Título: Belo Monte traz esperança e temor a Altamira
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 11/04/2010, Economia, p. 29
Cidade vê reativação de sua economia como sede das obras da barragem, mas parte da população será removida
ALTAMIRA (PA). Exatos 40 anos depois de entrar no mapa do país, ao se transformar na capital da Transamazônica, Altamira conquistou agora o mapa mundi como cidade que vai sediar a construção da hidrelétrica de Belo Monte, a terceira maior do mundo e a primeira do Brasil, já que Itaipu é binacional. Por isso, mereceu a visita em 1989 do cantor inglês Sting e neste mês do diretor americano James Cameron, de Titanic e Avatar.
Ambos abraçaram a causa dos que são contrários à obra.
Mais do que palco para celebridades, Belo Monte é para Altamira a oportunidade de sair do marasmo econômico, onde se encontra desde 2005. Após o assassinato da missionária americana Dorothy Stang, na vizinha Anapu, o comércio de madeira legal e sobretudo ilegal praticamente desapareceu, reduzindo consideravelmente o giro da economia local. Hoje, o município, cujo tamanho é maior do que o estado de São Paulo, vive do agronegócio, principalmente gado e cacau.
As autoridades locais acreditam que a obra trará legados importantes, como se espera que ocorra com o Rio após a Copa do Mundo e as Olimpíadas.
A prefeitura aposta nos investimentos prometidos pelos construtores da usina e também no aumento da receita municipal.
Cálculos preliminares preveem que a arrecadação de ISS deverá dobrar no período da obra dos atuais R$ 98 milhões chegará a cerca de R$ 200 milhões.
Também entrará no caixa uma parcela dos R$ 90 milhões de royalties da produção de energia, que serão destinados aos municípios da região.
Ainda não estamos prontos para receber essa obra Mas a prefeita tucana Odileida de Souza Sampaio, em seu segundo mandato, admite que há muitos desafios a serem vencidos.
Ela lembra que para absorver cerca de 50 mil pessoas a cidade tem 60 mil habitantes será preciso dobrar o número de leitos hospitalares, médicos e escolas, além de reforçar o policiamento local.
Ainda não estamos preparados para receber essa obra resume.
Com este argumento, a estratégia oficial será tentar forçar mais investimentos para a cidade.
Para empregar um contingente expressivo de moradores, Odileida reivindica que as universidades Federal (UFPA) e Estadual (UEPA) do Pará, com campi instalados na cidade, criem cursos de engenharia civil e elétrica, além de medicina, direito e enfermagem. É na sede do município que vão morar os engenheiros e suas famílias e serão instalados os escritórios centrais da obra.
A cidade já desperta interesse de empresários de fora, mas ainda de forma acanhada. Segundo a prefeita, uma rede de supermercado de Belém e uma grande concessionária de automóveis já foram convidadas a se instalar no município. Por essa razão, Odileida não acredita em resistência local à obra: Mais de 90% das pessoas aprovam a usina, mas não gostam de falar. A Igreja tem que ver os benefícios que ela vai nos trazer. Os impactos positivos serão maiores que os negativos.
Mas uma parcela dos moradores sofrerá impacto direto da usina. Cerca de 30% da cidade, onde vivem 16,4 mil pessoas, serão inundados. São áreas de favelas, com casas de palafitas sobre igarapés poluídos. A forma de retirada e indenização dessa população, prevista no contrato, ainda não foi detalhada, o que causa apreensão.
O peixeiro Lailson Fortunato da Silva, que vive nos fundos do seu negócio, suspenso sobre o igarapé Altamira, ao lado de outras cinco mil casas, reclama que ainda não foi informado sobre indenizações. Mas ele não pretende sair do lugar por menos de R$ 20 mil, que é o que calcula ter investido na melhoria da casa e da peixaria.
Até agora só ouvimos comentários.
Ninguém falou nada.
Se sair daqui perco o ponto e meu negócio e temos uma casa boa. Não dá para sair assim