Título: Vamos entrar firme no mercado americano
Autor: Bendine, Aldemir
Fonte: O Globo, 25/04/2010, Economia, p. 29
Presidente do Banco do Brasil diz que instituição resgatou papel de "agente indutor do país" e quer crescer no exterior ENTREVISTA
BRASÍLIA. Por mais otimista que estivesse há um ano, quando assumiu a presidência do Banco do Brasil (BB) sob desconfiança de que administraria a estatal com viés político, Aldemir Bendine dificilmente imaginaria o bom momento que está vivendo. Sob sua batuta, o BB voltou a ser a maior instituição financeira do país e começou a comprar bancos no exterior. Recentemente, recebeu autorização para aquisições nos EUA. De Buenos Aires, onde anunciou a aquisição do argentino Banco da Patagonia, Bendine falou ao GLOBO sobre os novos planos do BB, que em 2009 apresentou o maior lucro da história do mercado financeiro do país: R$ 10,147 bilhões. Para Bendine, não há riscos de perder essas conquistas no futuro: ¿O BB, da forma como foi estruturado, daqui para frente dificilmente terá um gestor que fará grandes derivações. São movimentos irreversíveis¿.
Patrícia Duarte O GLOBO: Neste primeiro aniversário à frente do BB, qual o principal feito da sua gestão? ALDEMIR BENDINE: Primeiro, por trás disso tudo, está o resgate do verdadeiro papel do BB na sociedade. O banco teve ao longo dos seus 201 anos de história momentos marcantes no país, notadamente no desenvolvimento econômico e social, e passava por um momento onde talvez o papel dele não fosse tão bem caracterizado. Ao tempo que ele tinha uma atuação cada vez mais sólida como um banco comercial, tinha deixado um pouquinho de lado o seu papel de agente público, de agente indutor do país. Isso coincidiu praticamente com a minha posse (em 23 de abril de 2009), que erroneamente foi atribuída a um movimento político.
Talvez o grande marco dessa gestão tenha sido esse resgate do verdadeiro papel do BB e isso eu acho que a sociedade reconheceu. Isso foi muito coroado com a principal ação que o banco executou ao longo de 2009, que foi, num período de crise, talvez a mais grave que a nossa geração tenha conhecido, a de oferecer crédito.
O BB saiu à frente porque tínhamos um quadro naquele momento que não apontava para uma necessidade de travamento da atividade econômica.
No fim do ano, o banco realizou o maior resultado da história de uma instituição financeira neste país.
¿¿ Não é um paradoxo dizer que o papel do banco é de agente público, mas que não há ingerência política? BENDINE: Nós não somos um agente público propriamente dito.
Nós somos uma sociedade de economia mista e é assim que a gente age. Ao tempo que o maior capital votante é da União, nós também temos uma grande base de sócios. Temos o compromisso muito forte com governança corporativa e com rentabilidade. Então, se existe alguém ainda que tem esse tipo de desconfiança (política) em relação ao banco, eu acho que é uma pessoa que não está bem atualizada. Prova disso é que, quando eu assumi a gestão, houve uma crise de desconfiança.
As ações do banco, no anúncio, caíram em dois dias 10%. Na medida em que os analistas, os investidores, os próprios clientes e a sociedade passaram a entender a forma profissional com a qual o banco vinha sendo conduzido, isso acabou se revelando numa das mais altas valorizações (de ações) de um banco no ano passado. E isso está sendo corroborado agora com a recente concessão do status de Financial Holding Company pelo Fed (banco central americano, e que permite ao Banco do Brasil comprar outras instituições nos Estados Unidos).
¿¿ Mas o governo deu orientações explícitas sobre a atuação que esperava do banco.
BENDINE: O controlador, seja numa empresa privada ou pública, é quem orienta uma diretoria executiva dos rumos que ele quer para a companhia. Isso é natural. E o Tesouro, o governo de uma forma geral, gosta de resultado. Até porque, ao fazer um movimento desse, gera contribuições para a própria União.
Primeiro, é o pagamento de dividendos e, depois, de tributos e impostos. Ora, se o banco dá um resultado positivo, é um reforço de caixa extraordinário para o Tesouro. Então, eu acho que essa dicotomia, que muitas vezes tentase explorar, não existe.
¿¿ Essa desconfiança do mercado quando sua gestão começou foi o momento mais difícil neste primeiro ano? Atrapalhou o trabalho? BENDINE: É difícil tomar posse numa instituição onde se tem uma série de planos, que você quer imprimir uma velocidade muito forte e ao mesmo tempo você está sendo recebido com desconfiança.
Eu estava muito ciente daquilo que eu desejava para o banco e em nenhum momento isso foi abalado. Respondemos com muito trabalho e, ao mesmo tempo, fazendo uma revisão em toda a estratégia de atuação e abrindo frentes para se trabalhar. Por exemplo, entrada em novos nichos, como o crédito imobiliário, e o processo de internacionalização.
A compra do Banco da Patagonia é o primeiro grande momento desse processo.
Também houve movimentos internos, com uma nova filosofia no modo de gestão do banco, voltada para as redes de agências.
¿¿ Com as eleições chegando, e um novo governo assumindo em 2011, o senhor acha que esse novo perfil do BB pode ser mudado? BENDINE: Isso é uma coisa inerente a qualquer empresa.
A partir do momento em que há uma troca do seu controlador, é natural que passe por uma repactuação.
É natural que o meu sucessor possa chegar lá e entender que está tudo errado e fazer uma nova proposta aos acionistas.
Mas eu não acredito.
O BB, da forma como ele foi estruturado, daqui para frente dificilmente haverá um gestor que fará grandes derivações dos movimentos iniciados pelo banco. São movimentos irreversíveis.
¿¿ Daqui em diante, o foco é a internacionalização do banco ou fortalecer os novos nichos internamente? BENDINE: Se olharmos o planejamento mais a médio prazo, temos alguns movimentos importantes.
Primeiro, consolidar as fusões e aquisições (como as da Nossa Caixa e do Votorantim).
Vamos passar por uma capitalização (de quase R$ 9 bilhões) e com isso melhorar a nossa estrutura patrimonial, para que o banco possa crescer, seja através da ampliação dos seus ativos, via carteira de crédito, seja através de fusões e aquisições. Segundo, nós temos um grande desafio que é melhorar a rentabilidade da base de cliente e atuação no mercado de São Paulo. O outro projeto em andamento, com a coroação da compra do Patagonia, é a internacionalização.
Acredito fortemente na necessidade de se buscar novos mercados para se ter ganhos de escala, de sinergia e estrutura.
O BB precisa ampliar suas fronteiras. O Brasil é hoje um país de empresas de atuação global e queremos estar onde elas atuam.
¿¿ Depois da compra do Patagonia, e com a autorização do Fed, dá pra imaginar que as próximas aquisições do BB acontecerão nos EUA.
BENDINE: Já temos muito bem definidos nossos alvos, em quais lugares queremos estar, e onde houver oportunidades, ativos e estrutura que nos interessem, vamos fazer esse movimento. O banco está fazendo os melhores esforços para que de fato entre de forma mais firme no mercado americano, até porque lá, entre os nossos principais vetores, é o país com mais brasileiros, chegando a 1,4 milhão. Segundo, há presença muito forte de empresas brasileiras, cujo número tem crescido exponencialmente.
Lá também é onde o fluxo de comércio só tem aumentado