Título: Nos devidos eixos
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Fonte: O Globo, 24/03/2010, Opinião, p. 6
Depois de afirmar, ao fim de sua viagem à Jordânia, que a questão dos royalties do petróleo era agora uma responsabilidade do Congresso, o presidente Lula deve ter refletido mais sobre a dimensão que o problema alcançou com a aprovação da emenda Ibsen pela Câmara. Assim, algumas horas após se encontrar no Rio com o governador Sérgio Cabral, anteontem, o presidente se reuniu com nove senadores em Brasília, buscando uma solução negociada.
Lula resolveu agir diante da crise que se formara no sistema federativo e, de fato, não poderia lavar as mãos numa situação tão grave para o país.
À medida que o tempo passa fica claro o caráter discriminatório da emenda Ibsen. Pelos seus efeitos práticos, ela pode ser resumida em votação contra o Rio de Janeiro e o Espírito Santo (e, de certa forma, contra São Paulo também), e não uma iniciativa em favor dos demais estados.
A Câmara não teria se comprometido com uma emenda Frankstein se a mudança na legislação do petróleo tivesse resultado de um debate mais profundo. A tramitação em regime de urgência ofuscou os pontos mais polêmicos dessa proposta e os royalties viraram questão central. Os deputados se eximiram de avaliar as consequências, para o país, da mudança do modelo de exploração e produção e petróleo, pois, estimulada por alguns governadores, foram atraídos para uma parcela de recursos importante para estados e municípios produtores que talvez seja a menor fatia de toda a a receita envolvida nesse processo, considerandose os investimentos necessários à extração do óleo da camada do pré-sal.
O Senado terá a oportunidade de pôr esse debate nos seus devidos eixos. A mudança do modelo será a melhor para o país? E mesmo na hipótese do regime de partilha, as regras propostas são as que efetivamente trarão mais benefícios para o Brasil como um todo? Obtidas respostas satisfatórias para essas perguntas, o que dificilmente ocorrerá com a tramitação dos projetos em regime de urgência, a destinação dos recursos públicos deixará de gerar um conflito federativo, já que a distribuição dos resultados respeitará naturalmente os direitos de cada estado e município.