Título: Desoneração sem alívio nos preços
Autor: Alencar, Emanuel; Rodrigues, Lino
Fonte: O Globo, 13/04/2010, Economia, p. 21

Materiais de construção sobem, mas empresários querem manter IPI menor

Um ano após a desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para materiais de construção benefício concedido em abril do ano passado e prorrogado por duas ocasiões os preços de muitos produtos voltaram a subir, com altas de até 20%.

Mesmo assim, os empresários da indústria e comércio da construção civil tentam convencer o governo a prorrogar ou tornar permanente a redução do IPI, prevista para terminar em junho.

E o governo deve mesmo postergar o benefício, porque entende que se trata de um estímulo aos investimentos.

Levantamento feito pelo GLOBO ontem e em 29 de junho de 2009 quando foi anunciada a extensão do benefício pela primeira vez , constatou alta em metade dos 14 produtos pesquisados em três redes de varejo. O reajuste chega a 20,2%, caso do metro quadrado do piso de cerâmica Delta da Casa Show da Rua do Riachuelo, no Centro do Rio (passou de R$ 9,90 para R$ 11,90). Em seis itens, houve recuos de preço. O mais expressivo foi de 12,5%, da Ducha Advanced Lorenzetti da Casa & Construção (R$ 79,90 para R$ 69,90). Um dos produtos pesquisados não mudou de preço.

Lojistas dizem que pode faltar produto

A Casa Show informou, por meio de sua assessoria, que houve reajustes pela indústria, de até 11% nos produtos pesquisados. A loja informou ainda que, através de negociação com os fornecedores, conseguiu não repassar totalmente os aumentos aos clientes.

Procuradas no fim da tarde de ontem, a Casa & Construção e a Amoedo não retornaram as ligações do GLOBO.

No pleito ao governo pela prorrogação do alívio fiscal, os empresários alegam que, em meio a uma forte demanda impulsionada inclusive pelo programa habitacional do governo, a perspectiva de volta do imposto cheio poderia provocar uma antecipação das compras e levar até a um desabastecimento no setor.

O presidente da Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção (Anamaco), que representa 138 mil lojas no país, Cláudio Konz, lembra que só a demanda prevista para a primeira fase do programa Minha Casa, Minha Vida (construção de 1 milhão de casas) poderia gerar um caos no setor. Segundo ele, a Caixa já contratou 400 mil novas casas e as construtoras vão querer aproveitar o imposto menor para adquirir os produtos.

Além dessas, há outras 400 mil em processo de análise na Caixa.

Isso (a antecipação) causaria um tumulto na logística do varejo e da indústria, podendo acabar em desabastecimento disse Konz.

O fenômeno previsto pelos empresários do setor, explica Melvyn David Fox, da Abramat, entidade que reúne os fabricantes de materiais de construção, é diferente do que se viu nos automóveis, móveis e eletrodomésticos, que também ganharam alívio fiscal.

No caso dos materiais de construção, os produtos precisam ser estocados para serem usados ao longo da construção e reforma do imóvel. Por isso, Fox sugere que o governo, no caso de decidir acabar com o benefício, avise com antecedência.

Demanda aquecida e falta de produtos são combustíveis que alimentam a inflação, alegam os empresários. Paulo Safady Simão, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), aponta mais um ponto de pressão: o uso da capacidade instalada na indústria já superou os 85%. Simão defende a prorrogação do benefício do IPI pelo menos até o final do governo Lula, período suficiente, segundo ele, para que o setor se ajuste ao novo patamar de demanda.

Já está faltando mão de obra na construção. Tem muita construtora até importando gente de países vizinhos disse Simão, referindo-se a chegada de trabalhadores de Peru, Bolívia e Colômbia.

Entidades do setor de construção civil entregaram ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, estudo encomendado à Fundação Getulio Vargas (FGV) que mostra os impactos da desoneração. Segundo o estudo, se o governo mantiver por 24 meses as atuais alíquotas do IPI para o setor, haveria um aumento de 1,34% no Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país), a inflação seria reduzida em 0,04%, o déficit habitacional cairia 0,41%, o emprego teria um aumento de 1,27% e a arrecadação cresceria 1,3%.