Título: Paraguai acuado entre guerrilha e traficantes
Autor: Freire, Flávio; Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 29/04/2010, O Mundo, p. 33

Polícia detém mais dois brasileiros. Lula diz que vai debater com Lugo problemas da fronteira

PEDRO JUAN CABALLERO, Paraguai, e BRASÍLIA. Seis soldados do Exército paraguaio dividem a caçamba de uma caminhonete que corta, em alta velocidade, ruas de Pedro Juan Caballero, no norte do Paraguai, na fronteira com o Brasil. Com fuzis apontados para moradores, receberam ontem ordem para reforçar a segurança na cidade, que começa a se transformar num dos alvos do Exército do Povo Paraguaio (EPP), guerrilha que tem assumido a autoria de crimes ocorridos nas últimas semanas no país. À situação já alarmante, o governo do presidente Fernando Lugo adicionou ontem outros dois agravantes: as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) estariam diretamente ligadas aos guerrilheiros paraguaios, e uma das principais organizações criminosas de São Paulo também ganha terreno no esquema do narcotráfico que usa o Paraguai como rota.

- Não dá para pensar que o tráfico transnacional opera de forma solitária aqui no Paraguai. Há forte vinculação das Farc com o EPP e, consequentemente, vinculação da organização criminosa brasileira com a guerrilha. Temos um problema de crime organizado regional com foco internacional - disse ao GLOBO o ministro do Interior, Rafael Filizzola.

Ministro paraguaio cobra extradição de membros do EPP

Como prova da relação entre os grupos paraguaio e colombiano, Filizzola diz que são muitos os testemunhos de ex-integrantes do EPP que assumiram trabalhar conjuntamente com os integrantes das Farc. Lugo, por sua vez, evitou o assunto depois de uma reunião com cinco de seus ministros. Após visitar no hospital o senador Robert Acevedo, vítima de um atentado na segunda-feira, ele cumprimentou eleitores cercado por nove seguranças e deixou a cidade escoltado por 13 carros.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que as medidas para combater a violência e o crime organizado na fronteira entre o Brasil e o Paraguai serão discutidas na próxima segunda-feira, em encontro com Lugo em Ponta-Porã (MS). Segundo Lula, não haverá decisões precipitadas, mas ações conjuntas entre os dois países. Lula afirmou que a revisão do refúgio concedido pelo Brasil, em 2004, a três integrantes do EPP também será tratada na reunião com Lugo.

- Eu pretendo conversar muito seriamente com o presidente Lugo sobre o que está acontecendo na fronteira. Já tenho algumas informações dadas pela inteligência brasileira e pela Polícia Federal - adiantou.

Filizzola cobrou do governo brasileiro a extradição de dois dos guerrilheiros paraguaios, Juan Arros e Anuncio Martí. Segundo o ministro, ambos são acusados de praticar sequestro e mandar matar autoridades no país. Martí e Arros estão no Brasil como asilados políticos.

- Quero aproveitar a imprensa brasileira para dizer que o governo brasileiro deveria mandar esses guerrilheiros para responder por seus crimes aqui no Paraguai - exigiu Filizzola.

Em estado de exceção, Pedro Juan Caballero, capital de Amambay, foi militarizada ontem. No total, 350 soldados foram destacados para lá. Por conta da situação, a polícia tem reforçado o número de abordagens nas ruas. Mais dois brasileiros foram detidos pela manhã, Daniel dos Santos e Josué dos Santos, quando entravam na cidade. Havia suspeita de que os dois teriam ligação com o tráfico, mas seriam dispensados à noite por falta de provas. Na véspera, outros dois brasileiros foram detidos por suspeitas de terem participado do atentado contra o senador paraguaio.

- Tínhamos informação de que as tatuagens usadas por um deles (uma carpa) era característica dos integrantes da organização criminosa do Brasil - disse o policial Hipolito Mendonza, responsável pela prisão.

Josué, um dos brasileiros, já cumpriu pena nove anos por assalto.

- Viemos aqui só para fazer compras e acabamos presos - disse Daniel, algemado ao colega numa das salas do 1º Distrito Policial da cidade.

Uma advogada paraguaia, que não quis informar por quem foi contratada, defendeu os dois.