Título: Trinta padres denunciados por pedofilia
Autor: Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 02/05/2010, O País, p. 15

`A Igreja tem atitude humana: não abandona o padre¿, diz o porta-voz da Arquidiocese de SP

UMA VÍTIMA do padre Dé, de Franca (SP): abuso de coroinhas

SÃO PAULO E FRANCA. Desde 2002, pelo menos 30 sacerdotes brasileiros foram denunciados à Justiça por crimes sexuais contra crianças e adolescentes. Nos casos mais recentes, padres de Arapiraca (AL) foram indiciados pela polícia. Um deles aparece em vídeo com adolescentes em cenas que fazem corar até os menos pudicos. Em Franca, no interior paulista, o padre José Afonso Dé, de 74 anos, está sendo processado por, supostamente, abusar de coroinhas.

Se antes imperava o silêncio, hoje o assunto é abordado até em batizados. Os religiosos respondem aos ataques sofridos pela Igreja Católica em razão das denúncias contra padres pedófilos em todo o mundo.

¿ A Igreja forma pastores, não lobos. Se um se transforma em lobo, tem de ser afastado do rebanho e responder diante das duas Justiças, a de Deus e a dos homens ¿ diz o cônego Antônio Aparecido Pereira, porta-voz da Arquidiocese de São Paulo, onde, no ano passado, o padre Cabral foi denunciado pelos pais de uma menina de quatro anos.

Igreja Católica não excomunga os padres

Dizendo-se inocente, padre Cabral foi afastado da paróquia, mas o caso ainda não foi julgado. Ele vive em um recanto da própria Igreja.

¿ A Igreja tem uma atitude humana: não abandona o padre, não abandona ninguém. Estamos falando de gente doente, isso é doença ¿ diz o cônego.

Se o caso for confirmado, o padre nunca mais poderá celebrar missas. Mas o medo maior dos católicos, a excomunhão, não atinge os religiosos. Com a excomunhão, o católico fica impedido de comungar. Os padres não são excomungados, segundo normas da Igreja.

¿ Absurdo, não sabia que não eram excomungados ¿ diz X., mãe de um menino de 15 anos que afirma ter sido vítima do padre Dé.

X. só soube que o padre teria tentado acariciar e beijar o menino porque outros coroinhas denunciaram o sacerdote.

¿ Achei que poderia esquecer e larguei a igreja ¿ diz Y., filho de X., que deixou de frequentar as missas, mas não perdeu a fé e usa um escapulário.

O comerciário W., hoje com 35 anos, casado e com dois filhos, lamenta que as denúncias contra o padre Dé tenham vindo à tona somente agora. Quando tinha 22 anos, ele frequentou um seminário em Minas, sob orientação de Dé, que teria tentado seduzi-lo.

¿ Padre Dé era meu ídolo. Meu irmão, que era menor de idade, tinha me contado que o padre tentou abusar dele. Duvidei e fui para o seminário. Mas meu irmão estava certo. Saí e nunca mais aguentei ver um padre. É muita hipocrisia.

Padre Dé foi afastado da paroquia de São Vicente. Um de seus advogados, José Chiachiri Neto, afirma que ele é inocente. Em depoimento de mais de oito horas à polícia, ele negou os crimes e disse as crianças interpretaram mal. Na quinta-feira, a Justiça acolheu a denúncia e ele está sendo processado.

No Rio Grande do Sul, pena de 13 anos de prisão

Entre os 30 casos levantados pelo GLOBO, alguns foram encerrados com a condenação dos religiosos. O frei alemão Alexander Nicolaus Weber cumpre pena de sete anos em Salvador. Hélio de Oliveira, o padre Helinho, de Rio Claro, foi condenado, em 2007, a 16 anos. O padre paulista Alfieri Bompani, e o frei Tarcísio Tadeu Spricigo, de Goiás, foram condenados por pedofilia.

Em Minas, os padres Geraldo Machado e Divino Oliveira foram condenados a quase 9 anos de prisão, e Cléber D. Gonçalves, a 10 anos e meio. No Maranhão, Félix B. Carreira foi condenado a 24 anos. Em Santa Maria (RS), o irmão Miguel Angelo Danette foi condenado a sete anos. Ainda no Rio Grande do Sul, o padre Claudio da C. Dias foi condenado a 13 anos. Na Bahia, o padre Djalma B. Motta foi condenado a 11 anos por pedofilia. Em Franca, o padre Juscelino de Oliveira foi condenado a 12 anos por estupro de uma menina de 10 anos.