Título: Derrotado, Lula evita falar em veto
Autor: Gois, Chico de ; Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 06/05/2010, O País, p. 3

Presidente diz que esperará votação sobre aposentados no Senado antes de decidir

Embora ministros tenham afirmado de manhã que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai vetar o reajuste de 7,7% para os aposentados que recebem acima de um salário mínimo, e também a medida que acaba com o fator previdenciário, aprovados na noite de anteontem pela Câmara, o próprio Lula adotou um tom de cautela e não criticou o Congresso. Disse que vai esperar a votação no Senado para, depois, decidir o que fazer. Também não quis criticar os deputados, mas lembrou que a medida provisória enviada ao Congresso, que previa aumento de 6,14%, foi fruto de negociação com as centrais sindicais. - Tínhamos um acordo com as centrais sindicais. O Congresso entendeu que deveria votar algo diferente do acordo. Agora vai para o Senado. A mim, só cabe esperar a decisão final do Senado para que eu possa analisar os impactos disso na economia brasileira e na Previdência Social e tomar a decisão - declarou. Mesmo sem informar se vetará ou não o reajuste, Lula argumentou que não é época de se fazer loucuras. - Não vejo nenhuma necessidade para, neste momento excepcional que o Brasil está vivendo, a gente fazer qualquer espécie de loucura, em qualquer área, para que a gente atrapalhe um novo ciclo de desenvolvimento do país. Perguntado se o reajuste de 7,7% era uma loucura cometida pelos deputados, contemporizou: - Não. Veja, é o percentual que a Câmara entendeu que era o correto, e, se a Câmara entendeu, não posso considerar loucura. Posso entender que os deputados têm tanta vontade de acertar, tanta vontade de fazer as coisas boas para o país como eu. É uma questão de visão econômica, que nós vamos ou consertar ou manter do jeito que está.

Ironias sobre interesses eleitorais

Mesmo evitando atacar os parlamentares, Lula foi irônico ao comentar o fato de o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), ter afirmado que os senadores têm apreço pelos aposentados. - Todo mundo tem apreço pelos aposentados, e no ano eleitoral aumenta o apreço de forma extraordinária. Eu não acredito que tenha, dentro do território brasileiro ou no mundo, alguém que tenha mais compromisso com os trabalhadores do que eu. De manhã, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que iria aconselhar o presidente a vetar todo o texto: - Acho que devemos vetar os dois, porque são decisões tomadas no calor, quando as pessoas estão preocupadas com as eleições, baseadas em princípios demagógicos. Acho isso irresponsável e errado, e não devemos compactuar com isso. Paulo Bernardo lembrou que anteontem foi aniversário da Lei de Responsabilidade Fiscal e que todos os partidos passaram o dia fazendo honras à LRF e comemorando: - Mas, à noite, rasgaram a lei. Não se vota aumento de despesa sem saber que haverá dinheiro. Isso é uma irresponsabilidade institucional. O ministro reconheceu que o veto é "uma decisão impopular", mas que a vida não se resume à eleição: - Trair ou não o eleitor é votar coisas de forma que elas possam ser sustentáveis. Mudar a política depois (de eleito) é enfiar a faca nas costas do eleitor, do segurado do INSS. À tarde, depois de se reunir com Lula, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, também defendeu o veto. Foi Padilha quem informou a Lula, anteontem, sobre a derrota do governo na Câmara. Segundo ele, o presidente ouviu o relato, no Uruguai, tranquilamente: - Se os parlamentares acham que o clima eleitoral vai fazer com que o governo prejudique as contas do país, estão enganados. Em 2006, rejeitamos o reajuste para os aposentados e vencemos a eleição. O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), que não teve sua proposta de reajuste de 7% acompanhada nem pelo PT, disse ontem que, diante do impacto - R$2 bilhões ao ano só com o reajuste a mais - o caminho é o veto: - Por responsabilidade fiscal, vai ter que vetar tudo (se o Senado confirmar). Já o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), confirmou que os 7,7% serão aprovados pelos senadores. Mas disse que se estuda na Casa alternativa para o o fim do fator previdenciário: aprovar emenda instituindo idade mínima para aposentadoria no Brasil, para continuar inibindo aposentadorias precoces: - Analiso isso, mas ainda vou ver com os técnicos se é possível. Temos que tratar essa questão da MP com tranquilidade. Previdência não é brincadeira. Agora, no Senado, vai aprovar os 7,7% de reajuste. O senador petista Paulo Paim (RS), que já conseguiu aprovar no Senado projeto de sua autoria acabando com o fator previdenciário, começou ontem o lobby junto aos colegas. - Temos que votar sem emendas. Não vejo motivo para fazer essa emenda da idade mínima - disse Paim, que, junto com o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), se reuniu com Sarney para pedir pressa na votação da MP 475. Segundo quem falou com Lula, ele ficou muito irritado com a aprovação do fim do fator previdenciário. Disse que já esperava a derrota das aposentadorias, mas nunca a aprovação do fim do fator. Lula, num primeiro impulso e orientado pela equipe econômica, estaria disposto a vetar tudo. Paulo Pereira da Silva, autor da emenda dos 7,7%, foi avisado de que a irritação e a pressão no governo estão grandes. Mas Paulinho da Força ainda aposta. - Acho que o presidente vai levar em conta essa questão política. A Câmara votou por unanimidade, e o Senado votará por unanimidade. Tenho certeza de que o presidente Lula não vai brigar com os aposentados, com a Câmara, com o Senado, por causa de R$600 milhões.