Título: Muito além dos protocolos
Autor: Coelho, Reno Martins
Fonte: O Globo, 19/04/2010, Opinião, p. 7

O Ministério da Saúde está prestes a reorganizar o tratamento de mais de 80 doenças crônicas, garantindo um acesso mais amplo e facilitado à saúde.

Desde o final do ano passado, o órgão vem realizando ¿ em parceria com o Hospital Alemão Oswaldo Cruz ¿, a revisão dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas que norteiam o diagnóstico e tratamento destas enfermidades e também definem a relação de medicamentos a serem fornecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Até o momento, este direito ¿ garantido pela Constituição Federal ¿ tem sido prejudicado pela falta de revisão sistemática destes procedimentos.

Esta desatualização obriga alguns estados, como o Rio de Janeiro, a conviver com um movimento crescente de judicialização, em que os pacientes buscam na Justiça a alternativa terapêutica mais adequada a seu quadro clínico, retardando e interrompendo seu tratamento. Além disso, desequilibra o orçamento do Estado, que passa a adquirir medicamentos fora do planejamento já estabelecido, e perde poder de barganha junto aos laboratórios.

Uma das doenças autoimunes atualmente incluídas no processo de revisão é a artrite reumatoide. Caracterizada por ocasionar inflamações recorrentes nas articulações e dores crônicas, esta enfermidade de causa desconhecida afeta cerca de 800 mil brasileiros. Se diagnosticada e tratada precocemente, mantém-se sob controle sem altos investimentos do Estado. Caso contrário, evoluirá, podendo resultar em deformidades articulares irreversíveis, incapacitando para o trabalho 50% dos pacientes em até dez anos e reduzindo sua expectativa de vida. Para atender as necessidades, é necessário reavaliar todo o processo, desde a identificação precoce da doença até o tratamento nos estágios mais avançados com drogas mais complexas, algumas delas ainda fora das listas do SUS.

A Sociedade de Reumatologia do Rio de Janeiro (SRRJ) tem atuado neste sentido junto à Secretaria estadual de Saúde, reivindicando o aumento do número de reumatologistas no atendimento primário, a garantia de fluxo contínuo e ininterrupto de medicamentos de baixo custo, a redução na burocracia na dispensação e a criação uma câmara técnica para auxiliar na deliberação sobre remédios de alto custo, como ocorre, com sucesso, no Espírito Santo e em São Paulo. Em setembro de 2009, promoveu debate com representantes da secretaria, da Defensoria Pública, dos planos de saúde e da SRRJ, sobre o acesso aos medicamentos de baixo e alto custo. Neste ano, realizará ¿ em parceria com a secretaria e o Grupo de Pacientes com Artrite do Rio de Janeiro (Gruparj) ¿ um curso de reciclagem em reumatologia para os médicos generalistas do SUS, e já planeja uma ação voltada aos pacientes.

Para assegurar melhor qualidade de vida aos portadores de artrite reumatoide e de outras doenças crônicas, é essencial ¿ além da atual revisão dos protocolos ¿ criar novos mecanismos que garantam a médicos e pacientes a identificação mais rápida da doença e o acesso, ininterrupto, aos medicamentos essenciais de baixo custo e aos órgãos reguladores, bem como a agilidade necessária para avaliar e incluir os novos desenvolvimentos, assim que sua eficácia for comprovada.

RENO MARTINS COELHO é presidente da Sociedade de Reumatologia do Rio de Janeiro.