Título: Meta fiscal ameaçada
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 01/05/2010, Economia, p. 31

Contas públicas têm déficit de R$ 216 milhões em março, pior resultado da história para o mês

As contas públicas brasileiras fecharam março registrando os piores números para o mês na série histórica do Banco Central (BC), ampliando a percepção de que o governo não conseguirá cumprir a meta de superávit primário ¿ economia para pagamento de juros ¿ neste ano sem descontar os investimentos previstos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Até mesmo dentro do BC há preocupação com o desempenho fiscal. Como efeito colateral, o mercado aponta uma deterioração do principal indicador de solvência do país, a relação entre a dívida líquida e o Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos nacionalmente).

Em março, o resultado primário do setor público consolidado foi um déficit de R$ 216 milhões, o pior resultado para esse mês desde dezembro de 2001, início da série. O rombo foi causado pelo Governo Central (Tesouro Nacional, INSS e BC), cuja diferença entre receitas e despesas (à exceção dos juros) ficou R$ 3,912 bilhões no vermelho, também recorde. A cifra é diferente da divulgada na quinta-feira pelo Tesouro (com déficit de R$ 4,6 bilhões) devido à diferença metodológica.

Governos regionais: economia recorde

No acumulado do ano, o setor público (que inclui ainda os governos regionais e as estatais) registra superávit primário de R$ 16,827 bilhões, que, num fluxo de 12 meses, corresponde a 1,94% do PIB. Essa relação está muito abaixo da meta do governo para o período, de 3,3% do PIB.

¿ (O resultado de março) estaria muito mais compatível com a meta ajustada, mas temos de esperar os dados de abril e maio para avaliar.

Sazonalmente, são meses com receitas maiores. A partir daí, os resultados serão normais ¿ ponderou o chefe do departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, para o qual o nível de atividade econômica mais elevado também ajudará na reversão do atual quadro fiscal.

A meta ajustada de superávit primário deste ano permite que, eventualmente, o governo abata até cerca de 1 ponto percentual do objetivo cheio, de 3,3%, descontando os investimentos do PAC.

O mau desempenho das contas de março se deveu sobretudo ao pagamento de precatórios e despesas judiciais do governo central, que somaram R$ 6,7 bilhões. A consequência imediata foi o aumento da divida líquida do setor público, que fechou março em R$ 1,367 trilhão, correspondendo a 42,4% do PIB. Em fevereiro, essa relação estava em 42,1% do PIB, e o BC ainda calcula que encerrará o ano em 40%.

¿ Sem descontar, não é possível cumprir a meta (de superávit primário).

Os gastos de custeio, com pessoal, têm crescido bastante e isso afeta as contas públicas ¿ afirmou o economista do PNB Paribas Diego Donadio, para quem o resultado primário neste ano ficará em 2,6%, e a relação dívida/PIB, em 41%.

Apesar do resultado ruim do governo central, os estados e municípios seguiram na direção oposta. Segundo o BC, estas esferas registraram juntas superávit primário de R$ 3,342 bilhões, o melhor desempenho para esse período da série histórica. As estatais também ficaram no azul, com resultado positivo de R$ 354 milhões.

O pagamento de juros somou em março R$ 16,857 bilhões (5,40% do PIB, num fluxo de 12 meses), o que levou a um déficit nominal ¿ resultado das contas após o pagamento dos juros ¿ de R$ 17,073 bilhões. Em ambos os casos, são os piores desempenhos para o período.

Como proporção do PIB, o déficit nominal chegou a 3,46% do PIB, o maior desde novembro de 2004, quando ficara em 4,16%.

Segundo Lopes, do BC, os juros maiores vieram do aumento da dívida líquida, impactada pela inflação do período. Hoje, 25,4% do total do passivo estão atrelados ao IPCA que, somente em março, subiu 0,52%. Um ano antes, o indicador havia subido 0,20