Título: Lula comanda estratégia pelo Rio
Autor: Gois, Chico de; Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 23/03/2010, Economia, p. 19

Presidente tranquiliza Cabral, convoca senadores e pede acordo contra perdas de R$ 7 bi em royalties

BRASÍLIA e RIO

Conforme prometido pessoalmente ao governador do Rio, Sérgio Cabral,no início da tarde, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocouontem nove senadores de oito partidos da base aliada para uma reunião,na qual pediu equilíbrio e uma saída negociada que evite as perdasimpostas aos estados produtores pela chamada emenda Ibsen, queredistribui os royalties do petróleo, inclusive de campos já emprodução, e retira do caixa fluminense cerca de R$ 7 bilhões. Lulaorientou os líderes a conversarem com suas bancadas para auferir adisposição para um acordo e marcou para a próxima semana novo encontro.

Casonão vingue o acordo, ganhou força a estratégia de jogar para depois daseleições a discussão da divisão da renda do petróleo, a partir dodesmembramento do projeto que institui o regime de partilha, separandoa discussão dos royalties.

O Senado tem condições de melhoraro que saiu da Câmara, que criou um novo conflito federativo. O anoeleitoral não pode prejudicar uma votação tão importante como é o marcoregulatório do pré-sal afirmou o ministro de Relações Institucionais,Alexandre Padilha, após a reunião de uma hora e meia.

Vamos trabalhar para um acordo.

Senão for possível, vamos desmembrar o projeto. O urgente agora não écomo será distribuído o dinheiro. O importante é ter o modelo de comose dará a exploração (do petróleo no présal) afirmou o líder dogoverno no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

Presidente quer evitar custo de veto

Padilha salientou ainda que Lula está preocupado com o fato de adiscussão dos royalties desviar a atenção sobre a utilização dosrecursos do pré-sal: Não queremos que este dinheiro vá para o custeioda máquina, que não priorize o que consideramos fundamental(investimentos da área social).

Além de Jucá e Padilha,participaram do encontro os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL), TiãoViana (PT-AC), Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), Inácio Arruda(PCdoBCE), Osmar Dias (PDT-PR), Marcelo Crivella (PRB-RJ), Gim Argello(PTB-DF) e João Ribeiro (PR-TO).

Estava presente ainda o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP).

A preocupação (dos estados não produtores) é legítima. Mas devemosfazer isso com tranquilidade. A ideia não é prejudicar o Rio e oEspírito Santo disse Jucá.

Líder do PDT, Osmar Dias disse quea orientação é para que se altere a emenda Ibsen. Mas ele pontuou que atarefa não é fácil: O assunto já tomou conta dos estados. Há pressãonão só nos estados produtores mas nos demais. Só o bom senso pode tiraro calor da disputa. O Rio exagerou. O governador do Rio exagerou porser um ano eleitoral.

Esta opinião é quase unânime entre os senadores.

Lula,que já orientara as lideranças do governo no Congresso neste sentidoantes de viajar para o Oriente Médio, voltou à carga ontem pessoalmenteapós a temperatura das discussões subir. O discurso do presidente mudoude tom. Antes, dissera que o assunto era um problema do Senado. Nasemana passada, o deputado Ibsen Pinheiro (PMDBRS), autor do texto,propôs que o Senado modifique sua emenda, prevendo regra de transiçãopela qual a União bancaria as perdas dos produtores por um períodoincerto.

A reação foi grande e culminou na manifestação do dia17 no Centro do Rio, que reuniu 150 mil pessoas. Na avaliação deinterlocutores de Cabral, o protesto recalibrou o cacife do Rio. Luladisse ontem ao governador fluminense, com o qual conversou no carroapós sair de evento na Zona Portuária, que vai atuar para reverter asmudanças promovidas pela emenda Ibsen.

O presidente disse aCabral que deseja ver cumprido acordo patrocinado por ele ao fim do anopassado, que mantém intocados os contratos firmados e garantecompensação diferenciada aos estados produtores no pré-sal. Cabralficou aliviado depois da conversa, embora nunca tenha duvidado dapalavra do presidente.

A estratégia comandada por Lula écosturar uma negociação que resgate ao menos o princípio da proposta dedivisão de royalties que consta do texto final do relator do projeto dapartilha de produção na Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Opresidente quer evitar ver a emenda Ibsen aprovada e ter que vetá-la,pelo imenso custo político. Porém, o compromisso de Lula com o veto, nocaso de as demais alternativas falharem, permanece, pois o Planaltoestá convencido da inconstitucionalidade da emenda.

Pelorelatório de Alves, mantém-se inalterada a regra de divisão dasparticipações governamentais no chamado pós-sal (a produção de petróleoque existe até agora, 80% da qual no litoral fluminense) e no pré-saljá licitado (áreas da Bacia de Santos e do Parque das Baleiascapixaba). Nas futuras áreas do pré-sal haveria mudanças.

Àtarde, Lula e Cabral trocaram afagos na abertura do Fórum UrbanoMundial no Rio. Eles não falaram com jornalistas nem deram uma palavranos discursos sobre a emenda Ibsen. Lula referiu-se a Cabral comoquerido companheiro.

O governador citou a liderança dopresidente em projetos de urbanismo e segurança no estado. Durantediscursos de outros participantes, Lula e Cabral conversaram ao pé deouvido. Na saída, Cabral esperou mais de meia hora o término de umareunião entre Lula e o presidente da Bielorrússia, AlexanderLukashenko, para seguir no carro do presidente ao aeroporto SantosDumont.

COLABORARAM Cristiane Jungblut e Bruno Villas Bôas