Título: É hora de reduzir a jornada
Autor: Henrique, Artur
Fonte: O Globo, 13/03/2010, Opinião, p. 7
Um dos resultados importantes que a redução da jornada vai trazer é mais oportunidade para o trabalhador e a trabalhadora investirem tempo em sua qualificação profissional e em sua educação formal.
São frequentes as reclamações de empresários e trabalhadores de que a força de trabalho no Brasil carece de qualificação. Entre as medidas que precisam ser tomadas para superar esse problema está, sem dúvida nenhuma, a diminuição da jornada. Ou alguém supõe ser fácil combinar uma jornada de oito horas diárias e duas horas extras, mais o longo tempo que as pessoas gastam entre a casa e o trabalho, e o estudo? Em alguns casos esse obstáculo torna a equação absolutamente impossível.
Queremos quatro horas semanais a menos de trabalho, que com inteligência e imaginação podem ser distribuídas ao longo da semana e produzir impactos positivos em diversas frentes. Como toda mudança, a jornada menor vai abrir novas discussões durante a sua consolidação ¿ e seremos certamente capazes de encontrar boas soluções. Podemos imaginar, por exemplo, o impulso ao setor de comércio e serviços, proporcionado por mais tempo livre para o convívio familiar, para a cultura e o lazer. Nada mais justo.
Segundo a própria CNI (Confederação Nacionalda Industria), a participação dos salários nos cust os da indústria no Brasil é em média 22%. Portanto, a redução de 44 horas para 40 horas sem redução de salário representaria 9,09% de aumento nesses custos. Ou seja, um impacto de apenas 1,99% para as empresas.
Por outro lado, de 1988 (último ano em que ocorreu a redução de jornada, de 48 para 44 horas) a 2008, a produtividade na indústria de transformação no Brasil segundo o IBGE foi de 84,24%. Fica fácil perceber que entre 1,99% e 84,24% existe um enorme espaço para reduzir a jornada sem reduzir os salários, mantendo a enorme lucratividade das empresas.
Além de mostrar que a redução da jornada é um instrumento de distribuição dos ganhos de produtividade para o conjunto dos trabalhadores, não podemos deixar de mencionar que deve vir combinada com a remuneração adicional de 75% sobre as horas extras, sem o que a mudança poderia ser inócua em certos setores. Assim, a redução da jornada vai, de fato, proporcionar a abertura de novas vagas de trabalho. Serão 2,5 milhões com a redução e 1,2 milhão com a limitação das horas extras.
O empresariado faria melhor encarando esse debate sem mistificações ou argumentos baseados no medo. O processo de organização sindical já conquistou as 40 horas para diversas categorias. Como a legislação de um país deve traduzir e refletir as conquistas sociais, está na hora de estender a mudança.
Queremos quatro horas semanais a menos de trabalho
ARTUR HENRIQUE é presidente da Central Única de Trabalhadores (CUT).