Título: O Dia do Fico de Meirelles
Autor: Oswald, Vivian
Fonte: O Globo, 02/04/2010, Economia, p. 23
Presidente do BC desiste de ser candidato e anuncia que permanece no cargo até fim do governo Lula
Após quase 15 dias de suspense, duas reuniões com o presidente da República, conversas e costuras políticas e muitas idas e vindas, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, anunciou ontem que permanece no comando da instituição até o fim do governo. Justificou a decisão pela necessidade de ¿garantir a continuidade e a estabilidade econômica do país em um ano cheio de desafios¿. Ele negou que a permanência tenha sido uma segunda opção ao caminho político e desconversou sobre ambições que pareciam claras nos últimos dias.
¿ Analisei todas as possibilidades imaginárias, mas concluí que, dentro das possibilidades a que me propus, que eram o Senado e o governo de Goiás, decidi por continuar no BC.
¿ Nunca tive ambições políticas. Já disse isso reiteradas vezes. Considerei a ambição política para a consolidação da estabilidade da economia brasileira. Esta conquista hoje é visível para a sociedade ¿ disse, em entrevista ontem, à qual compareceu com toda a diretoria do BC.
Ele afirmou que só tomou ontem a decisão de ficar no BC. Segundo Meirelles, Lula teria pedido que ficasse para dar-lhe ¿grande segurança e tranquilidade de saber que não precisa se preocupar com o BC até o fim do ano¿.
O poderoso e mais longevo presidente do BC não teria conseguido viabilizar dentro do PMDB ¿ partido ao qual se filiou em setembro do ano passado ¿ a candidatura que tanto almejava a vice na chapa petista com a exministra Dilma Rousseff, depois de já ter anunciado em fevereiro que não tentaria concorrer ao governo de Goiás, outra opção que tinha sobre a mesa. Mesmo assim, Meirelles garantiu que a hipótese de sair como vice de Dilma ¿ tese que nunca contou com o apoio do PMDB ¿ não foi colocada na mesa.
A própria disputa pelo Senado também se mostrou complicada tendo em vista a forte concorrência com outros três nomes fortes: o dos senadores Lucia Vania (PSDB), Demóstenes Torres (DEM) e do novato José Batista Junior, proprietário do Grupo Friboi (PTB).
O presidente do BC afirmou que teve total apoio do PMDB para se candidatar a senador.
O próprio prefeito de Goiânia, Íris Resende, teria feito um ¿apelo emocional¿ a Meirelles para que se lançasse ao Senado.
¿ No domingo passado, o Íris ainda me disse que se eu quisesse concorrer ao governo do estado ainda estava em tempo ¿ garantiu.
A justificativa de Meirelles pode ter deixado o presidente Lula satisfeito, mas foi mal recebida pelo Ministério da Fazenda. Técnicos da pasta acreditam que o presidente do BC ¿se valorizou demais¿ ao se colocar como o grande defensor do bom desempenho da política econômica.
Nos últimos sete anos, BC e Fazenda cultivaram atritos. Fazenda defendendo a queda dos juros e o BC, a redução dos gastos públicos.
Meirelles nega que tenha discutido ocupar Fazenda
Perguntado se apoiaria o nome do presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), que comanda a Câmara e é o candidato natural do partido a compor a chapa com Dilma, afirmou que ainda não se decidiu sobre este assunto e que, no devido momento, poderá até vir uma opinião a esse respeito.
Meirelles não quis antecipar o seu futuro após deixar o BC, o que garantiu que fará no fim do ano de qualquer maneira, e negou que tenha discutido com Lula a possibilidade de ser ministro da Fazenda em um eventual governo Dilma.
¿ Não discutimos o futuro, porque seria absolutamente inapropriado, porque ela (Dilma) deixou o governo e sequer é a candidata escolhida pelo seu partido (a Convenção oficial é em junho). Na minha posição de banqueiro central, uma das posições que venho mantendo é que não discuto hipóteses.
A saída de Meirelles vinha sendo discutida há quase um ano, período no qual foi preparando uma nova diretoria e sua sucessão pelo atual diretor de Normas do BC, Alexandre Tombini.
Meirelles destacou ter pela frente o desafio de manter o equilíbrio da economia brasileira e a inflação dentro da meta (de 4,5% para 2010 e 2011). Segundo ele, o país está traçando a sua estratégia de saída da crise: ¿Estamos em um momento de saída. E é preciso deixar que, na saída da crise, não haja a volta da inflação. Temos de completar o ciclo.
Meirelles disse que é possível que a inflação pelo IPCA convirja ao centro da meta ainda em 2010 e, certamente, no próximo ano, apesar de o Relatório Trimestral de Inflação apontar que o indicador ficará em 5,2% este ano.
¿ O BC sempre mira o centro da meta, dentro do horizonte relevante. Se olharmos o Relatório de Inflação divulgado ontem (quarta-feira), vemos que a inflação em 12 meses está na meta e que, para 2011, está abaixo da meta.