Título: Alta de juros reforça Banco Central
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Fonte: O Globo, 29/04/2010, Opinião, p. 6

A economia brasileira não está condenada a conviver infinitamente com taxas de juros altas e bem acima da média internacional. Se os juros ainda permanecem elevados, após tantos avanços, é porque também persistem fatores de desequilíbrio no país que pressionam a inflação.

O Brasil poupa menos do que o necessário, e sua taxa de investimento acaba sendo insuficiente para assegurar uma expansão de oferta compatível com um aumento de demanda da ordem de 6% a 7% ao ano.

Essa falta de poupança não significa que os brasileiros são gastadores por natureza, embora as famílias anseiem por mais qualidade de vida, o que muitas vezes depende do acesso a bens essenciais de consumo. Na verdade, tal insuficiência é porque o setor público tem absorvido poupanças privadas para financiar seu déficit. Essa absorção até que diminuiu, o que abriu espaço para redução das taxas de juros e aceleração nos investimentos. Porém, não a ponto de permitir que os juros caíssem para os padrões internacionais.

No ano passado, as taxas básicas recuaram, nominalmente, para a casa de um dígito (abaixo de 10%) desde o lançamento do real. Mas a queda foi decorrente da retração econômica mundial, que se refletiu no Brasil nos primeiros meses de 2009. Essa retração não chegou a derrubar fortemente a inflação no país, pois vários fatores estruturais continuaram alimentando desequilíbrios setoriais.

Já na segunda metade do ano passado a economia brasileira começou a reagir, atingindo um nível de aceleração que ultrapassou patamares de um crescimento sustentável.

Esse ritmo de aceleração porá em risco as metas de inflação definidas para 2010 e 2011 ¿ ela já é estimada em mais de 5%, acima do centro da meta, de 4,5%. Os analistas financeiros identificaram em alguns indicadores a ameaça, e alertaram as autoridades monetárias, em resposta a consultas semanais feitas pelo BC, sobre a necessidade de se reduzir o ritmo de crescimento, já acima de 5% anuais. O Banco Central preferiu aguardar dados que confirmassem o risco, e somente na reunião de ontem do Comitê de Política Monetária (Copom) voltou a aumentar a taxa básica ¿ em 0,75 ponto percentual, fazendo com que atingisse 9,5% ao ano.

Os juros básicos, em termos nominais, continuam entre os mais baixos da era do real. Ninguém espera que venham a alcançar percentuais como os observados anos atrás, pois a economia contabiliza avanços que tornam esse tipo de terapia desnecessário. No entanto, a política monetária já poderia ser menos acionada se a colaboração da política fiscal fosse mais efetiva.

Com os gastos correntes do setor público se expandindo mais do que a média da expansão do Produto Interno Bruto (PIB), isso equivale, em uma economia aquecida, a jogar lenha na fogueira da inflação. O BC fica como único bombeiro, com a missão de apagar o fogo.

Sem contar outro efeito deletério: investimentos públicos anêmicos.

A inflação controlada tem fortalecido o poder de compra da imensa maioria da população brasileira. O regime de metas, adotado pelo país há dez anos, só funciona bem se as autoridades monetárias tiverem credibilidade.

Ao agir mais por critérios técnicos do que por influência política do próprio governo, o BC conquistou essa credibilidade, o que é reforçado quando aumenta ou baixa as taxas básicas de juros porque é tecnicamente necessário.

Haja ou não eleições.