Título: Questão de justiça
Autor: Pezão, Luiz Fernando
Fonte: O Globo, 23/03/2010, Opinião, p. 7

Com a aprovação pela Câmara dos Deputados da emenda que prevê a distribuição dos royalties da exploração do petróleo entre todos os estados e municípios brasileiros, os três estados produtores principalmente o Rio de Janeiro, mais São Paulo e Espírito Santo estão sendo colocados em lado oposto ao do restante da Federação, e, pior, apontados como ricos e individualistas. É necessário destacar que os recursos são uma compensação aos impactos sociais e ambientais da indústria do petróleo.

Na realidade, a divisão da riqueza do petróleo já é feita. O Estado do Rio produz 85% do petróleo nacional, mas fica com 46% dos royalties e participações especiais, o que totaliza cerca de R$ 7,5 bilhões ao ano. O restante das compensações vai para a União (quase totalidade), outros estados e municípios.

Com a mudança das regras, o governo do estado que, no ano passado, recebeu R$ 4,884 bilhões, passará a receber apenas R$ 100 milhões por ano. Já o montante do município de Campos cairá de R$ 1 bilhão para ínfimos R$ 4 milhões anuais. Que empresa, de pequeno ou grande porte, ou dona de casa resistiria a corte tão grande em seu orçamento? Outro ponto importante é que a cobrança do ICMS é feita no destino e não na origem como acontece com quase todos os produtos. Com isso, o Rio deixa de arrecadar R$ 8 bilhões ao ano.

Só mesmo por desconhecimento da história do Brasil para tentar colar essa injusta pecha no Rio. São muitas as perdas históricas do nosso estado. A primeira aconteceu há meio século, com a transferência da capital federal para Brasília. Com isso, perdemos, além do prestígio político, recursos financeiros.

Basta imaginarmos Brasília dentro do Rio para termos noção das nossas perdas, sem as devidas compensações.

Costumo lembrar o caso alemão. A cidade de Bonn recebeu, por uma década, 3 bilhões de euros por ano, a título de compensação, pela transferência da capital para Berlim. Já o Rio ganhou esvaziamento político e econômico.

Outra covardia contra o nosso estado foi a fusão da antiga Guanabara com o Estado do Rio, ocorrida há 35 anos, sem ao menos consulta popular e, mais uma vez, sem compensação financeira.

Nós, que somos do interior fluminense, sabemos exatamente o tamanho do esvaziamento político, financeiro e tributário que a fusão provocou.

Isso sem falar do empobrecimento que a capital experimentou.

Passados 13 anos da fusão, novo golpe contra o Rio. Em 1988, a Constituição estabeleceu que a cobrança do ICMS sobre o petróleo e seus derivados deverá ser feita, somente, no destino do seu consumo. Mais recentemente, com a descoberta de reservas gigantes de petróleo na camada pré-sal, nossas esperanças de recuperar tais perdas históricas se reacenderam. Em vão. A ocupação pelo Brasil de nova posição geopolítica no mundo e também como propõe acertadamente o governo federal a possibilidade de investimentos maciços em, por exemplo, educação e desenvolvimento tecnológico, são, sem dúvida, vitórias para todos nós, brasileiros. Provavelmente, esse é o destino mais nobre que se pode dar à riqueza obtida com o petróleo do présal.

Repartir o bolo ainda com outros estados é mais do que justo, e o Rio de Janeiro aplaude as duas iniciativas.

Entretanto, o governo do estado e municípios fluminenses não podem abrir mão dos valores das compensações pagas hoje. Esses recursos são essenciais para manter o equilíbrio das nossas finanças e também garantir investimentos necessários frente às demandas que surgem com a atividade petrolífera, como estradas, escolas, hospitais, segurança. Também não podemos nos furtar ao papel histórico do Rio de Janeiro de colaborar com o desenvolvimento socioeconômico do país.

Nosso objetivo é garantir as regras atuais de recebimento das compensações financeiras para os estados produtores e contribuir com o país, dando alternativa que permita ao governo federal colocar em prática seu ambicioso plano. Para isso, bastaria manter as regras, apesar de deixarmos de ganhar um volume maior de recursos com os novos campos do pré-sal. Aliás, a emenda aprovada é ilegal porque altera os contratos já licitados.

Com isso, fica mantido o nível de recursos recebidos pelo Rio de Janeiro em forma de compensações e permite a distribuição da riqueza aos outros estados e municípios não produtores.

É uma proposta boa para todos os entes brasileiros.

LUIZ FERNANDO PEZÃO é vice-governador e secretário estadual de Obras.