Título: Limites para Evo Morales
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Fonte: O Globo, 11/04/2010, Opinião, p. 6
Embora ainda não haja resultados finais das eleições de domingo passado na Bolívia, os números disponíveis permitem que tanto o presidente Evo Morales, do Movimento ao Socialismo (MAS), quanto a oposição tenham bons argumentos para sustentar. O MAS pode dizer que passou a dominar os governos de seis dos nove departamentos (estados), roubando dois da oposição, que ficou com três. De fato, a vitória oficialista em Pando, no Norte, e em Chuquisaca, no Sul, reduziu um pouco o peso da chamada Meia Lua, região que luta por autonomia e faz oposição a Morales.
A oposição pode se gabar de ter batido o governo nas principais cidades. Na capital, La Paz, e em Oruro venceram candidatos do novo partido de centro-esquerda Movimento sem Medo (MSM), ex-aliado do MAS. A oposição ficou ainda com Santa Cruz, Tarija, Trinidad, Potosí e Sucre. O MAS triunfou em El Alto, Cochabamba e Cobija. Mas há um desgaste claro da popularidade do presidente, eleito em 2005 com inéditos 53% dos votos. Ele se saiu muito bem em oportunidades posteriores, notadamente na aprovação na nova Constituição, em 2008, com mais de 60%, e em sua reeleição em janeiro, com o recorde de 64% dos sufrágios.
O mandato vai até 2015, sem possibilidade de reeleição.
Nas eleições de domingo, porém, o MAS não chegou a 50%. O governo do estado de La Paz foi mantido, mas com 47%, quando já chegara a 84%. Na cidade de La Paz, o candidato do governo obteve 36% e perdeu a eleição o MAS já teve 63%. A municipalidade de El Alto, vizinha à capital, foi mantida por Morales, mas com 39%, contra 87% em pleito anterior. São números que levaram o jornal espanhol El Pais a afirmar que Morales teve de fazer uma pausa em sua progressiva colonização do poder na Bolívia. O resultado das eleições, destinadas a encerrar o ciclo para desencadear a fase definitiva da refundação indianista do país, obrigam o presidente a dar um tempo.
O projeto político de Morales combina a promoção das comunidades indígenas bolivianas a nações, com direitos políticos ampliados, e o combate ao movimento autonômico da Meia Lua, comandada por Santa Cruz região em que está o gás. Seu governo tratou de destruir a oposição.
Há 36 líderes políticos detidos ou com ordem de captura; 12 fugiram para o exterior.
Está em trâmite projeto de lei que pretende jul gar altos dignitários acusados de malversarção de fundos: os ex-presidentes Carlos Mesa e Jorge Quiroga; o ex-vice Victor Hugo Cárdenas; e o ex-presidente da Corte Constitucional, Eduardo Rodríguez.
Em fevereiro, foi aprovada (o governo tem maioria no Parlamento) lei que faculta ao presidente nomear a maior parte dos membros do Supremo, da Corte Constitucional e do Conselho da Magistratura. O governo Morales sofreu desgaste, mas não a ponto de pôr em perigo seu projeto de refundação do país, com uma vertente autoritária e outra de promoção das comunidades indígenas.
Nem foi fortemente debilitado o movimento autonômico dos estados da região leste (Meia Lua). A Bolívia segue dividida, e o esforço de um lado para sobrepujar o outro produz paralisia o oposto do que precisa um país pobre, com imensas necessidades de reformas e de investimentos.