos, das Forças Armadas por ele ter mantido uma relação homossexualcom um soldado. O caso ocorreu em agosto de 2006 numa unidade militarem Curitiba.

O tribunal acompanhou decisão do comandante do Exército, generalEnzo Peri, que defendeu a aposentadoria compulsória do militar. Ocoronel vai para a reserva remunerada. Para a Procuradoria Geral daJustiça Militar a decisão de afastá-lo da vida militar foi uma atitudediscriminatória.

A decisão foi tomada um dia depois de o Senado aprovar a indicaçãopara o STM do general Raymundo Nonato Cerqueira Filho, que condenou apresença que gays nas Forças Armadas.

"Relação provocou descrédito da instituição"

O tenente-coronel Osvaldo Brandão responde a outro processo noSuperior Tribunal de Justiça (STJ): ele é acusado de pedofilia. Ele foicondenado a dois anos de prisão, em primeira instância, num julgamentoque ocorreu em abril de 2005, no Rio Grande do Sul. O caso teriaocorrido em 2003. Mas o mérito dessa acusação não foi alvo ontem dosministros do STM.

O militar não negou que manteve relação com o soldado ClaudemirRodrigues e informou no processo que o encontro entre eles se deu nasua residência fora da vila militar. Sua argumentação não convenceu orelator do caso, o brigadeiro José Américo dos Santos, que entendeu quea relação entre eles afetou a honra, o decoro e o pundonor (dignidade)militar.

- Causou (a relação) desdobramentos negativos e incompatíveis como decoro militar. Ao admitir (a relação) o coronel Brandão assumiu asresponsabilidades. Provocou descrédito da instituição, que foi alvo decomentários depreciativos e jocosos - disse José Américo.

O relator afirmou também que não se trata de preconceito comhomossexuais e que ele, quando esteve na caserna, manteve boa relaçãocom militares com essa opção sexual.

- Sua opção sexual não é alvo, mas excessos devem ser coibidos. Sea Constituição veda a discriminação, por outro lado não autorizaliberalidade que denigre a imagem das Forças Armadas.

A ministra civil Maria Elizabeth Rocha, primeira mulher a terassento no STM, fez uma defesa enfática do coronel Brandão e, num votode mais de cem páginas, afirmou que o homossexual é perseguido nasForças Armadas.

- Quem é contra o homossexual na vida militar diz que que háinterferência na eficácia das Forças, que há assédio, transmissão deAids e falta de coesão. Quem é a favor fala em preconceito. A opçãosexual diz respeito a sua vida privada. Não diz respeito ao Estado. Nocaso do coronel, seus atos não afetaram o quartel. Foi uma decisãopreconceituosa - disse Maria Elizabeth.

No processo, o coronel foi acusado também de tirar fotografias derecrutas sem camisa. A defesa alegou que, como é professor de educaçãofísica e responsável pelo preparo dos soldados, esse trabalho faziaparte do acompanhamento da evolução física dos seus subordinados. Orelator do caso afirmou que a forma como se aproximou dos soldados podeafetar o desenvolvimento desses recrutas, "menores de 21 anos, nãoplenamente capazes do ponto de vista civil".

"Nunca vi nada igual com quem dá em cima de mulher"

Para Maria Elizabeth, o homossexual não é bem visto na caserna.

- O Exército é uma instituição masculina. Sua presença causadesconforto. Nunca vi nada igual acontecer com militar heterossexualque dá em cima de mulher. Há um discurso do ódio - disse MariaElizabeth.

O receio da defesa era que Brandão fosse expulso do Exército, sem sequer direito a aposentadoria.

- Foram-se os anéis mas ficaram os dedos - disse o advogado Carlos Alberto Gomes, que atuou na defesa do militar.