Título: Escândalo de pedofilia derruba bispo
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Fonte: O Globo, 25/03/2010, O Mundo, p. 29

Irlandês que encobriu casos pede perdão. Cai a confiança de alemães na Igreja

O PAPA com o bispo Magee em foto de arquivo: ex-secretário pessoal de três pontífices é a maior baixa em nova onda de escândalos

CIDADE DO VATICANO. Um bispo irlandês se tornou ontem a mais alta baixa no clero após a recente onda de denúncias de abusos sexuais que atinge a Igreja Católica na Europa. Bento XVI aceitou a renúncia de John Magee, ex-secretário pessoal de três pontífices, acusado de encobrir casos de pedofilia em sua diocese, no sul da Irlanda. A medida veio no mesmo dia em que surgiu uma nova acusação de pedofilia na antiga diocese do Papa e em que uma pesquisa registrou a queda da confiança dos alemães no Pontífice e na instituição.

O bispo Magee ¿ que foi secretário de Paulo VI, João Paulo I e João Paulo II, antes de retornar à Irlanda em 1987 ¿ pediu perdão às vítimas e assumiu a responsabilidade por encobrir os casos na Diocese de Cloyne. O relatório da Igreja indicou que Magee e seus subordinados receberam denúncias em 1995 contra dois padres que teriam abusado de adolescentes, mas não comunicaram nada à polícia até 2003. Numa das denúncias, uma mulher contou ter tido um caso com um padre, até vê-lo beijando seu filho de 14 anos.

¿ Para aqueles com quem falhei de alguma maneira, ou que qualquer omissão minha tenha feito sofrer, peço perdão ¿ disse Magee, de 73 anos.

Padre transferido pelo Papa é alvo de nova denúncia

O governo irlandês ainda investiga os casos encobertos em Cloyne. Quatro outros bispos acusados de não lidar adequadamente com casos ocorridos no país também ofereceram suas renúncias, mas só uma foi aceita pelo Papa. Há pressões para que o cardeal Sean Brady, líder da Igreja na Irlanda, deixe o cargo.

Magee apresentara sua renúncia no ano passado, após uma comissão independente indicar que a diocese havia exposto crianças a riscos. Ele foi ainda acusado por um comitê de proteção às crianças de ter dificultado as investigações e deixado de adotar medidas contra os sacerdotes envolvidos.

A aceitação da renúncia mostra uma reação do Vaticano diante das acusações de que líderes da Igreja encobriram abusos por décadas em vários países. Ela vem depois de o Papa enviar, no fim de semana, uma carta aos fiéis irlandeses reconhecendo os abusos.

A carta, no entanto, não cita a Alemanha, onde este ano mais de 300 ex-alunos de colégios católicos e coros denunciaram religiosos. Ontem, a Diocese de Munique informou que houve mais uma acusação de abuso contra o reverendo Peter Hullermann ¿ que fora transferido em 1980, quando o então cardeal Joseph Ratzinger comandava a diocese, para receber tratamento psicológico devido à pedofilia. Segundo a diocese, o novo caso ocorreu em 1998.

¿O caso não caiu em prescrição e a suposta vítima era menor (de idade) na época¿, disse a diocese num comunicado, acrescentando que a informação foi encaminhada à promotoria e lembrando que Hullermann está suspenso de suas funções.

Governo alemão cria grupo para investigar casos

Como no caso de Hullermann, muitos padres acusados de pedofilia eram encaminhados para tratamento psicológico ou simplesmente transferidos, sem que as denúncias chegassem à polícia. Diante da enxurrada de acusações, o governo alemão anunciou ontem a formação de uma comissão com 40 membros para investigar a extensão dos abusos de crianças.

Os casos levaram a uma queda na confiança dos alemães no Papa e na Igreja. Segundo uma pesquisa publicada pela imprensa local, somente 24% dos alemães acreditam no Papa, quando na semana passada o número chegava a 38%. Em relação à Igreja, o índice de confiança é de 17%, contra os 29% anteriores. Se forem considerados somente os católicos, a popularidade do Papa caiu de 62% em janeiro para 39%, enquanto a da Igreja passou de 56% para 34%.