Título: A nova Revolta das Tulipas
Autor:
Fonte: O Globo, 08/04/2010, O Mundo, p. 34

Sublevação popular põe em fuga presidente do Quirguistão, deixando até 100 mortos

BISHKEK, Quirguistão Depois de um dia de revolta popular, com pelo menos 40 mortos e 400 feridos, opositores ao governo do Quirguistão clamavam vitória na sangrenta batalha para depor o presidente da república asiática, Kurmanbek Bakiyev, levado ao poder por uma sublevação semelhante em 2005 batizada de Revolta das Tulipas. Violentos protestos tomaram as ruas da capital, Bishkek, levando o presidente a fugir para o sul do país ¿ e causando apreensão nos Estados Unidos, que mantêm ali uma de suas mais importantes bases da Força Aérea envolvidas em missões no Afeganistão. A ex-ministra do Exterior e uma das líderes da oposição, Roza Otunbayeva, de 59 anos, confirmou a derrubada do governo e afirmou que todas as instalações oficiais estavam em poder do bloco oposicionista. Ela anunciou que permanecerá à frente de um governo interino por seis meses até que a Constituição seja revisada e novas eleições, convocadas. ¿ Queremos que ele renuncie. O país inteiro está nas mãos de um poder alternativo ¿ disse a ex-chanceler, que se desentendeu com Bakiyev após ajudar a levá-lo ao poder em 2005 e se tornou uma de suas maiores adversárias. Golpe ameaça estratégia dos EUA Segundo um dos líderes opositores, Omurbek Tekebayev, o número de mortos pode chegar a 100. Em Bishkek, houve tiroteios durante toda a madrugada de ontem, e lojas foram saqueadas. A fronteira com o vizinho Cazaquistão foi fechada por tempo indeterminado. Os protestos ¿ inicialmente contra a corrupção e o aumento dos preços de combustível e energia em até 200% ¿ começaram no norte do país e rapidamente chegaram à capital, exigindo a renúncia do presidente, acusado de autoritarismo e de nomear dezenas de parentes para cargos do alto escalão do governo. Além disso, Bakiyev vinha reprimindo a liberdade de imprensa e perseguindo seus adversários políticos. A crise econômica, que deixou muitos trabalhadores desempregados, também aumentou a insatisfação popular. Opositores invadiram o escritório do procurador-geral da República e a TV estatal. As manifestações atingiram diversas províncias, onde os governadores foram forçados à renúncia. Manifestantes cercaram prédios governamentais e usaram um caminhão blindado para derrubar o portão da Casa Branca, a sede do governo em Bishkek. Carros e latas de lixo foram incendiados, e jovens furiosos desafiaram as forças de segurança disparando para o alto tiros de fuzil. A polícia deslocou centenas de homens para conter a fúria popular. Houve enfrentamentos e os policiais abriram fogo contra os manifestantes. Antes de fugir da capital, o presidente chegou a decretar estado de emergência em três regiões, mas os opositores não recuaram. Na cidade de Talas, o vice-premier Aklybek Japarov e o ministro do Interior, Moldomusa Kongatiyev ¿ enviados para tentar acalmar os ânimos ¿ foram agredidos. Testemunhas afirmam que Kongatiyev foi morto a pauladas pela multidão. Além de preocupar as vizinhas ex-repúblicas soviéticas, a revolta na Ásia Central ecoou, sobretudo, nos EUA. O Quirguistão é um dos países mais pobres da região e abriga, além de uma base aérea da Rússia, a base militar americana de Manas. Dali sai boa parte das missões aéreas da Força Aérea dos EUA no Afeganistão. Analistas suspeitam que, por pressões de Moscou, o Quirguistão tenha relutado em renovar o aluguel do espaço ao Pentágono. Depois de anunciar a não renovação do contrato, o presidente Bakiyev voltou atrás, em janeiro de 2009, após um polpudo aumento do aluguel e uma intervenção pessoal do presidente Barack Obama. O fim da Manas seria um duro revés para as operações no Afeganistão ¿ e a mudança de governo em Bishkek põe em risco o acordo. ¿ Estamos monitorando de perto, preocupados com a onda de violência, e pedimos que todos os lados demonstrem contenção ¿ disse o porta-voz do Conselho Nacional de Segurança dos EUA, Mike Hammer. Na Rússia, o premier Vladimir Putin negou qualquer envolvimento de Moscou e classificou os distúrbios como "um problema doméstico". oglobo.com.br/mundo Inclui Quadro: Saiba mais sobre o país MANIFESTANTE INCENDEIA um carro junto à sede da Presidência em Bishkek: dura repressão policial aumentou ainda mais a fúria de multidão insatisfeita com o governo FLAGRA da violência: opositor detido pela polícia aparece morto horas depois BAKIYEV: CORRUPÇÃO e nepotismo UM OPOSITOR chuta policiais capturados durante a revolta em Bishkek