Título: STJ autoriza adoção por casal homossexual
Autor: Fabrini, Fábio
Fonte: O Globo, 28/04/2010, O País, p. 12

Permissão, para duas mulheres no RS, é a 1a- do tipo no país e abre precedente para outros juízes decidirem o mesmo

BRASÍLIA. Pela primeira vez na História, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou, ontem, a adoção de crianças por um casal homossexual. Em decisão unânime, os quatro ministros da Quarta Turma negaram recurso ao Ministério Público do Rio Grande do Sul, que questionava o direito de duas mulheres de Bagé criarem dois irmãos biológicos, nascidos em 2002 e 2003. Eles argumentaram que, em casos dessa natureza, devem prevalecer o bemestar e o interesse dos menores.

A determinação abre precedente para que juízes e desembargadores de todo o país sigam o mesmo entendimento.

Conforme os autos, a psicóloga Luciana Reis adotou primeiro as duas crianças, quando ainda eram bebês. A companheira dela, Lídia Guteres, com quem vive desde 1998, apresentou pedido posteriormente, argumentando que tem melhores condições sociais e financeiras.

Com isso, poderia dar mais garantias e benefícios aos dois irmãos.

Além da herança, eles teriam direito a plano de saúde e pensão, em caso de separação.

¿ Agora, ficou mais fácil para os casais protegerem as crianças de modo justo ¿ disse Lídia.

A Justiça gaúcha foi favorável ao pedido do casal em primeira e segunda instâncias, reconhecendo a entidade familiar formada por pessoas do mesmo sexo e o direito à adoção.

Justificou que estudos estrangeiros não apontam inconveniência na criação de crianças por homossexuais, sendo mais importante o vínculo afetivo entre pais e filhos.

Ao STJ, o Ministério Público gaúcho alegou que a união entre casais dos mesmo sexo é apenas uma ¿sociedade de fato¿, reconhecida para objetivos patrimoniais, como a definição da herança em caso de morte do parceiro. O direito à adoção feriria princípios da Constituição e do Código Civil.

Relator do caso na Quarta Turma, o ministro Luis Felipe Salomão ressaltou que laudo de assistente social recomendou a adoção e, em parecer, o Ministério Público Federal (MPF) não se opôs. Ele explicou que o afeto entre as crianças e suas mães é incontroverso e que a maior preocupação delas é melhorar as condições de criação: ¿ Esse julgamento é muito importante para dar dignidade ao ser humano, para o casal e para as crianças.

Na sessão de ontem, os ministros chegaram a questionar qual seria o futuro dos dois irmãos em caso, por exemplo, de morte da responsável: em vez de continuarem sob a guarda de uma família, poderiam ser entregues a um abrigo.

O presidente da Quarta Turma, ministro João Otávio de Noronha, antecipou-se a eventuais críticas de que o Judiciário, em decisões como a de ontem, estaria extrapolando sua função: ¿ Não estamos invadindo o espaço legislativo, não estamos legislando. Toda construção do direito de família foi pretoriana: a lei sempre veio a posteriori.