Título: Não vai dar tempo
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 14/06/2009, Política, p. 2

O presidente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa ), Danilo Forte, afirma que está sendo pressionado pela Casa. Civil a executar as obras de saneamento nos pequenos municípios, mas salienta que primeiro é preciso superar as irregularidades nos projetos das prefeituras, quando eles existem. E avisa: não será possível concluir todas as obras até o fim do ano que vem, como tem anunciado a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Presidente da Funasa avisa que obras não terminam em 2010

Está difícil tocar as obras da Funasa? Não é fácil, não. Esse nosso universo é muito difícil, porque, como o critério de seleção foi basicamente os índices de mortalidade infantil e as áreas isoladas e endêmicas, isso coincide com os municípios mais atrasados do país. São exatamente os que têm mais dificuldades para elaborar projeto.

Quais os problemas mais frequentes nesses municípios? A ausência de projeto de engenharia, projeto executivo e, às vezes, dificuldade até de comunicação. Nos municípios são mais longínquos, muitas vezes uma prefeitura não tem uma Secretaria de Obra organizada. Você tem dificuldade até para dizer quais são as pendências. Essa força-tarefa tem tido um trabalho de hércules, visitando todos os estados, buscando construir um organismo local de acompanhamento e execução dessas obras. Os caras não conseguem superar as dificuldades. Por exemplo, licenciamento ambiental. Apesar da Resolução n° 137 do Conama, que permite ao próprio município manter um órgão de controle ambiental para intervenção de pequena monta, eles não conseguem sequer construir esses órgãos municipais.

O dinheiro disponível é suficiente para atender tudo o que precisa? Como as obras da Funasa são de pequena monta, o problema principal hoje não é o dinheiro. Pelo contrário, ninguém nunca antes teve uma oportunidade tão grande de recursos para os municípios pequenos como nós estamos tendo agora. Para você ter uma ideia, na década de 90 todinha, o país não gastou o orçamento da Funasa no PAC.

Alguns prefeitos falam que a cidade está há tanto tempo sem uma obra nessa área que R$ 2 milhões não resolvem. Mas esses projetos que já estão em andamento e têm necessidade de suplementação, desde que justificados tecnicamente, nós estamos priorizando para suplementar.

Pelo andar da carruagem, você acha que consegue terminar tudo até o fim do ano que vem? Eu acho que não. Eu acho que a gente vai ter dificuldade. Estou sendo sincero com você.

Qual seria o prazo razoável? O PAC é uma obra que vai ser continuada no futuro. O atendimento a essas populações isoladas e mais carentes precisa ter continuidade. Hoje, estamos atingindo apenas 1,1 mil dos 5 mil municípios com menos de 50 mil habitantes. Desse universo, com certeza, 90% têm carência na área de saneamento básico, seja no setor de abastecimento de água ou de esgotamento sanitário. Agora mesmo, temos problema de seca no Rio Grande do Sul. Um quarto das escolas do Brasil que não têm abastecimento de água estão na Bahia. E o problema lá é a posse do terreno. A escola está lá há 200 nos, foi um fazendeiro que doou há 100 anos, mas não tem um documento. E hoje tem que ter documento para poder botar dinheiro público.

Você, na Funasa, tem sofrido alguma pressão para terminar logo, para terminar até o final do ano que vem, ou há uma compreensão dos problemas? Há uma pressão por parte da Casa Civil, do GPAC, para avançar na execução das obras, uma pressão grande. E muitas vezes, pelo outro lado, tem uma pressão também muito grande dos órgãos de controle com relação à aprovação dos projetos. Eles estão sendo muito rigorosos no acompanhamento. Hoje mesmo o chefe da Engenharia aqui do Ceará pediu demissão, um cara com 30 anos de engenharia, que conhece bem o setor, mas está apavorado, está com medo.

Parece que a deficiência de pessoal nas prefeituras é um problema. Tem estado que não tem. Em Rondônia, só tem um cara, um funcionário aposentado da Funasa, que faz projetos na área de saneamento. Em Alagoas e Sergipe, projeto de água e esgoto tem que contratar ou em Recife ou na Bahia. Lá não tem quem faça. Os estados/territórios são uma tristeza, tirando o Acre, que tem uma boa escola de Engenharia. O país parou no tempo nessa área. No Rio, dos 86 municípios, 80 não tinham aterro sanitário.

Qual é a demanda no Nordeste? Não sei os números, só posso lhe garantir que o abastecimento de água não chega a 70% da população, e o esgotamento sanitário não chega a 30%.

O Correio mostrou que as chamadas mesorregiões são mal atendidos pelo PAC. Quando foi feita a distribuição dos recursos, esse aspecto foi observado? Não. Estou sendo sincero com você, essa preocupação de saber a condição do município para receber ou não o investimento não foi levada em consideração. O que foi considerado foram os indicadores de mortalidade infantil, porque a falta de saneamento é um indicador forte de mortalidade, as áreas epidemiológicas, principalmente de malária e doença de Chagas e a faixa de cobertura sanitária.