Título: Seminário discute liberdade de imprensa
Autor: Barbosa, Adauri Antunes
Fonte: O Globo, 08/04/2010, O País, p. 11
Organização do evento condena ameaça à mídia por meios como prisões e "censura prévia por via judicial"
SÃO PAULO. Com o objetivo de debater as ameaças à liberdade de imprensa no Brasil e no continente, começou ontem em São Paulo o seminário "Liberdade de imprensa e democracia na América Latina". Segundo documento do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais, que organiza o seminário, as ameaças não vêm "pelos meios clássicos e ostensivos, tão comuns nos regimes autoritários do passado", mas por formas como "prisões e até mesmo assassinatos de jornalistas, de improvisada legalidade, como a censura prévia por via judicial".
Conforme os organizadores, o seminário, no Memorial da América Latina, "discutirá algumas formas sutis de controle de imprensa pelo Estado no subcontinente, como a censura judicial, o direcionamento partidário ou ideológico da publicidade oficial, a manipulação política na concessão e exploração de frequências de rádio e TV, o controle direto de veículos de comunicação, o protagonismo presidencial, entre outros".
Ontem à noite, a jornalista americana Liza Shepard, ombudsman da Rádio Nacional Pública dos Estados Unidos, a National Public Radio (NPR), defendeu o modelo de emissora pública daquele país, que garante a sua independência editorial mesmo sendo mantida por verbas do governo federal, embora complementadas por doações dos ouvintes e por contratos com corporações e fundações.
Falando sobre o nível da independência da NPR, Liza contou fato vivido pela equipe de jornalistas da emissora, que, após sete anos tentando entrevistar o então presidente George Bush, viu atendido o pedido. O presidente americano, no entanto, impôs a condição de que a entrevista deveria ser feita por um determinado jornalista. A equipe recusou e ficou sem a entrevista.
- A equipe disse a Bush que ele não deveria dizer quem deveria entrevistar o presidente. Então não fizemos a entrevista - contou ela.
A NPR, segundo Liza, é uma rádio com uma equipe de 400 jornalistas que produz conteúdo para 900 estações públicas em todo o território dos Estados Unidos. São produzidos 26 programas diários. Uma das formas de arrecadação de recursos para manutenção da NPR e das emissoras públicas regionais é a doação.
Amanhã, palestra com ministro Ayres Britto
- Cada rádio, duas ou três vezes por ano, pede aos seus ouvintes para doar dinheiro para a manutenção da programação - disse Liza.
O jornalista Eugênio Bucci, que foi presidente da Radiobrás no governo Lula, defendeu a adoção de linhas de financiamento para os veículos de comunicação em vez da compra do espaço publicitário pelo governo, como uma forma de garantir independência à mídia.
O professor Venício Lima, da Universidade de Brasília (UnB), fez um histórico sobre o modelo atual das concessões da radiodifusão no Brasil. Segundo ele, após a Constituinte de 1988, o Legislativo, onde estavam os coronéis da política, passou a decidir sobre as concessões.
- O que antes era atribuição só do Executivo passou a ser também uma atribuição do Legislativo, que dá a palavra final. Chegamos ao cúmulo de um outorgado participar da votação, em uma comissão legislativa, da renovação da sua própria concessão - disse Lima.
Hoje, o seminário "Liberdade de imprensa e democracia na América Latina" terá dois painéis de discussão: "Mídia, estado e crise de representatividade", às 10h, e "Formas de censura", às 15h. Amanhã, último dia do evento, haverá uma palestra às 17h do ministro Carlos Ayres Britto, presidente do Supremo Tribunal Federal, que terá como debatedor o jurista Damo de Abreu Dallari, professor da Universidade de São Paulo.