Título: Rio ganhou transparência e disciplina fiscal
Autor: Almeida, Cássia
Fonte: O Globo, 04/04/2010, Economia, p. 29

Estado, que recebeu classificação de grau de investimento, cortou intermediários e paga em dia, diz secretário

À frente da Secretaria estadual de Fazenda desde 2007, Joaquim Levy fez o Estado do Rio alcançar o grau de investimento global, certificando que é um lugar seguro para se investir. Essa classificação da agência Standard & Poor¿s deve levar o Rio a receber mais de R$ 1 bilhão de investimentos num horizonte de cinco a oito anos, nas suas estimativas. Ele diz que a ¿tecnologia especial de relacionamento com o estado¿, que era usada antes de 2007, tornou-se desnecessária, eliminando intermediários: ¿Isso baixou o preço dos remédios¿. Levy afirmou ainda que a nota do Rio facilitará as parcerias público-privadas e o compromisso de realizar Jogos Olímpicos exemplares no Rio.

Cássia Almeida

O GLOBO: O que significa para o Rio alcançar grau de investimento global? JOAQUIM LEVY: Haverá resultado em várias frentes. A primeira é mais uma indicação de que faremos os Jogos Olímpicos com muita transparência e responsabilidade fiscal. Depois que se recebe grau de investimento, não se vai querer fazer alguma coisa que possa pôr isso em risco. Nosso compromisso com a sociedade é que os Jogos Olímpicos vão ser exemplares. E essa conquista é mais um passo nesse trabalho. Outra frente é em relação às PPPs (parcerias públicoprivadas). Qualquer parceiro estará mais seguro sabendo que o parceiro público é transparente e que a própria transparência tem avaliação positiva.

Pode atrair mais investimentos para o estado? LEVY: Investimentos que não estavam nem no radar podem surgir, como os de certos fundos de pensão estrangeiros que só destinam recursos a aplicações com grau de investimento. Aumenta o universo de investidores potenciais. Facilita também a atração de investimento das empresas no estado. Essa sinalização de solidez fiscal é muito importante como atração de investimento privado. Uma das coisas que pesou na classificação é que se aumentou a despesa da saúde em 80% de 2006 para cá. Em compensação, alguns serviços aumentaram quase 300%.

Dá para calcular em quanto pode aumentar o investimento no estado com a nova nota? LEVY: O grau de investimento tem um valor incalculável. Acredito que ele, se for mantido, pode acrescentar, num horizonte de cinco a oito anos, R$ 1 bilhão a mais de investimentos no estado. De empresas que vão se animar a vir para o Rio, que agora tem uma informação confiável, adicional. Um dos fatores que contribuiu para o grau de investimento foi a pontualidade no pagamento de todos os fornecedores, a nossa transparência.

Ao conceder grau de investimento, a Standard & Poor¿s chamou a atenção para o alto endividamento do estado... LEVY: É uma dívida de longo prazo, então não há risco de refinanciamento. O perfil dessa dívida é favorável. O próprio pagamento de juros tem limite de 20% da receita líquida real. É dívida pesada, sem dúvida. Pagamos R$ 3,5 bilhões por ano ao governo, mas é administrável. Tanto que o governo federal ampliou o espaço de endividamento em R$ 5 bilhões. O que nos permitirá alavancar muito investimentos nos próximos anos, não só para as Olimpíadas e para a Copa. Fazer o interior do Rio avançar 20 anos rapidamente.

O relatório cita o pré-sal... LEVY: O Rio foi pioneiro em estabelecer um marco tributário para o ICMS do pré-sal do investimento. Propôs condições extremamente favoráveis para quem quisesse investir no présal. Se for fazer uma plataforma, tem tratamento preferencial. Temos uma expectativa positiva com o pré-sal.

E se perdemos definitivamente as receitas com os royalties do pós-sal? LEVY: Deixa eu citar aqui o padre Antônio Vieira: vamos imaginar o que até imaginado nos causa horror. Se a emenda Ibsen prosperar, e eu acho que não vai prosperar, o estado ficaria impossibilitado de pagar pensão e aposentadorias para 200 mil pessoas. É lógico que o estado não vai deixar de pagar isso. A alternativa seria deixar fechar os hospitais. Uma coisa que até de pensar nos causa horror. Então, teríamos que deixar de pagar os contratos com a União.

Como o Estado do Rio chegou ao grau de investimento? Onde foi feito o ajuste? LEVY: Havia grande fragilidade, um problema de gestão. Quando chegamos aqui não tinha informação, não tinha sistema, não havia transparência. Hoje temos informação, temos sistema de controle. Criamos o boletim de transparência fiscal. Retiramos a fragilidade e aumentamos muito a transparência. São dois fatores que certamente são muito diferentes e foram muito importantes para o grau de investimento. Hoje, podemos comprar remédios diretamente nos laboratórios. Não precisa de um intermediário que detém uma tecnologia especial de relacionamento com o estado. E aí o preço do remédio baixa muito. A consequência é a melhora na qualidade do serviço.

Não existe mais o uso dessa tecnologia especial de relacionamento com o estado? LEVY: Os intermediários se tornaram desnecessários. E os grandes laboratórios participam do pregão diretamente. Fazem contratos. Antigamente, vendia e depois se fazia um acerto. Todos os pagamentos são publicados na internet, linha por linha. O grau de investimento cria uma disciplina para o futuro. Ninguém vai querer perder o grau de investimento. O patamar que a gente alcançou só pode ir para cima. Isso dá uma continuidade que reforça ainda mais o tudo que estamos fazendo. Lógico que se o governador, como é intenção dele um segundo mandato, reforçar tudo isso.

O senhor fica num segundo mandato? LEVY: Seria precipitado discutir isso, afinal o governador sempre diz, ele vai se candidatar, mas só saberá o resultado em 3 de outubro.

E se ele for reeleito, o senhor fica? LEVY: É muito difícil trabalhar com hipótese. Seria presunçoso da minha parte falar sobre isso. É sempre uma decisão do governador.

De quanto foi o superávit primário do estado? LEVY: Tivemos superávit entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2 bilhões em 2009, numa receita total de R$ 30 bilhões. É um resultado importante, que não foi feito segurando caixa. Viramos o ano, com quase todos os pagamentos feitos. São Paulo virou o ano com 20% dos pagamentos não processados. Em Minas Gerais foram 30%. O Rio virou com 5,5%. Temos uma velocidade de pagamento muito grande.

Há projetos de captação externa do estado? LEVY: Temos captações externas nos organismos multilaterais (Banco Mundial, Banco Interamericano), por meio de parcerias. A gente não vai a mercado.