Título: A carta que não chega
Autor: Motta, Cláudio
Fonte: O Globo, 04/04/2010, Rio, p. 16

Atrasos e extravios de correspondência minam a credibilidade dos correios

Convites entregues depois da data da festa, contas recebidas após o vencimento, encomendas atrasadas e cartas que simplesmente não chegam. Os Correios, cujo ser viço já foi símbolo de eficiência, estão colocando sua credibilidade em risco. Depois de receber diversas reclamações de leitores, o GLOBO comprovou o problema fazendo um teste. Das 25 cartas enviadas há dez dias, na manhã de 25 de março, apenas nove (36%) foram entregues no prazo correto, no dia seguinte à postagem. As cartas foram entregues aos Correios em quatro pontos diferentes, inclusive a Agência Central, na Cidade Nova.

E todos os destinatários ficam na Região Metropolitana.

Outras duas cartas chegaram no sábado. Na segundafeira, mais cinco foram entregues, aumentando para 64% o percentual de entrega. Uma foi recebida na terça e outra na quinta-feira. Na quinta-feira, uma semana depois o envio, sete cartas (28%) ainda não tiveram o recebimento acusado pelos destinatários. Todos foram avisados do teste que o GLOBO estava fazendo e verificaram diariamente suas caixas de correio.

A demora de amigos em confirmar a presença na sua festa de 60 anos de idade, comemorada em fevereiro, angustiou Mauro Tocantins Caldas, que trabalha embarcado durante 15 dias seguidos em plataformas da Petrobras. Quando telefonou para saber a razão da possível ausência de seus convidados, descobriu que nenhum deles tinha recebido a carta, enviada semanas antes.

Foi necessário reenviar dezenas de convites, desta vez pagando muito mais pelo serviço de entrega expressa, o Sedex.

Enquanto uma carta simples custa R$ 0,70, Mauro pagou R$ 12 por cada convite enviado por Sedex.

¿ Muitos convidados receberam a carta depois da festa. Descobri que a postagem de cartas simples é um serviço no qual não se pode confiar. O próprio gerente da agência de Piratininga disse isto. Para ter certeza da entrega, somente o Sedex. Tive que reenviar os convites, desta vez pela encomenda expressa e mais cara. Não podia correr o risco de que meus amigos e familiares deixassem de ir a uma festa que considerei muito especial ¿ disse Mauro.

Comércio sofre com prejuízos

Se as pessoas que usam os Correios esporadicamente estão sentindo na pele os problemas, os prejuízos são ainda maiores para os que dependem do serviço para trabalhar. É o caso de Carla Loureiro Cobas Rodrigues, há dois anos dona de um brechó virtual. As encomendas que ela recebe de clientes de todo o Brasil são despachadas pelo serviço postal.

Cabe ao comprador pagar as taxas de envio. Por isso, na maioria das vezes, o serviço de encomenda da linha econômica para o envio exclusivo de mercadoria, chamado de PAC, é escolhido.

Nos últimos dois meses, Carla vem percebendo que alguns produtos estão demorando quase um mês para serem entregues aos consumidores.

Quando o atraso é muito grande, os clientes acabam achando que o problema é causado pelo vendedor. Em alguns casos, compradores indignados acabam fazendo propaganda negativa na internet, afastando novos clientes.

Para cobrar mais agilidade dos Correios, Carla chegou a procurar o Juizado especial de Pequenas Causas, onde foi informada que ela deveria ir ao juizado federal por tratar-se de um órgão da União.

¿ Procurei a Justiça porque os problemas de envio de mercadorias pelo correio já estão me causando prejuízos. O prazo da entrega de cinco dias úteis não é respeitado. Cheguei a pensar que a encomenda tinha sido extraviada.

Isso dá prejuízo, sim, e está me denegrindo. Se a mercadoria não chega, passo a ser chamada de caloteira. Quando o cliente está no Rio de Janeiro, tenho preferido entregar pessoalmente ¿ reclama.

Donos de outros brechós estão tendo o mesmo problema.

Há um abaixo-assinado online sendo divulgado neste mercado para protestar contra os atrasos na entrega de encomendas.

Outra falha que tem se tornado comum é a entrega de cartas em endereços errados. Um porteiro da Rua Oliveira da Silva, na Tijuca, disse ser usual receber correspondências endereçadas a outros prédios. A devolução tem que ser feita ao carteiro, causando mais atrasos.

Achar uma caixa de coleta dos Correios também não é uma tarefa simples. Repórteres do GLOBO circularam por algumas das principais vias da Cidade Nova, Lagoa, Leblon e Barra e só acharam uma delas, na Barrinha, em frente à 16aDP (Barra). As demais cartas foram postadas nas agências Central, na Cidade Nova, da Praça Antero de Quental, no Leblon, e da Estrada da Gávea, próxima à Rocinha. Apenas uma das cartas postadas na Rocinha foi entregue, seis dias úteis após a postagem.

Os Correios admitem ¿problemas momentâneos com a frota de aviões que nos atende¿.

Para contorná-los, a frota aérea comercial tem sido usada.

A licitação da nova malha aérea está em andamento, e a primeira audiência pública ocorreu em fevereiro.

O edital para um concurso nacional já foi publicado. O Rio terá 627 novos empregados, dos quais 465 carteiros ¿ hoje, são 6.604 no estado. A frota de veículos do Rio está sendo atualizada. Em abril chegarão 86 novos furgões.

Os Correios dizem fazer controles regulares de desempenho.

O índice de Entrega de Correspondências Simples no Prazo caiu para aproximadamente 96,5%, podendo variar conforme região do estado.

Quanto ao teste feito pelo GLOBO, a empresa dize estranhar o fato de que sete cartas levaram mais de uma semana para serem entregues.

Em relação à oferta de Sedex, os Correios negam preferência de qualquer serviço em detrimento de outro. Informações e reclamações podem ser obtidas na página ou pelos telefone 3003-0100