Título: Na base do improviso
Autor: Antunes, Daniel; Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 11/06/2009, Política, p. 6

Novo Oriente de Minas (MG) ¿ Para se chegar às muitas comunidades rurais que cercam o município de Novo Oriente de Minas, no Vale do Mucuri, a 446 Km de Belo Horizonte, é preciso ter paciência. As estradas de terra batida, que alternam subidas e descidas, são estreitas e cheias de obstáculos, como pedras e ribanceiras. O sinuoso percurso desafia todos os dias estudantes da zona rural e motoristas do transporte escolar. ¿A gente tem que ser artista para conseguir levar tantas crianças para a escola sãs e salvas. Se as estradas fossem melhores, os estudantes levariam menos tempo para chegar à sala de aula, e nossos carros não iriam com tanta facilidade para a oficina¿, comentou o motorista que presta serviços para a prefeitura, mas que preferiu não se identificar.

Nas comunidades onde não há acesso para veículos do transporte escolar, crianças com idade de 5 a 12 anos caminham até 5km para conseguir chegar aos veículos. Esse é o caso dos moradores do povoado do Córrego do Bananal, a cerca de 15km de Novo Oriente. Isoladas, as famílias vivem sem água tratada, luz e esgoto. Para a maioria delas, a principal fonte de renda é o dinheiro do Bolsa Família. ¿Todos os meses saio cedo de casa para buscar R$ 102 que recebo do benefício para cuidar dos meus dois filhos e da minha esposa¿, disse Miguel Francisco de Jesus, 48 anos.

Na casa construída com barro e telhado feito de palha, a única forma de comunicação é um rádio a pilhas, em torno do qual todas as noites a família se reúne para ouvir notícias. Banho só mesmo no rio, e as necessidades fisiológicas são feitas no meio do mato. Segundo Francisco de Jesus, praticamente todas as famílias que moram no povoado vivem nessas condições. ¿Fizemos um pacto e cada morador tem acesso a uma parte do rio para evitar confusão e garantir mais privacidade.¿

Promessa antiga A aposentada Delcina dos Santos, 62 anos, mãe de três filhos, mora no Córrego do Bananal há mais de 8 anos. Durante esse período, já cansou de ouvir promessas de que as coisas iriam mudar por lá. ¿A gente tem vontade de ver uma televisão, tomar banho quente, ter um pouco de conforto. É desagradável ter de sair no meio da madrugada para fazer necessidades no meio do mato¿, declarou. Em outra comunidade próxima, conhecida como Gaspar, a realidade é a mesma para algumas famílias. O vaqueiro Willian Dias Pereira, de 28 anos, mora numa casa com três amigos que não tem água encanada, luz e rede esgoto.

O banheiro foi improvisado no quintal. ¿A gente tem sorte de passar na porta um córrego que serve para lavar as roupas e cozinhar¿ disse. No pequeno município de Novo Oriente de Minas, com pouco mais de 10 mil habitantes, 85,77% das famílias se encaixam no perfil do cadastro de potenciais beneficiários do Ministério do Desenvolvimento Social. O prefeito da cidade, Adelson Gonçalves de Souza (PDT), disse que, sem recursos do governo federal, o município não tem condições de resolver as carências de infraestrutura e saneamento básico da região. Segundo ele, num levantamento recente da prefeitura, cerca de 900 famílias da zona rural da cidade vivem sem energia elétrica.

¿Sabemos que as comunidades estão quase todas isoladas. Tem escola na zona rural que a merenda é levada a pé. A prefeitura não tem sequer uma patrola agrícola para melhorar as estadas¿, afirmou o prefeito. ¿Se as estradas fossem pelo menos razoáveis, era mais fácil levar médicos e outros benefícios para essas famílias¿, acrescentou. De acordo com o prefeito, com a queda na arrecadação em função da crise, a prefeitura mal consegue arcar com o pagamento da folha dos servidores. ¿A cidade não vai receber um centavo do PAC. Temos que lutar para conseguir outras parcerias.¿ (DA)