Título: Casos de abusos na Igreja respigam no Papa
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Fonte: O Globo, 13/03/2010, O Mundo, p. 36

Arquidiocese revela readmissão de acusado de pedofilia durante gestão de Ratzinger, levando a críticas a Bento XVI

BENTO XVI recebe cumprimentos do arcebispo Robert Zollitsch, chefe da Igreja na Alemanha: escândalos de abuso no país chegam ao Papa

CIDADE DO VATICANO. As investigações de uma série de escândalos de abuso sexual na Igreja Católica alemã chegaram agora a Bento XVI. Sua antiga arquidiocese informou que transferiu um padre suspeito de pedofilia enquanto a circunscrição era liderada por Joseph Ratzinger, então arcebispo. A revelação reacendeu críticas ao Pontífice, já sob ataque desde a descoberta de que, em 2001, determinou a bispos manterem sob segredo casos de suspeita de abuso sexual.

As investigações jogaram luz sobre a forma com que Bento XVI lidava com casos de pedofilia quando foi arcebispo de Munique (1977-1982) e, depois, prefeito do escritório do Vaticano que cuida desse tipo de crime, um cargo que ele ocupou até 2005, quando se tornou Papa.

Igreja diz que Ratzinger não soube da readmissão

Bento XVI expressou ontem ¿grande consternação e choque profundo¿ sobre o escândalo e encorajou bispos a continuarem buscando a verdade. Horas depois, a arquidiocese de Munique reconheceu ter permitido, na década de 80, quando Ratzinger era arcebispo, que um padre suspeito de ter abusado de uma criança voltasse à pastoral para trabalhar.

A arquidiocese de Munique, no entanto, garantiu que o cardeal não sabia da transferência, que, segundo a congregação, fora autorizada por um funcionário de um escalão mais baixo.

A arquidiocese afirmou que não havia acusações contra o capelão, identificado apenas como H., durante seu período de serviço em Munique, entre 1980 e 1982. Na cidade, ele passou por terapia por suspeita ¿de relações sexuais com crianças¿. Depois foi transferido para Grafing, perto de Munique, onde foi suspenso em 1985 por acusações de abusos sexuais. No ano seguinte, foi condenado por abusar sexualmente de menores.

O porta-voz do Vaticano, reverendo Federico Lombardi, emitiu uma declaração ontem afirmando que o vigário-geral que aprovou a transferência do padre assumiu ¿completa responsabilidade¿ pela decisão, numa tentativa de eliminar todas as suspeitas sobre a potencial responsabilidade do Pontífice quando arcebispo na época.

Defensores de vítimas não se deram por convencidos.

¿ Achamos extraordinariamente difícil acreditar que Ratzinger não reinstalou o predador no posto, ou não soubesse de sua reinstalação ¿ afirmou Barbara Blaine, presidente e fundadora da Rede de Sobreviventes de Abusados por Padres.

Igreja alemã pede desculpas a vítimas

O Papa, ao mesmo tempo, continua sob fogo por causa de uma carta enviada por ele a todos os bispos em 2001, dizendo que quaisquer casos de abuso sexual deveriam ser remetidos para seu escritório, a Congregação para a Doutrina da Fé, e que fossem submetidos a segredo de pontificado.

O chefe da Igreja Católica da Alemanha pediu desculpas ontem às vítimas de abuso cometido por padres e, depois de reunir-se com o papa Bento XVI, disse que o Pontífice o encorajou a seguir adiante e enfrentar o problema. O arcebispo Robert Zollitsch, presidente da Conferência dos Bispos Alemães, disse que a Igreja Católica está tomando medidas para investigar a série de acusações de abuso em instituições católicas, auxiliar as vítimas e impedir novos abusos.