Título: Moderador improvável
Autor: Oliveira, Eliane; Kresch, Daniela
Fonte: O Globo, 14/03/2010, O Mundo, p. 38

Favorecido por palestinos, papel do Brasil no processo de paz é visto com ceticismo por Israel

ERUSALÉM

Opresidente Luiz Inácio Lula da Silva, o primeiro chefe de Estado brasileiro a pisar na Terra Santa desde o imperador D. Pedro II, em 1876, será recebido com expectativas muito diferentes por israelenses e palestinos. Apesar de vizinhos, os dois povos parecem estar a anos-luz de distância no que diz respeito às expectativas quanto ao papel do Brasil como possível moderador nas negociações de paz na região.

Se os palestinos veem o Brasil como candidato a exercer grande influência no relacionamento com Israel, esses demonstram ceticismo quanto à relevância do país num conflito de décadas numa região tão distante da América Latina.

A liderança palestina prega que países como Brasil, Índia e África do Sul se envolvam mais nas negociações de paz. Funcionariam como contrapeso aos países desenvolvidos, que até hoje tentam em vão acabar com a violência no Oriente Médio. Principalmente EUA, encarados por muçulmanos como aliado histórico de Israel.

Hillary classifica ação de Israel como insultante

Já o premier israelense, Benjamin Netanyahu, considera que, apesar das boas intenções, o Brasil tem se distanciado da neutralidade ao cultivar laços de amizade com o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, que ameaça constantemente riscar o Estado judeu do mapa.

É verdade que a paz se faz com inimigos.

Mas um inimigo que só quer cortá-lo em pedaços não é um parceiro para a paz alegou Netanyahu há dois meses. Sei que as intenções do Brasil são de paz, mas peço que olhe mais de perto para essa distinção. Em outras palavras, não convidem Ahmadinejad. Isso não ajuda.

Ouvidos pelo GLOBO, um jornalista palestino e um analista israelense dão o tom dessa dissonância que Lula vai encarar na viagem de cinco dias que começa hoje por Israel, Cisjordânia e Jordânia. Para Bassam Eid, diretor do Grupo Palestino de Monitoramento de Direitos Humanos, não há dúvidas de que o Brasil pode desempenhar um papel muito importante. Segundo Eid, a distância cultural e a experiência em outros tipos de conflito são os motivos. Já o professor Efraim Davidi, da Universidade de Tel Aviv, especialista no relacionamento entre Israel e América Latina, acha que a possibilidade é mínima.

Usando termos duros incomuns, a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, classificou à CNN a ação de Israel como insultante, por anunciar a construção de 1.600 casas num assentamento em Jerusalém durante a visita do vice-presidente Joe Biden semana passada. Em resposta, Netanyahu pediu investigação do incidente.