Título: Casal Nardoni vai a júri, dois anos depois
Autor: Gomes, Wagner
Fonte: O Globo, 21/03/2010, O País, p. 14

Julgamento começa amanhã; madrasta e pai são acusados da morte de Isabella

SÃO PAULO. Quando Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, acusados da morte da menina Isabella, se sentarem amanhã no banco dos réus para o início de seu julgamento, dois anos de investigação e sofrimento vão ser relembrados à exaustão. O crime, em 29 de março de 2008, causou comoção no país: a menina, então com 5 anos, foi jogada do alto do apartamento do pai.

Apesar da brutalidade do crime e do forte componente emocional do júri, defesa e acusação apostam num duelo de provas técnicas.

A madrasta, Anna Carolina Jatobá, é acusada de estrangular a menina, e o pai, Alexandre Nardoni, de arremessá-la pela janela do sexto andar do prédio onde moravam, na Vila Mazzei, Zona Norte da cidade.

A promotoria vai sustentar a acusação contra o casal com um vídeo do Instituto de Criminalística (IC) sobre os trabalhos dos peritos. O promotor Francisco Cembranelli contará com o auxílio de uma maquete do prédio e do apartamento onde a família morava.

¿ Temos um laudo microscópico feito de maneira eficiente pelo IML e perícias já coordenadas pelo IC que nos permitiram a visualização panorâmica dos episódios ¿ afirma Francisco Cembranelli, promotor de Justiça que fará a acusação.

A defesa alega que o casal já está praticamente condenado pela opinião pública. Durante o julgamento, no Fórum de Santana, na Zona Norte de São Paulo, eles vão tentar reverter o possível veredicto desfavorável desqualificando as provas técnicas. A tarefa de tentar derrubar essas provas caberá a Roselle Soglio, professora de Direito Penal e coordenadora de pós-graduação em perícias criminais da Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus.

¿ Analisei tecnicamente os laudos e me deparei com muitos problemas. O IC é o maior instituto da América Latina e um dos melhores do mundo, mas pode ter falhado ¿ diz Roselle.

¿ Eu acredito piamente que as pessoas que vão julgar terão a oportunidade de conhecer bem a prova. Elas vão poder comparar com o que já sabem, vão poder formar uma convicção que lhes permitirá participar do julgamento, e acredito sim que vai resultar numa sanção merecida ¿ contesta Cembranelli, da acusação.

Previsão é de que dure 4 dias

O julgamento está marcado para começar às 13h, mas pode ser adiado, já que uma testemunha que foi convocada ainda não foi localizada. Essa testemunha seria o pedreiro Gabriel Santos Neto, de 46 anos, funcionário de uma obra que ficava atrás do prédio onde Alexandre e Anna Carolina moravam com os filhos. Segundo o Tribunal de Justiça, a defesa pode dizer que a testemunha é imprescindível e pedir o adiamento. Até a sexta-feira, no entanto, nenhum pedido por ausência de testemunha havia sido feito ao tribunal.

Das 40 pessoas sorteadas para participar do júri, sete serão escolhidas. A previsão é que o julgamento dure pelo menos quatro dias. A defesa deve apresentar aos jurados o material que foi recolhido do apartamento do casal pela Polícia Técnica Científica de São Paulo: tela de proteção da janela, faca, tesoura, roupas e sapatos de Alexandre e Anna Carolina, além da fralda que teria sido usada para estancar o sangue da menina.

Defesa insiste em tese de vingança

Roselle contesta o atestado de óbito de Isabella, que aponta diferença sobre o primeiro laudo apresentado pelo IC duas semanas depois do crime, e a acusação de que existia sangue da menina no interior do veículo do casal, um Ford Ka. Segundo a perícia, o sangue estaria na cadeirinha que transportava o filho menor de Alexandre e Anna Carolina. Roselle diz que foi constatado que havia sangue humano, mas não se conseguiu levantar o perfil exato do DNA:

¿ O reagente pode ser de qualquer fluido corporal, lágrima ou saliva, que também ajudam a determinar o DNA. Isso significa que não necessariamente foi encontrado sangue de Isabella na cadeirinha.

A advogada acusa o IC de ter feito constantemente testes para recolher o resultado que apontaria vestígios da tela do quarto por onde Isabella foi jogada na camisa de Alexandre. Roselle diz que as pessoas não aceitam que havia uma terceira pessoa no apartamento, mas ela afirma que era bem possível que o assassino já estivesse no local quando o casal chegou. O crime seria motivado por vingança ou descontentamento.

¿ O casal é muito firme. A gente acredita sinceramente na inocência dos dois ¿ diz Roselle.

Acesso ao fórum será restrito

Acusação e defesa passaram a semana debruçados no caso Isabella. Na última quarta-feira, o desembargador Luís Soares de Mello, da 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, negou habeas corpus à defesa do casal, que pretendia adiar o julgamento. O magistrado disse que o pedido de Roberto Podval tinha ¿nítido caráter protelatório¿.

Apesar do interesse pelo julgamento, o acesso ao tribunal será restrito. Apenas 77 pessoas estão autorizadas a participar do júri. Vinte lugares foram reservados para jornalistas. O restante será ocupado por convidados, parentes dos réus e da vítima. A ideia é manter o ambiente livre de pressões externas que possam influenciar jurados. Dos 40 jurados sorteados, 25 comporão inicialmente o Conselho de Sentença. Sete serão escolhidos para compor o júri.