Título: Sob risco de explosão de gastos
Autor: Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 04/04/2010, O País, p. 3

Com interesses eleitorais, Congresso discute propostas que podem criar despesas de R$ 30 bi

Em ano de eleições, a Câmara se transformou num foco de pressões de diversas categorias em defesa de medidas de forte apelo popular. Elas contam com o interesse eleitoral dos parlamentares para aprovar propostas que abrigam verdadeiras bombas-relógio, com a maioria resultando em aumento de mais de R$ 30 bilhões ¿ segundo cálculos preliminares, caso as medidas sejam aprovadas sem modificação ¿ nos gastos públicos e com impacto também na iniciativa privada. O pacote de bondades inclui propostas que vão desde a redução da jornada de trabalho das atuais 44 horas para 40 horas semanais à licença-maternidade obrigatória de seis meses, além de alterações nos reajustes dados a aposentados e ao salário mínimo em janeiro deste ano.

Se for aprovada a emenda que aumenta de 6,14% para 7,9% o percentual de reajuste dos aposentados que ganham acima do mínimo ¿ proposta que está sendo descartada pelo novo ministro da Previdência, Carlos Eduardo Gabas, mas que parte da base do governo apoia ¿, será criada uma despesa entre R$ 1,8 bilhão e R$ 2 bilhões para o INSS apenas este ano.

O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva inaugurou o pacote de bondades, com as medidas provisórias editadas para fixar o valor do salário mínimo e dos benefícios dos aposentados.

Com valores acima dos previstos pela equipe econômica, as duas totalizam gastos de R$ 16,5 bilhões em 2010.

O rombo no caso da Previdência pode ser maior, em cerca de R$ 3 bilhões, caso os deputados aprovem a extensão do reajuste dado ao salário mínimo às demais faixas de aposentados. Em janeiro, os beneficiários que ganham acima do mínimo receberam um reajuste levando em conta a correção da inflação, medida pelo INPC, mais 50% da variação do PIB em 2008, totalizando cerca de 6,14% de reajuste, com ganho real de 2,51%.

Cada ponto percentual dado acima da inflação significa um gasto adicional de R$ 1,2 bilhão, fazendo com que o aumento real de 2,51% custasse cerca de R$ 3 bilhões em 2010. Agora, sindicalistas e grande parte da base aliada do governo querem melhorar mais a proposta, e conceder um reajuste baseado na inflação do período mais 80% do PIB de 2008, ou 7,8% de aumento.

O discurso do governo, repetido à exaustão pelo presidente Lula nas últimas semanas, é de que o Congresso não pode aprovar medidas eleitoreiras.

Mas a pressão pelas bondades tem partido da própria base aliada. O efeito eleitoral já fez o governo sofrer derrotas em votações, inclusive nas dos projetos do pré-sal.

Outro exemplo de implosão dos gastos públicos é a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que fixa um piso nacional provisório para policiais civis, policiais militares e bombeiros, de R$ 3,5 mil para soldados e R$ 7 mil para oficiais. A União bancará quando os estados não puderem arcar com as despesas. Técnicos do governo dizem que seria insustentável para as contas públicas.

A emenda está com a votação já bastante avançada. Falta apenas votar um destaque. Essa foi a brecha que os líderes usaram para retirá-la da pauta depois que avaliaram que a medida iria estourar as contas dos estados.

Além dessas propostas, há ainda uma lista de projetos prevendo a criação de cargos nos três poderes que custariam, ao final, quando preenchidos, um total de R$ 9,9 bilhões. O dado faz parte de levantamento do deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP) e inclui projetos de 2000 para cá.

¿ É preciso ter cuidado para não se guiar por medidas eleitoreiras e pela demagogia. Mesmo propostas que são flagrantemente ilegais são aprovadas com ampla margem de votos, como foi a emenda Ibsen e a que colocou na Constituição o valor do piso de policiais militares e bombeiros ¿ diz o líder do PT, Cândido Vaccarezza (PT-SP), afirmando que a orientação do governo é barrar as propostas.

A proposta de redução da jornada de trabalho de 44 horas para 40 horas divide os parlamentares. De um lado, aqueles ligados ao empresariado, como o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), deputado Armando Monteiro (PTB-PE), que critica a intenção de se tentar votar a proposta em ano eleitoral. Sem dar uma estimativa global, Armando Monteiro diz que a medida levará a um aumento de 10% no custo da hora trabalhada.

¿ Essa questão deve ser analisada à luz da situação econômica, sem essa pressão de algumas lideranças, que estão atrás de um bônus eleitoral.

Essa não é a agenda do trabalhador.

Há o tal pacote das bondades, com propostas como o piso dos policiais, o aumento da licença-maternidade.

Tudo isso implica custo social, que vai criar gastos para o Estado ¿ diz ele.

Monteiro condena também a PEC 30, que trata da licença-maternidade de seis meses. A Previdência informa que, nas regras atuais, com dados consolidados de 2008, o governo gastou R$ 494,3 milhões, com 491 mil trabalhadoras que tiraram licençamaternidade. Estimativas de especialistas em Previdência dizem que o gasto aumentaria em 50%.

Do outro lado, a redução da jornada é defendida pelo presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), entre outros deputados-sindicalistas, e pelo ministro do Trabalho, Carlos Lupi.

Mas a proposta é bombardeada pela equipe econômica.