Título: Governo brasileiro afronta a Colômbia
Autor: Montoya, Rodrigo Botero
Fonte: O Globo, 22/03/2010, O País, p. 7

Um incidente na vaga que compartilham Colômbia e Brasil na Diretoriado Fundo Monetário Internacional ameaça deteriorar as relaçõesbilaterais, por causa da aparente aceitação do comportamento abusivo doseu diretor-executivo no FMI, Paulo Nogueira, que têm expressado asautoridades brasileiras.

No dia 18 de fevereiro, María InésAgudelo, a diretora-suplente pela Colômbia, recebeu um telefonema deNogueira, que de forma intempestiva e grosseira lhe ordenou abandonarseu escritório em um prazo de 24 horas. Para acrescentar o insulto àinjúria, Nogueira resolveu notificar o gerente do Banco de laRepública, governador pela Colômbia no Fundo, da destituição deAgudelo, solicitando-lhe o envio de currículos de possíveis candidatosa substituíla, para que ele selecionasse o representante do governocolombiano perante o Fundo em Washington.

María Inés Agudelo,ex-vice-minis tra da Fazenda da Colômbia, não era uma empregada deNogueira. Sua destituição constitui uma irregularidade que nãocorresponde ao espírito do acordo constitutivo da vaga no FMI, nem aoacordado entre os governos da Colômbia e do Brasil. Segundo esseentendimento, as autoridades colombianas selecionam o diretor-suplenteno FMI conforme seu melhor critério. Quando se discutem na Diretoriaassuntos relacionados com o interesse colombiano, quem intervém é odiretor-substituto, não o diretorexecutivo brasileiro.

Esseentendimento não se pode violar abruptamente, por um ato tosco, sem quese rompa a tradicional harmonia, baseada no respeito mútuo, que temcaracterizado há tempos as relações entre a Colômbia e o Brasil. Tambémfazem parte da mesma diretoria a República Dominicana, o Equador, aGuiana, o Haiti, o Panamá, o Suriname e Trinidad e Tobago. O acordo quea constituiu estabelece que, durante o período 20042016, o cargo dediretorexecutivo corresponde ao Brasil, e o de diretor-suplente àColômbia. Os demais países nomeiam assessores que devem preencherdeterminados requisitos profissionais. Caso contrário, odiretorexecutivo pode solicitar ao governador do respectivo país noFundo que designe um substituto.

Tal como interpretam o acordoas autoridades econômicas colombianas, o status do diretor-suplente édiferente daquele dos assessores. Sua nomeação e remoção são atossoberanos do governo colombiano, e não são da alçada dodiretor-executivo brasileiro.

No entanto, o documento que rege omanejo dessa diretoria não tem força contratual. Não existe um recursolegal válido para corrigir uma arbitrariedade como a que acaba deocorrer.

Por definição, os acordos de cavalheiros funcionam quando aqueles que os executam se comportam como tal.

AlexandreKafka, Murilo Portugal e Eduardo Loyo, os representantes anteriores doBrasil no FMI, manejaram de forma impecável as relações com Colômbia.Mas cavalheirismo não é o traço característico de Paulo Nogueitra ra,que conquistou a animosidade dos seus colegas na Diretoria do Fundo.

Asautoridades colombianas têm reagido com firmeza e discrição. O BancoCentral e o Ministério da Fazenda, assim como o Ministério de RelaçõesExteriores e a Presidência do Brasil, têm sido notificados sobre ainconformidade colombiana com o comportamento do seu representante noFMI.

As autoridades econômicas colombianas informaram aodiretor-gerente do Fundo que Nogueira não está autorizado a intervir emnenhum assunto relacionado com a Colômbia. Nesses casos, viajaria aWashington um funcionário do Banco de la República para defender ointeresse colombiano.

O governo brasileiro deve entender que oabuso de Nogueira significa um custo político considerável. Suasolidariedade com um comportamento inaceitável é incompatível com oobjetivo de manter relações cordiais com a Colômbia.

RODRIGO BOTERO MONTOYA é exministro da Fazenda da Colômbia.